Sempre fui pessoa de viajar e, como tal, estou habituado ao ir e voltar. Mas, agora, regressar tem um significado diferente. Demora meses e todos os detalhes são importantes. E desta vez resolvi ser espontâneo. Dei por mim de malas às costas 15 horas antes da partida e a usar transportes públicos.
Já lá, no aeroporto, dirigi-me ao primeiro bar que encontrei. Uma sande de paio e um copo de vinho tinto. Primeiro água porque tinha sede. Entretanto dei por mim a pensar “pá, o que tinhas na cabeça para vir ao final da tarde quando o teu voo é pela manhã?”. Não sei. Provavelmente experiências como as que tive nos aeroportos de Atenas ou Roma. Únicas.
Em frente. Independentemente das motivações o importante é que estava lá, no aeroporto de Gotemburgo, disposto a passar a noite sozinho. Pequeno e vazio. Não se passava nada. Bem, pelo menos tinha, na mesa à minha frente, três suecas bem interessantes. Creio que estavam (como eu) à espera de um voo matinal. Apostei um braço em como dali a nada lhes faria companhia.
Deixei as malas num cacifo. Na volta ao bar pensei em dormir mas sentia-me cheio de energia. Talvez por causa do vinho que de um copo passou a dois… Voltei a passar os olhos pela mesa das suecas. A que mais olhava não era lá muito engraçada mas de resto… peito voluptuoso e um par de pernas de fazer inveja a muitas senhoras do mundo da moda.
Adiante. Riu-se. Eu ri. Mas não estava para aí virado. Estava a escrever. E quando um gajo escreve é como estar a dar uma mija. Concentração total. Levantei os olhos. Eh pá, a de cabelo arruivado sorriu para mim. Retribuí mas não entrei em loucuras. Fechei os olhos e, quando os abri, tinha a mais loira (daquelas que parece ter despejado um garrafão de 5 litros de água oxigenada no cabelo) a acenar. Fez o gesto da praxe: “anda para a nossa mesa”. Sorri e, feito palerma, retribui com o gesto do “desconto de tempo” tipo “a escrever. Vou acabar e depois lá aí vou ter”. Ela lançou-me um olhar de estranheza. Compreensível. Mudei de ideias e lá fui ao seu encontro.
A conversa foi engraçada e demorou cerca de uma hora e tal e três cervejas. Trocamos contactos. Acabaram por se ir embora porque já se dizia que era a última chamada para o seu voo. E eu lá conservei o braço que tinha apostado. Nada mal.
Como já devem ter percebido arriscava-me a ficar ébrio. E o problema nem era adormecer e perder o voo. Era mais entrar no avião a espalhar bafo a álcool por todo o lado. Não fica bem principalmente se, ao meu lado, tivesse a sorte de ter uma tipa gira como da última vez.
Como tal, e por precaução, comprei duas Red Bull, um Bounty e umas pastilhas elásticas de mentol no quiosque em frente. Dão sempre jeito mas, desta vez, nem por isso porque viajei sozinho. Ainda bem. Poder esticar as pernas e braços sem nos preocuparmos com a malta ao lado é bastante relaxante.
Interposto sempre agradável
Bruxelas. Cachorro quente e, que se dane, uma Hoegaarden Large. Perdido por 1, perdido por 10. E sempre tinha as pastilhas de mentol.
A espera foi curta e nem deu tempo para matar o vício. No mesmo voo seguia em primeira classe, e duas filas à minha frente, o Paulo Rangel. Teve tratamento especial ao ponto de lhe pegarem no casaco e o colocarem num cabide. O meu ficou ali todo encorrilhado entre as minhas costas e o assento. Gente importante é outra coisa.
Voltemos à viagem. Passei-a a lutar contra o sono pelo que me lembro de muito pouco. A não ser da sande de fiambre e do copo de branco alentejano bem fresco que me soube pela vida. E mais água. A TAP é, para mim, a melhor companhia aérea do mundo. Não tenho dúvidas.
Continuemos. Despertei na fase de descida ao Aeroporto Francisco Sá Carneiro. Adoro ver o Porto lá de cima. E sorri. Sorri quando ouvi um casal falar francês mas dizer “Dragão”, “Douro” e “Porto de Leixões” com aquele sotaque carregado do Norte. Há pessoas que se denunciam com uma facilidade incrível. Tal como o Paulo Portas. É tudo uma questão de tempo até descobrirmos quem realmente são.
A aterragem foi boa. As bagagens apareceram rapidamente. Bebi um café a sério. Quente. O meu irmão esperava-me lá fora e levou-me a casa. Senti calor e suei. Muito. O corpo desabituou-se destas temperaturas. Mas não importa. Até me soube bem. Adoro o meu país e a cidade onde cresci faça chuva ou sol. Para mim não há nada igual.
Já em casa não desfiz as malas porque estive a escrever esta crónica. E daqui a uns minutos vou jantar com ele - o meu irmão Sérgio - no pátio das traseiras cá de casa e pôr a conversa em dia. Só com ele porque os pais estão fora de Portugal. Nada é perfeito, infelizmente.
Importante e, isso sim, é que irei saborear um bom frango no churrasco e degustar um fantástico maduro branco do Douro ao jantar, entre outras coisas. O habitual sempre que cá venho. E, antes de ir dormir, talvez uma pastilha de mentol.