Soares: "Não desgrace mais Portugal, Senhor Presidente da República"
Ao contrário do que se antecipava dias antes da conferência Em Defesa da Constituição, apenas uma personalidade do centro-direita compareceu ao apelo de Mário Soares: Pacheco Pereira.
A postura destas personalidades contrastou com o ambiente apoteótico com que a audiência acolheu o violento discurso que Mário Soares proferiu. O ex-chefe de Estado não perdeu muito tempo a ir directo ao assunto. “É por isso que digo: o Presidente e o Governo devem demitir-se, enquanto podem ainda ir para suas casas pelo seu pé. Caso contrário, serão responsáveis pela onda de violência que também os atingirá”, exigiu.
Soares repetiu a exigência mais de uma vez. E os aplausos aumentavam a cada referência. “Por isso, ouso dizer, patrioticamente: Senhor Presidente, demita-se!”, atirou no fim da sua intervenção, que gerou na sala cheia a repetição em bloco da palavra “demissão”. O apelo foi repetido, durante o discurso da eurodeputada do BE Marisa Matias.
A justificação para a demissão fora elencada momentos antes.Traçou o cenário negro do país, que, na sua opinião, ia a “caminho de uma nova ditadura”, recordando “o que se passou com as universidades” e o que acontecia – àquela hora, em frente ao Parlamento – “com os polícias”.
A primeira vaia da noite deu-se na primeira referência ao actual Presidente. “O senhor Presidente da República, que jurou cumprir a Constituição, não a está respeitar, o que é inaceitável”, disse.
Acusou depois Cavaco Silva de proteger “um único partido, que é o seu próprio”. E que, à conta das medidas do Governo e da inércia do Presidente, “a violência está[va] à porta”.
A conferência em defesa da Constituição resvalava para um comício anti-Cavaco Silva. O fadista Carlos do Carmo, como estava “entre amigos”, arriscou carregar nas considerações. Chamou “medroso” e “inculto” ao Presidente, comparando o quanto lhe estavam a custar os 20 anos de actividade política do social-democrata com os anos em que vivera em ditadura.
A reduzida presença de personalidades da direita portuguesa talvez se explicasse por isso. De todos os nomes referidos nas últimas semanas, apenas Pacheco Pereira compareceu. Nem Freitas do Amaral, nem António Capucho ou Adriano Moreira participaram. Nem mesmo o ex-primeiro-ministro José Sócrates. "O engenheiro José Sócrates não conseguiu compatibilizar os compromissos que tinha com o início da hora do evento", justificava Vítor Ramalho, um dos organizadores da conferência.
Figuras actuais e históricas
Mas o que faltava à direita do espectro político, sobrava na esquerda. Compareceram figuras actuais e históricas desses partidos. As diferentes facções que compõem o actual PS marcaram presença. Uma novidade em comparação com a anterior iniciativa. Além do já referido líder parlamentar, estavam membros da direcção do PS, como Jamila Madeira, ou o ex-presidente da bancada Carlos Zorrinho. O presidente da Câmara de Lisboa, António Costa, ao lado do seu número dois, Fernando Medina, estava discretamente sentado no meio da galeria inferior. Ou o deputado Jorge Lacão. E o braço direito de Sócrates nos seus governos, Pedro Silva Pereira.
O PCP também enviou uma delegação numerosa. Além de Ruben de Carvalho – que discursou –, estavam Domingos Abrantes e o deputado Miguel Tiago. Os dois coordenadores do BE, João Semedo e Catarina Martins, também estavam na Aula Magna. Até o protopartido Livre – promovido pelo eurodeputado Rui Tavares – se fez representar na distribuição de panfletos à entrada.
E de partidos que, ainda que pequenos, tinham história. Como o PCTP-MRPP, que se fazia representar por Garcia Pereira, que estava sentado a poucos lugares de Arnaldo Matos.
Outra grande diferença em relação à iniciativa de Maio, foi a presença de homens ligados às instituições militares. Além de Pinto Ramalho, que discursou, estavam na sala Pezarat Correia e Mourato Nunes. Os generais Loureiro dos Santos, Manuel Monge e António Pires Veloso enviaram uma mensagem.