O preso, o estudante e as gajas nuas

Gostava de saber quais teriam sido as reacções caso a vítima no recinto da Queima das Fitas tivesse sido um dos seguranças e não um estudante

Foto
Paulo Pimenta

Nunca fui grande adepto de novelas. Tive sempre preferência por séries, em particular comédias e dramas envoltos em mistério e suspense. No entanto, de há uns anos para cá, confesso que tenho seguido uma com especial atenção. Mais ainda nas últimas semanas porque, aparentemente, está a chegar ao fim. A história até não tem nada de novo e é semelhante a muitas outras reproduzidas diariamente no nosso Portugal. Mas aquilo que verdadeiramente sempre me agradou foi o desempenho do actor principal: Isaltino Morais.

Falando mais seriamente e estamos perante um enredo, no mínimo, surreal. Como é possível alguém ter estado tanto tempo em liberdade, ver penas reduzidas e, como se isso não bastasse, ser eleito autarca? Afinal a Lei é mesmo vulnerável, excessivamente protectora e pouco “preocupada” em fazer aquilo a que se propõe: justiça. Isso e, afinal e com todo o respeito para com a classe, que existem advogados muito bons.

E não é só neste caso. Na Alemanha, por exemplo, muitos dos envolvidos no famoso caso dos submarinos estão a ser julgados atrás das barras. Em Portugal ainda não se sabe bem o que está a acontecer e até o responsável pelo ministério da defesa de então passou a ministro dos negócios estrangeiros. A Lei não é, definitivamente, igual em todo o lado.

Foto
Jorge Baldaia escreve regularmente a rubrica Portugal à vista

Mas voltemos ao cidadão Isaltino Morais. Tenho sobre o seu caso três pontos a reter. O primeiro é que parece que o senhor vai mesmo cumprir pena numa cela lá para os lados da Carregueira. O segundo é que a justiça é lenta e funciona mal. O terceiro – tendo em consideração dados que dão Oeiras como o concelho de Portugal com o maior número de habitantes com formação superior – é que gente qualificada não significa necessariamente gente inteligente. Ou então, nas autárquicas de 2009, votaram todos nos candidatos da oposição...

Outra notícia que chamou a minha atenção (e numa altura em que estava na cidade do Porto) foi a do estudante que perdeu a vida no recinto da Queima das Fitas da Universidade local. Lamentável. Recordo-me de ter lido a notícia era já de madrugada e antes de me deitar. Pensei de imediato que, para muita gente, a festa estava estragada. Mas não me passou sequer pela cabeça que assumisse tamanha dimensão social ao ponto de se falar de encerramento do recinto e até mesmo, com algum radicalismo, cancelamento dos festejos estudantis.

E foi isto que me causou surpresa: as reacções. Como bom português sei que muitos de nós têm tendência para o exagero e fazer de algumas coisas uma espécie de fim do mundo. Também muitos gostam de julgar os outros. Mas há limites. Há que ter discernimento. E neste caso assisti a muita falta dele. Incomodou-me o dramatismo e a dose de falso moralismo de muitos em torno deste triste incidente. Li e ouvi muita coisa. Algumas apropriadas e outras desajustadas.

Como tal, com todo o respeito pelos envolvidos (em particular familiares e amigos do Marlon) e correndo o risco de ser mal interpretado, coloquei uma pergunta a alguns amigos: “gostava, por exemplo, de saber quais teriam sido as reacções caso a vítima tivesse sido um dos seguranças e não um estudante?”. Esperei largos segundos pelas respostas.

Para terminar uma notícia que tem dado que falar pelo mundo fora. Refiro-me ao programa "Blachman", do canal público dinamarquês DR". Sim, o tal com as gajas nuas.

Devem estar a pensar “mas que é que isto tem que ver com Portugal?”. Nada e tudo. Nos dias que passei por aí notei que as pessoas andam tristes. Acho que estão a precisar de sorrir e se distraírem. E porcaria por porcaria sempre seria mais aceitável um programa destes na televisão portuguesa a abominações como o Big Brother e afins. Até podia ter uma versão com gajos nus. E pelo menos a malta sempre aprendia alguma coisa sobre anatomia humana.

Sugerir correcção
Comentar