Francisco quer evangelizar-nos com a iFaith

Os dois antecessores de Francisco estavam agarrados ao velho "business as usual". Vendiam fé como quem vende Big Macs e foram criticados por não terem um produto mais "light", uma estratégia de comunicação mais "clean" e um modelo de distribuição mais próximo do cliente final

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Giampiero Sposito/Reuters

Sempre que o Papa Francisco aparece na televisão, fico à espera que ele anuncie um Woodstock em plena praça São Pedro. Ou que lance uma linha de moda sacra que inclua as míticas t-shirts “I like the Pope, the Pope smokes dope”. Ou que, durante a eucaristia, substitua a hóstia por sashimi e o vinho por vodka Red Bull. Porque o Francisco é fixe, o Francisco é cool. O Francisco é o Steve McQueen do Vaticano.


Provavelmente estou a exagerar. E as velhinhas que vão a Fátima a pé (mas que querem ir sempre sentadas nos transportes públicos) ficariam chocadas se lessem estas linhas. Elas, o João César das Neves e os outros beatos todos que apertam o cilício cada vez que Francisco fala. Porque têm medo que ele saia do armário ou que diga que a vida não é mais do que Deus, lá em cima, a jogar SIMS ou GTA.


Mas estejam descansados. Francisco não vai fazer nada disto. Porque Francisco sabe o que faz e, embora ninguém o preveja (excepto eu), o Papa das Pampas será um dia reconhecido como um dos melhores gestores que este mundo conheceu. E se existir justiça divina, o seu nome figurará nos manuais de gestão, ao lado de vultos como Ford, Jobs, Dell, Welch ou Soprano. Porque o que Francisco está a fazer é um autêntico "turnaround" na maior e mais antiga multinacional do planeta.


A empresa que Francisco lidera é há muitos anos líder no negócio da fé. Mas tem tido vida difícil nos últimos anos. À perda de quota de mercado, provocada pelo "churn" de clientes para marcas concorrentes mais "trendy" (Cientologia, Budismo) ou por considerarem o serviço obsoleto ou sem utilidade (agnósticos, ateus), juntaram-se os escândalos com bispos assanhados, as suspeitas de lavagem dinheiro e uma ostentação vestida de Prada que, nos dias que correm, em nada beneficiaram a imagem do Vaticano perante os seus "stakeholders". Os dois antecessores de Francisco estavam agarrados ao velho "business as usual". Vendiam fé como quem vende Big Macs e foram criticados por não terem um produto mais "light", uma estratégia de comunicação mais "clean" e um modelo de distribuição mais próximo do cliente final.


Mas desde que tomou posse como CEO da Igreja Católica, Francisco está a transformá-la num "case study" de revisão estratégica.
O enfoque passou a ser no cliente e não no produto. Quando ele diz “o importante é a pessoa que Deus acompanhará sempre”, está a dizer-nos que qualquer que seja a necessidade do cliente, a Igreja terá um tipo de fé para lhe vender. É o fiel que manda. E não Deus. Quando pisca o olhos a gays, lésbicas, bissexuais e apoia o uso do preservativo, Francisco está a capturar novos segmentos de clientes. Porque “a Igreja tem de ser a casa de todos”. E há que garantir que no “todos” estão os segmentos com maior potencial de crescimento (e se neles estiverem os mais ricos e socialmente influentes, melhor).


E se pensa que a imagem de novo pobre e os sinais exteriores de pobreza que Francisco emite são inocentes ou “à imagem de Deus”, desengane-se. Aquilo é puro reposicionamento da marca. Francisco quer fazer com a Igreja Católica o que a McDonalds fez com as saladas: levar as pessoas a pensarem que a comida é saudável (embora continuem a comer os mesmos hambúrgueres e as mesmas batatas fritas).


E como os jovens são o presente e o futuro do negócio, Francisco quer mostrar que a Igreja Católica é “muitáfrente”. E vai daí, abre nove contas em diferentes línguas no Twitter (ao todo, já conta com mais de dez milhões de seguidores), tira fotografias selfies com a juventude e sobe a palcos e palanques para dizer: “Vocês são o futuro. Façam barulho!”. Quem diria que o sumo pontífice e a Rihanna teriam tanto em comum?


Mas não é só com a cantora dos Barbados que Francisco é parecido. Vendo bem, ele tem dentro de si o espírito de Steve Jobs. Tal como o americano, este argentino pegou numa empresa em crise de identidade, e anda a lançar um produto que toda a gente já conhece. Mas com um "twist" na substância e um refresh no formato. No fundo no fundo, Francisco trouxe-nos a iFaith.

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