Fundação e editora celebram quinze anos de atribuição do Nobel a José Saramago
Peças de teatro, novas edições livreiras, exposições e debates constituem o calendário das iniciativas celebrativas do 15.º aniversário da atribuição do Nobel da Literatura, apresentado esta terça-feira na Fundação que ostenta o nome do escritor.
A viúva do escritor e presidente da Fundação, Pilar del Río, soube da atribuição 24 horas antes, quando, da academia sueca, telefonaram para a sua residência, na ilha espanhola de Lanzarote, a saber do escritor, que, na ocasião, estava na Feira do Livro de Frankfurt.
Pilar del Río contou como, de forma discreta, sem quebrar o sigilo imposto, tentou dizer às editoras que havia a possibilidade de o autor de O ano da morte de Ricardo Reis vir a ser distinguido.
Na Editorial Caminho, na ausência do seu administrador, Zeferino Coelho, o gabinete de imprensa retorquiu-lhe: “Prémio, qual prémio?”; na Alfaguara espanhola, editora das obras de Saramago, em Espanha, disseram-lhe “Este ano não se ouviu nada, não vai ser”.
O próprio Saramago, alertado pela mulher dessa possibilidade, não se mostrou muito convencido, e não desistiu de cumprir a agenda, tendo mesmo previsto sair de Frankfurt, em direcção a Madrid.
“Ainda perco o voo e o prémio”, disse-lhe então o escritor, como recordou hoje Pilar del Río.
Saramago acabou por não viajar até à capital espanhola, tendo regressado à Feira, e o ex-jornalista Carneiro Jacinto, na altura em funções no antigo instituto de Investimentos, Comércio e Turismo de Portugal (ICEP), na base da actual Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal (AICEP), “organizou espontaneamente uma conferência de imprensa”, disse hoje Zeferino Coelho, que recorda esse dia como “o mais agitado” da sua experiência de 30 anos de Feira de Frankfurt.
“Foi uma grande confusão, não me recordo de tão grande agitação como a daquele dia em que Saramago foi anunciado [vencedor] ”, disse.
A Editorial Caminho vai editar, em Novembro, a preço mais baixo, A maior flor do mundo, de José Saramago, com ilustrações de André Letria, e uma edição limitada de 500 exemplares, a 100 euros cada, de uma edição fac-similada do original de A Claraboia, acompanhada de uma nova edição do romance, segundo as regras do Acordo Ortográfico.
Vontades, livro de José Santa-Bárbara, autor das telas que estão expostas no exterior da Casa dos Bicos, vai também ser reeditado, com um texto de Carlos Reis.
Ana Sousa Dias, da Fundação, disse que as telas “são um grande chamariz” e que “muitos turistas se mostram interesse em conhecer a obra” do artista, daí a oportunidade da reedição, pois a obra encontrava-se esgotada.
Do calendário celebrativo consta ainda a estreia, na sexta-feira, no Teatro Municipal S. Luiz, em Lisboa, de Jangada de Pedra, a partir da obra homónima de Saramago, pelo grupo O Bando, com encenação de João Brites.
O encenador disse esta terça-feira que “apenas se cruzou com Saramago”, mas não esquece o abraço que este lhe deu após uma representação de Ensaio da Cegueira, uma peça sobre o romance homónimo de Saramago.
“Senti a consistência e a coerência de um homem”, disse Brites, para quem o Nobel distinguiu não só o escritor como “o homem que ele era”.
Entre os debates anunciados, haverá um sobre a Europa, a propósito de Jangada de Pedra, e um sobre as ilhas Malvinas/Falkland e o território de Gibraltar - este último debate deverá ser moderado por António Sampaio da Nóvoa, ex-reitor de Universidade de Lisboa.
No âmbito das celebrações, é editado em sérvio o romance Da estátua à pedra e haverá uma Semana Saramago na Feira do Livro de Belgrado, que se realiza de 22 a 25 deste mês.
No dia 5 de Novembro será anunciado, na sede da Fundação, o vencedor da 8.ª edição do Prémio Saramago, numa iniciativa com o Círculo de Leitores.
Outras iniciativas previstas são a estreia de A noite, com encenação de José Carlos Garcia, no Teatro da Trindade, em Lisboa, no dia 7 de Novembro, a edição e um livro sobre o erotismo na obra de Saramago, uma exposição de Rogério Ribeiro, na Casa dos Bicos, intitulada O ano de 1993, e o fabrico pela Vista Alegre de uma jarra criada por David Almeida, intitulada A Viagem do Elefante, título de uma das obras do Nobel.
O anúncio do Nobel da Literatura, atribuído a José Saramago, em Estocolmo, foi feito há precisamente 15 anos. O escritor, como afirmou Zeferino Coelho, “era, já há muito, apontado”, e a sua distinção concretizou uma vontade, que data “pelo menos dos anos 1930, com mais insistência nos de 1950 e 1960, de ser atribuído um Nobel a um escritor de Língua Portuguesa”.
Coelho realçou, porém, que “não foi o culminar de uma carreia, [pois] Saramago continuou a escrever e escreveu obras-primas”