Situação financeira “alarmante” pode levar à suspensão das actividades da Cinemateca já em Setembro
Directora acredita que o secretário de Estado ainda pode encontrar uma solução, mas admite que este “momento é de grande aflição”, sobretudo no que toca ao ANIM, o melhor arquivo do cinema português
Segundo a lei em vigor, a taxa de 4% paga pelos anunciantes sobre a publicidade exibida na televisão cria um bolo que depois é aplicado no financiamento do cinema e audiovisual, nas suas mais diversas áreas. A Cinemateca Portuguesa-Museu do Cinema, que inclui o Arquivo Nacional das Imagens em Movimento (ANIM), entidade que reúne o acervo mais valioso do cinema português, recebe 20% desse bolo para financiar as suas actividades. Com as empresas a conterem cada vez mais os seus custos publicitários, esse montante, defende Seixas sem avançar valores muito concretos, tem vindo a decair drasticamente, deixando a casa que dirige numa “situação insustentável”.
“Alertámos a tutela para as dificuldades em Abril e sei que o secretário de Estado tem procurado acompanhar todos os esforços, mas também sei que, apesar de muito empenhado, ele não tem podido ir às Finanças buscar dinheiro”, disse esta tarde a directora, numa breve conversa telefónica.
Os 20% que recebe da taxa sobre a publicidade “tem um peso muitíssimo superior a 50%” no orçamento da Cinemateca, esclarece Seixas. E, se em anos anteriores, a taxa representava um montante que “ultrapassava em muito os três milhões”, este ano estima-se que “não chegue sequer aos dois milhões”.
Quando diz que a partir do fim do mês “a Cinemateca não pode avançar” - e no entanto está anunciada para Setembro uma integral do espanhol Victor Erice, que se deslocará a Lisboa (altura em que se encontrará, na Barata Salgueiro, com o português Pedro Costa para o lançamento do livro Casa de Lava -Caderno, edição facsimilada do caderno original que Costa manteve durante a produção de Casa de Lava, em 1994 - Maria João Seixas não está apenas a pensar na programação das salas, que não está em condições de garantir caso não receba boas notícias da Secretaria de Estado da Cultura (SEC) até 31 de Agosto; está particularmente preocupada com a actividade do ANIM: “Uma das nossas missões fundamentais é a preservação do património do cinema – como é que podemos cumpri-la se um cofre avaria e não podemos mandar arranjar, se uma máquina avaria e não podemos mandar arranjar? Tudo corre o risco de parar.”
Desde Abril que resolver os problemas de tesouraria na Cinemateca se tornou urgente. O secretário de Estado Jorge Barreto Xavier interveio para garantir “dotações extraordinárias” do Fundo de Fomento Cultural em Junho e Julho (400 mil euros no total), explicou Seixas, mas a verba de Agosto ainda não chegou e não há quaisquer garantias para os meses seguintes. “Acredito que tudo se pode ainda resolver, mas este momento é de grande aflição.”
Seixas aponta as quebras nas receitas sobre a publicidade como o principal factor para explicar a situação financeira a que a Cinemateca chegou, mas diz que, nos últimos anos, outros contribuíram para este “cenário alarmante”: “As instituições foram perdendo autonomia, foram ficando espartilhadas em regras de gestão cada vez mais iguais para situações que eram – e são – muito diferentes. E depois há o PIDDAC [Programa de Investimentos e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central] – há pelo menos três anos que não temos dinheiro nenhum para investimento.”
As receitas de bilheteira e as da venda das publicações próprias são “importantes”, até porque mostram “o carinho de um público fiel por esta casa”, mas são residuais quando comparadas com as que resultavam até aqui da taxa dos anunciantes.
O PÚBLICO tentou saber que esforços estão a ser feitos pela SEC para resolver o problema na Cinemateca, mas até ao momento não foi possível entrar em contacto com Jorge Barreto Xavier.