Cientista portuguesa ganha bolsa europeia de 1,4 milhões
Mara Freire esteve quase a emigrar. Ainda bem que não o fez. Agora a investigadora da Universidade de Aveiro distinguida vai usar bolsa para desenvolver fármacos alternativos
Desde criança que queria ser médica. Apesar de óptima aluna, não conseguiu, “por um triz”, entrar no curso de Medicina. Para não ficar um ano a subir a nota, Mara Freire optou por candidatar-se a Química Analítica na Universidade de Aveiro, onde se licenciou e acabou por se doutorar, em 2007.
Há males que vêm por bem. “Hoje sou muito mais feliz”, admite, radiante, a cientista de 33 anos, que acaba de ganhar uma bolsa de 1,4 milhões de euros do European Research Council — Conselho Europeu de Investigação, uma espécie de Prémio Nobel da investigação na Europa.
Um prémio que lhe vai permitir, ao longo de cinco anos, desenvolver “uma tecnologia sustentável de purificação de anticorpos”. O objectivo final é conseguir “desenvolver biofármacos baratos e mais eficazes do que alguns dos actuais antibióticos”, a partir de anticorpos retirados da gema de ovo.
Seleccionada entre mais de três mil candidatos, Mara, que nasceu em Oiã (Oliveira do Bairro), arrebatou o prémio na categoria Starting Grant do Conselho Europeu de Investigação, destinado a projectos de investigadores com menos de sete anos de actividade após o doutoramento.
Convidada para o MIT
A cientista, que trabalha no Centro de Investigação em Materiais Cerâmicos e Compósitos (laboratório associado da Universidade de Aveiro), explica que hoje é cada vez maior a preocupação com o aparecimento de micro-organismos resistentes aos antibióticos e que é grande o interesse no desenvolvimento de novos fármacos alternativos aos actuais. O problema é que o custo da produção de anticorpos é elevado – são necessárias práticas invasivas para os obter de pequenos mamíferos.
“Uma potencial alternativa baseia-se na imunoglobulina Y (IgY), um anticorpo produzido em grande quantidade e presente na gema de ovo”, explica. Só que o custo do Igy ainda é considerável, por não existir uma “técnica de purificação eficaz que separe a imunoglobulina de outras proteínas contaminantes”. É no desenvolvimento desta tecnologia que se vai empenhar Mara Freire e a sua equipa — que é hoje composta por sete alunos de doutoramento, mas que, graças ao prémio, será alargada para 12 elementos. A bolsa permitirá ainda adquirir equipamento.
Ganha a investigadora, ganha a Universidade de Aveiro (aonde Mara acabou de regressar, depois de ter passado pela Nova de Lisboa, enquanto estagiária de pós-doutoramento) e ganha o país. Porque Portugal esteve quase a perder a cientista, que no ano passado ponderou emigrar para os EUA. Foi convidada para o MIT — Massachusetts Institute of Technology — e considerou a hipótese de ir trabalhar para um laboratório no Alabama, mas preferiu ficar porque não quis abandonar a sua equipa e também por razões pessoais. “Foi uma escolha acertada”, acredita. Só lamenta que o país continue a deixar sair para o estrangeiro “tantos alunos brilhantes”.