O que dizem os leitores sobre a greve e a realização dos exames
Alunos, professores e pais partilham com o PÚBLICO a experiência desta segunda-feira.
"Desculpa filha por te ter dado o nome Inês"
Álvaro Neves, pai
Desculpa filha por te ter dado o nome Inês, ou será antes ainda bem filha porque te dei o nome Inês ?
Só te puderei responder a esta questão quando terminar o exame de dia 2 de Julho.
Dizem que este exame de Português foi fácil. Será que o próximo também será, ou vais ser castigada por te chamares Inês? Ou castigada porque os teus dignissimos professores decidiram fazer greve?
Sabe-se lá, depois de tudo o que se passou, já não sei nada!
Só existe uma coisa que eu te sei dizer: Isto é uma “pouca vergonha”!
Eu não quero saber se os professores escolheram a data errada para fazer greve, ou se o ministério não quis ceder para não perder uma batalha política. O que eu sei é que não és política, eu também não, mas aqueles que nos governam são aqueles que nos devem dar respostas, não os professores.
Deveriam ser eles o garante da equidade entre todos os alunos. O garante de que todos vão competir por aquelas décimas, que tanta falta irão fazer a muitos bons estudantes, em condições de igualdade. Já não o conseguem fazer com as notas das frequências entre público e privado. Mas era suposto fazê-lo no minimo com os exames
O pai da Ana acho que lhe está a dizer algo parecido com isto. Uma de vós vai ter azar.
"Não foi o sindicato que me empurrou para a greve, foi o ministro!"
Maria de Portugal, professora
Eu sempre achei mal terem marcado greve para o dia de um exame. Eu sempre achei que as greves às avaliações seriam o suficiente... Não tencionava fazer greve mas foi o ministro da Educação que me obrigou a fazê-la! Porque quando o colégio arbitral indicou a data de dia 20, ele só tinha uma coisa a fazer: acatar! E não o fez...
Ele quis lá saber dos alunos! Tinha de mostrar o seu braço de ferro: quero, posso e mando!
Depois, todos sabemos aquela história que está para se apurar relacionada com a gravação das reuniões... e eu acho que os sindicatos terão razão. Por isso...
Não foi o sindicato que me empurrou para a greve, foi o ministro!
Hoje fiz greve... infelizmente. Mas eu pergunto aos colegas que substituiram colegas se estão bem com a sua consciência?
Já se sabia que o privado não faria greve, mas sempre esperei que houvesse solidariedade e não mais de 10% dos alunos do público fizessem exames.
Repito: colega que substituiste quem estava indigitado; sentes-te bem com a tua consciência?
Então olha: se fores um daqueles a serem despedidos, lembra-te deste dia.
"Não gosto da classe da qual faço parte"
Ana Paula Pinto, professora
Lamento o que se tenha passado em relação aos alunos lesados com esta greve. Sou mãe de um aluno que fez o exame de Português esta segunda-feira. Louvo os professores que não fizeram greve, fazendo que ele e os colegas não fossem prejudicados.
Sou professora do ensino público: sim, pertenço a essa classe que se queixa disto ou daquilo. Farto-me de ouvir, ler, ver queixumes infantis de outros colegas. Será mesmo um defeito português essa ideologia de sucessivos lamentos? Para quem acredita até podem parecer credíveis, para mim, conhecedora do sistema, galhofo com esses desabafos.
Tenho orgulho do que faço, mas não na classe profissional onde me integro, que se faz de coitadinha perante outros funcionários públicos ou não. Comecei a trabalhar aos dezoito anos no sector privado noutra profissão. Corri atrás de um sonho e consegui. A minha paixão de ensinar foi mais forte. Nunca desisti de sonhar e de aprender. Faço-o todos os dias!
Não gosto da classe da qual faço parte. A maioria dos colegas não sabe o que é trabalhar, verdadeiramente. Só oiço queixumes e mais queixumes. São uns desgraçados! Para quem não conhece o meio, parece que só os professores é que são trabalhadores e têm a mais difícil das tarefas. Não exageremos! Se a maioria dos professores soubessem o que é trabalhar 45 horas como já trabalhei em tempos em tarefas polivalentes sob a orientação de um patrão bem presente, não se queixariam tanto do que têm. Jubilariam!
Para mim, é o paraíso ser professora. É por paixão que eu exerço, por isso, nada me custa. Quando no outro dia, ouvia uma colega de História que não tinha fins-de-semana com horário incompleto para estar a preparar aulas e corrigir testes, tendo ela já vinte e um anos de experiência, fiquei a pensar: quem não perceber nada desta profissão pensa mesmo que ela é uma coitadinha! Há tantos outros exemplos!
É bem verdade que resumo à classe que eu pertenço aos pobrezinhos. Lá sabem eles o que é mesmo trabalhar. Louvo a Deus por me ter dado força por ter lutado, conseguindo ensinar por paixão e sem ter de contar o tostão ao fim do mês. É isso que faz a diferença: vocação e não por obrigação ou por escape.
Considero correctas as atitudes do ministro Nuno Crato. Aplaudo-o de pé mesmo que não seja da minha cor partidária. Que vá em frente, que não se deixe amedrontar por politiquices de quem não quer trabalhar. Se o privado (em qualquer profissão) não se está bem, muda-se, ou então somos convidados a sair. E na função pública tem de ser igual. Por que haveria de ser diferente? Mobilidade? Certamente, não será para os contratados ou para quem tem horário nas escolas. São para aqueles que estão encostados desenvergonhadamente a uma situação que se prolonga há demasiado tempo. Nunca cheguei a perceber como é que se podia ser remunerado por quase nada fazer numa escola pela qualificação que se tem e na qual não há alunos a quem ensinar.
As greves são necessárias, mas não neste contexto. A função pública é constantemente beneficiada. Pensemos bem nos benefícios antes de apontar o quer que seja. Pensemos bem. Vou um exemplo muito primário: basta pensar que neste momento de crise, os funcionários públicos não esperam pelos seus salários, nem têm atrasos neles. Nisso já é um benefício. Não estiquem tanto a corda! A função pública deveria ser um exemplar de empregados, e longe vão disso...
"Eu deixei de acreditar nos professores"
Carlos Noronha, estudante do 12.º ano
Eu sou aluno do 12º. ano, estudo na escola Maria Amália Vaz de Carvalho, escrevo esta carta como forma de protesto dirigido à Fenprof e a todos os professores que tiveram a indecência de não comparecer na vigilância dos exames de Português que se realizaram dia 17 de Junho.
Em primeiro lugar, acho que o que se passou foi puro terrorismo praticado pela classe dos professores e, ainda mais grave, usando como reféns da sua luta os alunos que supostamente são a sua razão de existir. Esta forma de protesto descredibilizou quaisquer reivindicações que os professores possam ter e, acima de tudo, envergonhou esta classe profissional e manchou o nome de todos aqueles que aceitaram participar neste acto terrorista. (...)
Eu não realizei um exame para o qual estudei ao longo de um ano inteiro e que é decisivo na minha vida futura graças a esta greve. Eu deixei de acreditar nos professores e percebi que o seu verdadeiro interesse não são os alunos.
Finalmente, quero pedir a alguma entidade que tenha controlo neste país, que sinceramente, não sei qual é, que não permita que estes escândalos se repitam e que nos deixe ter um ensino seguro, livre e igual para todos!
"Não nos deterão enquanto não formos ouvidos e se faça real justiça"
Ana Margarida Raposo e Rita Sousa, alunas do 12.ºano
(...) Tudo começou, como já é do conhecimento público, com a incerteza de 75 mil alunos acerca da realização da prova de exame de Português, incerteza essa que apenas foi apaziguada para alguns, visto que houve uma significante discrepância entre os alunos que puderam realizar a prova e os que não tiveram a mesma oportunidade. Como tal, é clara a injustiça patente nesta desigualdade entre alunos, e é deste modo que parte essencialmente de nós fazer ouvir a nossa voz, insurgindo-nos contra esta iniquidade.
E como se não fosse suficiente todo o nervosismo face à realização de uma prova, para muitos condicionante do seu futuro, associado à instabilidade da possível realização da greve dos professores, o ministro da Educação insistiu na criação de uma maior inconstância, com as declarações que prestou afirmando que apenas iria resolver o problema quando este já tivesse decorrido, ou seja, a típica resolução “em cima do joelho”, em vez de procurar efectuar uma resolução previamente reflectida e estratificada.
Mesmo assim, houve estabelecimentos de ensino que não aderiram à greve, ou apenas aderiram em parte, o que conduziu a uma realização incompleta das provas, levando todos os alunos a permanecerem na incógnita de como seria resolvida a sua situação.
Numa tentativa do ministro da Educação, talvez pouco feliz, de procurar tranquilizar os alunos, nas declarações que prestou na conferência de imprensa decorrente por volta das 14h00 de segunda-feira, comunicou a data de realização de prova para os que não tiveram essa oportunidade, garantindo a equidade para todos os alunos, o que demonstrou a falta de noção das afirmações que fez. As principais questões que se põe após a realização destas declarações, surgem da falta de equidade entre os alunos, que de facto não existe de modo algum, nomeadamente a disparidade entre o tempo de realização das provas ou o grau de dificuldade, que Nuno Crato assegurou vir a ser igual, facto comprovado por “profissionais competentes”. Por muito que sejam os esforços para a existência de uma equidade, essa nunca irá passar de uma ilusão, enquanto as condições não forem verdadeiramente iguais para todos, condições essas que possivelmente se atingiriam com a realização do exame de dia 2 de Julho por todos os alunos do país.
Tomando como base as palavras de muitos dos escritores que inspiram a realização de provas como a desta segunda-feira, e incitam à luta pelos objectivos considerados justos, não nos deterão enquanto não formos ouvidos e se faça real justiça, igual para todos os alunos do 12.º ano, que têm nestas provas o início do seu futuro, sendo que é na juventude que está posta a esperança para a introdução de mudança. (...)
"Falta de atitude democrática"
Maria Montelobo, professora
Como professora na margem sul [do Tejo] quero dar o meu testemunho sobre a falta de atitude democrática de alguns colegas que se acham no direito de pressionar, por todas as formas possíveis, os outros docentes no sentido da aderirem à greve. Não esperava esta situação de novo PREC, 40 anos após o 25 de Abril e lamento-o...
"Já se imaginou dois alunos partilharem a mesma esferográfica?"
Hugo, professor de Informática
Sou professor de Informática e revelo o meu ponto de vista sobre a situação actual da educação.
Na sala, tenho um PC para dois alunos. Já se imaginou dois alunos, nas restantes aulas partilharem a mesma esferográfica e o mesmo caderno?
Existem aulas de Tecnologias de Informação e Comunicação para os 7.º e 8.º anos apenas com 45 minutos semanais, ou seja, posso ter 24 turmas de 30 alunos (é fazer as contas). Será possível realizar um acompanhamento e uma avaliação com qualidade destes 720 alunos?
Constato que esta carga semanal, na era da informação, diverge das necessidades dos alunos.
Dedico parte do tempo da aula a resolver problemas pontuais nos PCs dos alunos. A outra parte (30 minutos?) é dedicada aos assuntos e conteúdos da aula.
A escola tem recursos, tem capacidade e tem vontade para ensinar e preparar os alunos para os desafios da vida. No entanto, está proibida de o fazer.
A voz dos secundários
Pedro Lemos, aluno do 12.º ano
Que andaram a fazer? É com esta interrogação que inicio o meu texto, não muito literário, mas que espelha na sua plenitude a minha concepção da realidade actual.
Sendo aluno do 12.º ano de escolaridade, realizo exame de Português. Ou pelo menos sempre ponderei que sim. Na última semana, fui bombardeado de informação acerca da data de realização de exame. Todos os alunos do 12.º ano foram bombardeados de dúvidas, incertezas e instabilidade.
Não sabemos quando iremos ter exame, não existem datas. Sabemos que muito provavelmente uns irão realizá-lo e outros não, por mais injusto que isso seja.
Tanto os sindicatos como o Governo estão a deixar-se tomar por decisões imaturas e irresponsáveis. Existem também informações que adicionalmente se irá prolongar a greve à correção dos exames. Não sabemos em quem confiar. Sindicatos ou Governo? O Governo menciona que não há consenso com os sindicatos em nova calendarização. Sindicatos dizem que Governo não concorda com nenhuma das medidas apresentadas. Em quem confiar? Na neutralidade. Não houve consenso. Falta apenas descobrir de que lado está a falha.
Aos professores falta também um pouco de maturidade, de madurez, de respeito para com os alunos. Nós compreendemos os fundamentos originadores dessa vossa greve, mas não na íntegra. Os professores têm o seu direito à greve como qualquer outro trabalhador. Mas meditemos e ponderemos antes de tomarmos qualquer decisão. Toda a imagem espelhada em redor dos professores na última semana, assim como a manifestação em Lisboa a 48 horas dos exames reflectiu todos os seus fundamentos. Bastava um dia de greve, bastava realizar-se a greve, por exemplo, no dia 17, adiando o exame para o dia 20. Bastava e abundava. Paralisavam o país, adicionando ainda mais força e imagem às manifestações e às imagens transmitidas pelos media. Mas trata-se mais do que simplesmente reflectir algo, do que transmitir algo para o exterior. Os professores queriam demonstrá-lo. Já está. Que mais desejam, senhores professores? Toda esta situação só está a provocar uma instabilidade, uma vulnerabilidade perante os alunos. Esta greve já não se limita à demonstração dos vossos ideais, estando a ir para além disso. Somos do ensino secundário, mas nesta situação, nem “secundários” parecemos ser.
Paralisem o país um dia. Paralisem os exames um dia. Demonstrem do que são capazes. Dêem força ao argumento, à imagem de sábado. É o suficiente.
Nós, alunos do ensino secundário, a quem nos falta a voz, uma voz oculta no meio de tanta informação, uma voz imperceptível devido ao vosso teatro sindicatos/Governo, pedimos-vos. É hora, é tempo de tomarem uma decisão, uma decisão não egoísta, mas uma decisão que favoreça todos nós, uma decisão igualitária. Obrigado pela compreensão.
Do que discordam os professores que recorrem à greve
Marco Ferreira, professor do 2.º, 3.º ciclos e secundário
Porque não foi e não é devidamente esclarecido, urge elencar os motivos efectivos que levam um(a) professor(a) (e também qualquer cidadão que deseje viver numa sociedade equilibrada) a enveredar por um protesto mais contundente, recorrendo à greve. Os docentes que recorrem à greve discordam veementemente:
– do aumento do número de alunos por turma, que consequentemente, leva à diminuição do número de turmas e respectiva extinção de horários de trabalho, à diminuição da qualidade de ensino por falta de acompanhamento individualizado dos alunos, ao potencial aumento da indisciplina na sala de aula.
– do aumento efectivo do horário de trabalho para além das 40 horas, através do exercício dos cargos pedagógicos que não estão incluídos na componente lectiva (direcção de turma, coordenador de departamento, coordenador área disciplinar, coordenador de projectos pedagógicos, etc.), e através da preparação das actividades lectivas com mais turmas e mais alunos.
– do aumento efectivo do horário de trabalho para além das 40 horas sem qualquer retribuição remuneratória ou em espécie, e levando ao despedimento de 50 mil profissionais da educação sugerido no relatório do FMI, piorando as condições de trabalho aos que ficam no sistema educativo, apenas com o único objectivo de não gastar recursos na educação e canalizá-los para o pagamento dos devaneios dolosos dos decisores políticos.
– da continuação de práticas burocráticas que aumentam as horas de trabalho (por exemplo, os múltiplos documentos exigidos em contexto de avaliação sumativa dos alunos, direcção de turma, coordenação pedagógica, etc.) desviando das tarefas dedicadas ao processo de ensino-aprendizagem.
– da extinção da redução da componente lectiva para os cargos pedagógicos, levando ao aumento do número de turmas por cada professor, e consequente diminuição do acompanhamento pedagógico individualizado, potenciador do insucesso escolar dos alunos, bem como à extinção de emprego.
– da publicação de legislação regulamentadora da actividade profissional e administrativa que destruiu a cooperação, confiança e solidariedade como características aglutinadoras da comunidade escolar.
– do congelamento da progressão na carreira há vários anos, com evidentes prejuízos graves a curto prazo (diminuição da capacidade financeira para suprir o custo de vida) e longo prazo (diminuição do valor de uma eventual pensão de reforma).
– da progressão da carreira em vigor, que impedirá por métodos artificiais (com o estabelecimento de um número de vagas no 5.º e 7.º escalões determinadas pelo Governo) milhares de professores de atingir o topo da carreira, mesmo que legitimamente tenham demonstrado o cumprimento dos seus deveres profissionais através da avaliação de desempenho.
– da avaliação de desempenho em vigor, caracterizada pelo sua enorme subjectividade e arbitrariedade, bem como pela ausência de legitimidade do exercício de avaliador homologada por um sistema isento.
– da desvalorização da profissão docente por parte de alguns sectores da sociedade e dos sucessivos governos da república, denegrindo o seu valor social, e dificultando o exercício da profissão na comunidade escolar.
– da extinção de ajudas de custo e retribuição remuneratória nas situações em que o profissional é obrigado a exercer funções por nomeação, aumento as suas despesas pessoais numa situação de diminuição drástica dos rendimentos, dificultando a sua vida pessoal e familiar.
– da constituição dos mega-agrupamentos, extinguindo a gestão escolar de proximidade e dificultando a gestão administrativa e pedagógica das escolas, diminuindo a qualidade de ensino.
– da descaracterização técnico-pedagógica do exercício da profissão docente, colocando professores a leccionar níveis de ensino e áreas disciplinares para os quais não têm formação académica superior, substituindo professores que foram despedidos.
– do corte salarial efectivado desde 2009, com evidentes repercussões pessoais e familiares na qualidade de vida.
– do projecto de lei que prevê a mobilização coerciva do professor sujeito a ausência de componente lectiva para qualquer região do país, sem qualquer compensação e destruindo a vida sócio-familiar e financeira.
– do aumento da idade da reforma, num contexto profissional de grande número de alunos e de turmas, com evidentes reflexos negativos na saúde individual do docente.
– da diminuição do orçamento das escolas, com diminuição das actividades escolares em quantidade e qualidade.
– da gestão criminosa do Orçamento do Estado pelos sucessivos governos. (...)
– da destruição do tecido económico por gestão danosa e dolosa, retirando esperança e expectativas aos jovens num futuro profissional, levando ao desinteresse e desmotivação na sala de aula, com potencial indisciplina, e repercutindo-se na motivação docente. (...)
Após esta lista incompleta, ainda persistem dúvidas sobre os motivos que levam à implementação do conflito social?
"Os professores não são máquinas"
Tânia Saraiva, aluna do 11.º ano
Não sou aluna de 12.º ano, mas sim de 11.º, com exames nacionais a realizarem-se amanhã (dia 18, Biologia e Geologia) e sexta-feira (dia 21, Física e Química A). Contudo, penso que tenho o direito e o dever de me manifestar.
Tenho familiares professores e conheço bem a vida precária que têm tido nestes últimos tempos, quer com a antiga ministra da Educação (no Governo de Sócrates), quer com o actual ministro, Nuno Crato. E é completamente justificável, sobretudo por um lado, a greve aos Exames e às reuniões de Conselho de Turma, pois só uma greve nesta altura é que traria o impacto necessário… Os professores não são máquinas, são acima de tudo pessoas que merecem ser valorizadas e recompensadas pelo seu trabalho, pois nenhuma profissão seria conseguida sem ter por base um professor. Um médico para ser médico precisou de vários professores.
Se por um lado esta greve poderá trazer benefícios aos professores (e assim o espero), esta também é feita a pensar nos estudantes: como é possível uma turma funcionar com 30 alunos (ou mais)? Como é possível conseguir dar um bom acompanhamento aos alunos se há 30 dentro de uma sala? Já para não falar em aulas de turno, nomeadamente, em Física e Química, nas aulas laboratoriais. É muito difícil gerir um turno de 15 pessoas, cada grupo a desenvolver a sua actividade prática, ainda para mais se a turma for “complicada”… O Governo trata mal os funcionários públicos, segundo Marcelo Rebelo de Sousa, e eu concordo com ele. O Governo, teimoso e manhoso, devia ceder, neste cíclico e vicioso.
Esta greve, que em princípio não se prolongará, não irá afectar os meus exames… Mas afecta os alunos de 12.º ano, cuja média final depende da nota de exame a Português e, também, necessitam dessa prova para ingresso na universidade. E agora questiono-me: será justo uns alunos fazerem exame e outros não, na mesma escola??? Até que ponto esta medida será ética? O que irá garantir aos alunos uma prova com o mesmo grau de dificuldade? Não seria melhor paralisar tudo? Ou seja, todos os alunos fazerem a 2.ª fase do exame, contando como 1.ª fase? Onde está a igualdade de direitos e a igualdade de oportunidades? Isto só gera mais stress aos alunos e sentimento de frustração, o que não é bom nesta época fulcral!
Espero que esta greve tenha feito a mudança… É urgente! É urgente que se tome alguma medida, é urgente qualidade na Educação, é urgente que o País crie oportunidade de emprego aos licenciados – é triste ver pessoas a formarem-se para ajudar o país e, no final de contas, são obrigados a emigrar. Os licenciados portugueses, veja-se os enfermeiros, são altamente qualificados e formam uma carreira de sucesso, lá fora. Cá dentro, é vergonhoso o que ganham por dia… De Portugal, saem excelentes profissionais, é pena que o pais não aproveite o que é dele, por direito…
Fico decepcionada com este Governo, em que coloquei a minha confiança… Mas acreditem ou não, se o Governo cair, ninguém fará melhor ou pior que este… (...)
"Onde está a equidade nestes exames?"
Sofia Macedo, aluna do 12.º ano
Por um lado percebo a greve dos professores e pelo que estão a lutar, mas por outro acabam por nos prejudicar a nós como alunos que precisam das notas para a prova de ingresso. Onde está a equidade nestes exames?
O objectivo dos exames é averiguar os conhecimentos finais dos alunos em todo o país, sendo a mesma prova para todos. Pelo que saiu no exame, tenho a dizer que achei os autores bastante acessíveis e que não são difíceis de entender. E agora nós que não fizemos exame? Vão-nos atribuir obras mais difíceis de certeza e vamos sair prejudicados. Onde está a igualdade de direitos aqui? O sr. ministro Nuno Crato devia simplesmente ter adiado os exames e não colocar duas provas diferentes para a 1.ª fase dos mesmos, visto que agora uns são os ''sortudos'' que tiveram uma prova acessível e os outros vão ser os "tristes" que vão ser prejudicados quando estavam a horas na escola para fazer o exame.
Concluindo, nós percebemos o lado dos professores, que estão a lutar por um futuro melhor, mas quem será que percebe o nosso e o quanto fomos prejudicados com tudo isto? Bem, agora não há nada a fazer, é esperar pelo dia 2 de Julho e ''rezar'' para que a prova seja tão acessível quanto esta e que a greve tenha de facto algum impacto no Governo para que este mude algo para melhor no nosso país.
"Os meus filhos não têm culpa"
Luís Alves, pai de um estudante
O meu filho foi impedido de fazer exame por causa da greve. Neste momento devia estar preocupado com Biologia, mas infelizmente vai ter de continuar preocupado com Português e ao mesmo tempo com a Biologia. Os professores, esses, estão preocupados com os seus direitos.
Eu pago impostos para o Estado garantir que, pelo menos, os meus filhos possam fazer os respectivos exames. Os meus filhos não têm culpa das divergências e diferenças de interesse entre professores e Governo: à política o que é da política e à Educação o que é da Educação. Os professores evidenciaram uma enorme falta de consideração pelos alunos e pelo seu futuro. Não chegaria a greve geral para pararem o país e mostrarem a sua contestação ao Governo? Necessitam de pôr as crianças reféns do clima de guerra entre facções, entre os interesses dos sindicatos e os interesses do Governo?
"Os exames de hoje deviam ser anulados"
Diogo Pinto, aluno do 12.º ano
O exame era, na sua globalidade, fácil, o que provavelmente não ira acontecer dia 2 de Julho. Na minha opinião é uma greve bastante injusta e os exames de hoje deviam ser anulados. Todos de forma igual deveriam realizá-los dia 2. Este exame é uma prova de ingresso condicionando e favorecendo a entrada para a faculdade de milhares de alunos.
"Passados uns minutos chegou outra professora que não conhecíamos"
Francisco Teixeira, professor em Guimarães
Eram 8h da manhã e estava no átrio de entrada da minha escola com mais 20 colegas. Tínhamos acabado de afixar uma faixa no gradeamento exterior dizendo “Escola de Guimarães presentes em defesa da Escola Pública”. O nervoso miudinho era evidente e só se perguntava se alguém já tinha entrado, quer dizer, se alguém tinha furado a greve que, tínhamos a certeza, seria cumprida por pelo menos 90% dos nossos colegas. Sim, alguém já tinha entrado, tinham chegado antes das oito, embora a hora limite para a assinatura da convocatória fosse as 9 da manhã. Alguém comentou: “A S. ofendeu-se por, na sala dos professores, lhe ter oferecido chá. Agora oferecer chá é insulto…”. Os nervos estavam ao rubro.
Pouco depois das 8h00 chegaram os primeiros professores que, aparentemente, não iriam fazer greve. Dois deles nunca os tínhamos visto. Oferecemos-lhes um autocolante em que se lia “Em defesa da Escola Pública”. Recusaram com brusquidão. Embora fosse a primeira vez que entravam na nossa escola tinham-se disposto a substituir-nos para cumprir uma convocatória iníqua, que substituía professores de uma escola por outra, em nome da obediência. Porque a classe dos professores também é feita por homens, estes professores decidiram obedecer às ordens do ministro mais reaccionário da história democrática de Portugal.
Passados uns minutos chegou outra professora que não conhecíamos. Vinha substituir um de nós, nesta greve que sentimos como a mais importante das nossas vidas. Disse-lhe que achava indigno que um professor de outra escola, que não conhecia de lado nenhum e que não fazia parte daquela comunidade, me viesse substituir, e que sentia isso como uma ofensa pessoal. Respondeu-me, indignada e saltando sobre o meu argumento, que tinha o direito de fazer greve e de não ser insultada. Não o tinha sido, claro, mas o peso da minha interpelação evidentemente que tinha sido tremendo.
Às 8h45 subimos todos. Seríamos 50, em greve (os outros tinham ficado em casa).
Na sala dos professores, a um canto, estavam cinco fura-greves, silenciosos. Na outra metade da sala estávamos nós, conversando baixo mas de modo audível, comendo bolachas e bebendo chá. Os olhares frios, ocasionais, entre um e outro campo, eram inevitáveis e cortantes.
Volvidos cinco minutos, uma assessora da direção veio chamar os cinco professores que não fizeram greve. Levantaram-se diligentemente. Um silêncio pesado, súbito, abateu-se sobre a sala, quando se dirigiam para a porta, e todos os olhares se lhes colaram, como mata-borrão em tinta de água.
E então, dois minutos depois, lá saíram da sala do secretariado de exames (assegurada pela directora e por dois adjuntos) em direcção às salas, carregando os embrulhos plásticos e passando pelo meio dos colegas em greve, desligando-se da sua comunidade ante o olhar entre estupefacto e o lívido de quase todos, deitando os olhos ao chão e quase correndo.
E assim se destruiria uma escola e uma profissão não fora o caso de mais de 90% dos professores estarem do lado dos que rejeitam a rendição e a desesperança.
Não, a luta não terminou.
"Ministério poderia ter recuado"
Marisol Cardoso, aluna do 12.º ano
Concordo com a greve dos professores pois acredito piamente que eles tenham os seus motivos. Ao longo do secundário tive a oportunidade de ter professores fantásticos e todos eles com um bom nível de formação, mas que ensinam pelo simples prazer de o fazer. E realmente não são recompensados da maneira que deveriam.
Acho que o ministério poderia ter recuado e adiado a prova de hoje para outro dia, assim mantinham-se os critérios de equidade perante todos os alunos. Existe aqui um adultério explícito da palavra "nacional" que o senso comum dita ser a nível de todo o país – o que não se verificou.
Eu fui impedida de realizar o exame porque o meu nome começa na letra M. O critério de selecção dos alunos que foram seleccionados a realizar o exame foram injustos e cruéis.
Escrevo porque me entristece que o país que me viu crescer, além de não me oferecer qualquer apoio, ainda dificulta a minha caminhada rumo à minha formação como indivíduo e como técnica profissional.
É urgente mais do que nunca investir na educação numa época de crise, e estas situações só vêm agravar o estado actual. Este é um sector de crucial importância, sem os jovens o país não avança e Portugal está a pouco e pouco a expulsar os seus.
"Um professor nunca deixa de ser professor"
José António Calixto
Em resposta ao jornal “Público”, posso falar como aluno, pai e professor, que todos os três fui e sou.
Mas falo antes do mais como cidadão. E nestes termos o que posso expressar é uma preocupação por uma sociedade que de uma forma tão sistemática e prolongada se tem dedicado a destruir o prestígio de uma classe fundamental para a criação de competências e transmissão de conhecimentos entre gerações. Umberto Eco colocou nos lábios do frade Guilherme de Baskerville, em O nome da rosa, a ideia de que nós, a nossa geração, somos anões que se sentam nos ombros dos gigantes que através dos livros nos transmitem o conhecimento acumulado pela humanidade ao longo dos tempos. Pois esses gigantes têm outros que os ajudam a chegar até nós, que os interpretam e descodificam para nós, que procuram por vezes mesmo torná-los atraentes e divertidos para nós. A estes gigantes é costume nos nossos tempos chamar professores. Repito: parecem-me sintoma de grave doença de uma sociedade as tentativas dos últimos tempos para apoucar estes gigantes.
Recordo com carinho alguns destes mestres desde a já longínqua professora do ensino primário (dantes chamavam-se as coisas pelos nomes). Austera e disciplinadora como se queria no início dos anos 1960. Assustava-me o suficiente para evitar cair na sua ira, mas ensinava-nos os nomes dos rios, a escrever bom português com uma letra que se percebia, e mesmo a fazer contas complicadíssimas com números cheios de vírgulas. Não me incutiu o gosto pela leitura, isso devo-o a minha mãe, mas fez-me aprender o necessário para ler com facilidade. Chamava-se Lídia Baião da Costa Cabral, um nome que nunca esqueci.
Muitos outros mestres tive ao longo dos anos, de todos muito aprendi, e a todos estou grato. E se mais longe não fui, isso deve-se mais a alguma vaga indolência e desconcentração do que a menos competência dos mestres. A nenhum sou tão devedor como ao dr. Nestor de Sousa, que no Liceu Nacional de Santarém, já nos finais da década de 1960, foi meu professor de História. Mas não foi esta a principal matéria que ele me ensinou. A mim, e a muitas centenas ou milhares que ainda hoje o recordam, o dr. Nestor ensinou sobretudo valores e princípios, despertou curiosidades e instilou dúvidas, abriu-nos os horizontes culturais e estimulou-nos a desafiar a balofa sociedade salazarenta, a que chamava “a fina flor do velho entulho”. A mim, e a muitos outros, ele incutiu o amor ao teatro, que trazia do TEUC, de Coimbra, também este herdado de outro gigante, Paulo Quintela, amor que ainda hoje perdura em muitos de nós.
Como pai de duas filhas já adultas, só tenho memórias positivas da escola pública que ambas frequentaram em diversos estabelecimentos de ensino. Por todo o lado foram acarinhadas e estimuladas. Todos os seus professores as trataram com doses mais ou menos equilibradas de exigência e amparo, de justiça e compreensão, ensinando-as a estudar e a viver. Em suma, prepararam-nas para a vida, ou melhor ajudaram-nos a nós, seus pais, nesta árdua tarefa.
Fui professor do ensino secundário durante 12 anos, e hoje sou funcionário público, casado com uma professora. Não posso deixar de me sentir revoltado com a forma como os professores têm sido tratados nos últimos anos. As consequências nefastas para a nossa sociedade do rebaixamento do estatuto social dos professores nunca serão verdadeiramente avaliadas. Mas os responsáveis por essas tentativas de nivelamento por baixo (governos, muitas vezes com a ajuda da comunicação social, muitos pais, a quem interessa sempre mais as notas que o aprendido, uma opinião pública ignorante que se rege maioritariamente pelos valores do lixo cultural e dos “reality shows”) brincam com o fogo e arriscam-se a ficar na História como paladinos da ignorância e instigadores da barbárie. Estão muito enganados se acham que os rudimentos de conhecimento necessários à vida se podem transmitir por écrans iluminados, quadros virtuais, ou, quem sabe, em pastilhas liofilizadas. Isto é, que os professores são dispensáveis, e em última análise podem ser substituídos por técnicos indiferenciados de baixo custo.
Em minha casa, casa de professores, sempre se trabalhou mais, por vezes mesmo muito mais, de 40 horas por semana. Isto não é um lamento, mas realmente muito do trabalho de um professor não é contabilizado nem é contabilizável. Os livros comprados e lidos de forma constante e regular, a preparação das aulas com necessidades de actualização permanente, os trabalhos de casa dos alunos que têm de ser corrigidos e devolvidos a tempo e horas, os testes e sua correcção, o trabalho da direcção de turma, a preparação das reuniões de avaliação, os telefonemas que é preciso fazer muitas vezes a expensas próprias e em tempo não contabilizado como “trabalho”. O dinheiro que é preciso gastar pois na maior parte dos casos as escolas não têm condições: papel, toner, computador próprio, impressora, ligação à Internet, etc. Nunca conheci trabalhadores, incluindo os outros funcionários públicos, dispostos a investir tanto tempo e dinheiro na sua própria formação. Falemos de outro investimento, o emocional. Quantos profissionais lidam diariamente com situações tão diferenciadas e por vezes delicadas, com adolescentes e jovens em crescimentos numa sociedade tão problemática como a nossa? A dificuldade é muitas vezes separar a escola e a profissão da vida particular do professor. Sei por experiência própria como o vivido no quotidiano profissional transborda para a conversa e invade o espaço familiar. Ou seja, um professor nunca deixa de ser professor.
Como aluno e pai só tenho a agradecer e louvar os professores das minhas filhas; como professor que realmente nunca deixei de ser só posso pedir que cada um de nós tente evocar as memórias dos seus mestres. Da bruma do tempo surgirão certamente, nítidas, imagens de alguns gigantes sobre quem caminhamos.
Notícia actualizada dia 18/06/2013, foram acrescentados mais testemunhos de leitores