Tchane Okuyan sai todas as noites para fotografar a revolta em Istambul

Fotógrafo e designer gráfico regista os protestos nas ruas e diz que "já não há democracia".

Tchane Okuyan tem 23 anos. Sai quase todas as noites para as ruas da cidade turca. Além de designer gráfico para a FOX International e para a National Geographic em Istambul, é também fotógrafo, captando sobretudo a vida nocturna no seu projecto pessoal: as festas e festivais, os excessos de uma cidade que é descrita como a “nova Berlim”.

Há dois anos mudou-se com a namorada para Istambul. Viviam em Paris, onde nasceram, filhos de pais emigrantes. Ela de portugueses, ele de turcos. Foram à procura das oportunidades que a vibração da cidade trazia: “Aqui não tens de ter dois ou três anos de experiência para começares a trabalhar, e se mostrares motivação podes chegar longe na carreira. Além disso, Istambul é uma cidade muito jovem, 70% da população tem menos de 28 anos, por isso é um movimento constante”, revela.

No campo da cultura urbana e das artes visuais, Tchane Okuyan encontrou território fértil. Desde que chegou já trabalhou com marcas multinacionais como a Samsung, Red Bull, Finlandia Vodka, Vans, DC Shoes ou a ADIDAS Originals. É presença assídua na imprensa dedicada às artes visuais e urbanas e há poucos meses venceu um prémio de melhor videoclipe com um trabalho para o artista de música electrónica turco BEATFREAK Beduk. “Acho que em Paris não tinha sido tão fácil”, atira Tchane.

Na cidade das oportunidades, Tchane diz que as pessoas estão no limite. “Os cidadãos turcos estão fartos há muito tempo da política do primeiro-ministro”. O rastilho que incendiou o descontentamento chama-se Parque Gezi. “Primeiro o protesto era sobre o Parque Gezi, que querem destruir para construir um enorme centro comercial, igual a tantos outros que já existem em Istambul”, explica Tchane. A polícia dissipou os manifestantes que pacificamente se instalaram no parque, a poucos metros da Praça Taksim, com gás lacrimogéneo e canhões de água. Os milhares que não estavam no parque apareceram. E têm saído à rua nos últimos cinco dias“Os nossos protestos pacíficos fazem parte da expressão democrática. Mas a reacção da polícia mostrou-nos que aqui já não há democracia. E agora já não é apenas em Taksim, mas em todas as pequenas e grandes cidades do país que as pessoas estão a demonstrar o seu descontentamento”, afirma.

Os milhares de turcos que se manifestam agora nas ruas, naqueles que são os maiores e mais violentos protestos da última década, reprovam as medidas do primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan que descrevem como sendo autoritárias e conservadoras. A oposição turca acusa o partido no poder, o Partido da Justiça e do Desenvolviemnto (AKP), de violar as liberdades individuais ao aprovar, no Parlamento, uma lei que limita o consumo de álcool, a sua venda e a publicidade a bebida alcoólicas. A lei foi aprovada em nome da saúde dos cidadãos, a oposição argumentou que os motivos são religiosos.

Para Tchane, a revolta popular está para além disso: “Não é só o consumo de álcool, ele está a tentar limitar liberdades fundamentais”. Por estes dias, activistas do movimento “Occupy Gezi” denunciam a censura nos meios de comunicação social, acusando as televisões, por exemplo, de não mostrarem os protestos e a violência policial. O primeiro-ministro atribui as manifestações a grupos extremistas e culpa as redes sociais. Tchane não sabe bem o que imaginar para o fim desta história. “Espero que o Governo entenda a diferença entre governo e religião. Não nos podem forçar a ser muçulmanos ou o contrário. Somos filhos de Atatürk [escritor, revolucionário e primeiro Presidente da República da Turquia] e este é um país republicano. Estou muito contente com o povo turco, por se unir e protestar em conjunto, mas temos de pedir à polícia para parar. Mas, no final, acho que nada vai mudar.”

 

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