Uma conjuntura semipresidencial

Contrariando as expectativas de uma aval condicionado, após uma crise mal explicada e uma proposta de refundação de uma coligação em apuros, Cavaco Silva mantém o actual Governo em funções, suspende a remodelação anunciada e condiciona os três principais partidos a um pacto de "salvação nacional".

Anunciando o desejo de eleições após o fim deste programa de ajustamento, Cavaco Silva aproveitou a janela de oportunidade que lhe ofereceu involuntariamente Paulo Portas para tentar condicionar severamente estes partidos. O seu projecto será seguramente apoiado pelos grupos de interesses e principais segmentos das elites dominantes, mas saberemos nos próximos dias como vão estes reagir e sobretudo qual será a posição do Partido Socialista.

No fundamental, e perante os cenários mais desastrosos de um segundo programa de ajustamento e eleições antecipadas já em Setembro, o Presidente, como é natural, opta por uma tentativa de pacto neo-corporativo alargado entre a elite política dominante. Apesar de não ser seguro (salvo o pleonasmo voluntário) que o "poder caísse na rua", em caso de eleições antecipadas, este pacto inter-elites baseia-se na perspectiva pessimista de que a austeridade e as deterioração das condições de vida dos portugueses estão para durar e que só este tipo de pactos poderão evitar o pior. Não é claro que este consiga os seus objectivos e que os partidos se vejam condicionados de forma tão dura. Acresce que estes, em conjunturas críticas como a que vivemos, também podem ser abalados por crises internas complexas.

Vamos ver o que acontece nas próximas semanas, mas, salvo melhor opinião, ainda que o desafio seja de monta para o PP e o PSD, o Partido Socialista é o partido que terá de pensar mais no repto presidencial. E não vai ter muito tempo.

António Costa é politólogo (ICS-UL)


 

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