Nova associação de conservação da natureza quer proteger o lobo ibérico
Objectivo da Silvatica é optimizar a gestão do território entre o Douro e o Vouga, protegendo habitats do lobo e procurando a valorização económica da terra.
A Silvatica, assim se vai chamar a associação, nasce inspirada no modelo da Associação Transumância e Natureza (ATN), uma organização sem fins lucrativos proprietária de mais de 800 hectares de terrenos no Vale do Côa, que gere a Reserva da Faia Brava, a primeira área protegida privada do país.
“Já tínhamos esta ideia há algum tempo, mas os fogos no Caramulo aceleraram o processo”, diz Henrique Pereira dos Santos, especialista em ordenamento do território e gestão de áreas ligadas à conservação da natureza, ex-director-geral da ATN. É um dos fundadores da Silvatica, a par do biólogo Paulo Pereira, do fotógrafo de natureza João Cosme e de Nuno Gomes, empresário na área do ambiente.
O objectivo da associação é, segundo Pereira dos Santos, comprar ou assumir a gestão de terrenos, particularmente de terras abandonadas, a sul do Douro até ao Vouga, de modo a “melhorar a conectividade entre as populações do lobo ibérico” que habitam nessa região, nomeadamente nas serras do Caramulo e da Estrela.
O lobo ibérico (Canis lupus signatus) é uma subespécie do lobo, endémica da Península Ibérica, e está classificada como “em perigo” em Portugal, estando protegida desde 1988. O censo mais recente a nível nacional, realizado em 2002 e 2003, revelou que existem 65 alcateias, num total de 300 animais, localizadas sobretudo a norte do Douro, nomeadamente no Gerês. Mas habitam também nos distritos de Aveiro, Viseu e Guarda.
“A sul do Douro há uma grande descontinuidade entre as populações e não há ligação com as comunidades espanholas”, nota o especialista, que foi também vice-presidente do antigo Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade (hoje Instituto de Conservação da Natureza e Florestas).
Uma das ameaças que o lobo ibérico enfrenta é a fragmentação do habitat. Os fundadores da Silvatica propõem combater essa fragmentação com uma gestão “inteligente” dos terrenos, particularmente dos que estão abandonados, sem descurar o seu potencial económico. “Queremos dar destino a territórios que hoje não têm utilidade social e provar que há outra maneira de olhar para o abandono”, afirma Henrique Pereira dos Santos, sublinhando que os fogos são produto do abandono rural mas podem também ser uma mais-valia na gestão do território.
Primeiro é preciso comprar os terrenos. Como? “Para já vamos apostar no crowdfunding [plataforma de financiamento colectivo] e depois vamos tentando encontrar soluções à medida”, explica. Com a associação, os fundadores querem também “criar emprego e riqueza” através da “valorização de produtos ou marcas, aproveitando as potencialidades de cada terreno” - à semelhança do que acontece na ATN, que comercializa produtos locais e promove projectos ambientais de desenvolvimento rural.
A Silvatica vai ser lançada neste sábado no final de um colóquio sobre gestão do fogo e do território em Vouzela, distrito de Viseu. A associação, que "não tem qualquer intervenção política", está aberta a todos e procura também parcerias com agentes ligados à economia e biodiversidade.