Consenso, essa ideia “arriscada” e de “utilidade questionável”

Enquanto os cientistas sociais apontaram as fragilidades dos consensos em democracia, Poiares Maduro insistiu na sua necessidade e o PS descartou a hipótese e pediu debate no Parlamento.

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O ministro Miguel Poiares Maduro Miguel Manso

Mas o tom das intervenções dos especialistas, no entanto, foi diferente. Quem os ouviu - Zorrinho saiu logo após a sua intervenção, na abertura, e Poiares Maduro chegou já o segundo painel decorria - percebeu que se impunha pôr água na fervura quanto à defesa de governos alargados.

Numa análise ao caso português, Marina Costa Lobo explicou por que é que a actual conjuntura era adversa a esses acordos. Primeiro identificou os tipos de democracia existentes: a adversarial - onde existiam dois partidos principais, com posicionamentos claros cujo combate político se fazia na escolha entre dois primeiros-ministros - e a consensual, que dava primazia às alianças entre partidos por necessidade de inclusão para assim legitimar a comunidade.

Foi depois da contextualização que rematou que Portugal sofreu “mudanças” ao passar de um “modelo consensual” para a “bipartidarização”. Uma “evolução” em sentido exactamente contrário à coligação governamental, uma vez que, no processo, “o PS e o PSD perderam capacidade de consenso e negociação”.

Depois havia os riscos e a utilidade, para os quais António Costa Pinto, Andres Malamud e Riccardo Marchi alertaram. Costa Pinto lembrou que a “erosão do sistema partidário” não tinha chegado a níveis suficientes que justificassem esse tipo de soluções. E disse mesmo que, “do ponto de vista da qualidade da democracia”, era preferível que o PS dissesse “não” ao apelo do consenso. Devia, rematou, fazer “pactos” em algumas áreas, ao mesmo tempo que tentava canalizar o descontentamento do eleitorado.

Andres Malamud explicou porquê. “Os consensos, por vezes, são conservadores e ineficientes”, começou por dizer. E depois alertou para o risco. “Se [uma coligação PS-PSD] não fosse bem sucedida, colocaria em causa o sistema partidário”, uma vez que a inclusão dos dois grandes partidos no mesmo governo impedia que houvesse percepção de alternativas para o eleitorado, empurrando-o para outsiders.

Nem de propósito, Riccardo Marchi falou de Itália. Para dizer que os governos “técnicos” de iniciativa presidencial e apoiados pelos grandes partidos - como o anterior de Mario Monti - se tinham a utilidade de servir como “salvação para os partidos para tomar decisões impopulares”, não tinham “resolvido os problemas institucionais ou económicos” com que se defrontavam.

As cartas, Zorrinho e Maduro     
O único dos políticos que escutou, em parte, o cenário retratado admitiu não ter gostado do que ouvira. Mesmo assim Poiares Maduro empunhou a sua bandeira com orgulho. Anunciou desde logo com humor que usaria palavra “consenso” 49 vezes. E depois sustentou que o consenso não implicava “identidade total”, apesar de ser “útil” por obrigar a “ouvir o outro lado” e a negociação para “ajudar a chegar mais próximo das melhores soluções”. Zorrinho, por seu turno, até defendera o consenso a “médio prazo”. Mas para temas diferentes dos propostos: energia, políticas de terceira idade e a ideia de Portugal enquanto “país-conceito”. Sobre o presente disse que não faz “sentido continuar a alimentar ilusões”.

Posição que se manifestou na resposta do PS à carta de Maduro apelando ao diálogo sobre propostas para o crescimento. O debate sobre o tema deve ocorrer na comissão parlamentar de Economia e Obras Públicas, resumiu o PS, através do porta-voz, João Ribeiro. Mas, se esse debate existir e o Governo insistir, o PS aceita reunir com o executivo. E frisou: “O Governo sabe que este convite surge 22 meses após a sua posse e depois de ter fechado as portas a qualquer contributo do PS para dinamizar a economia nacional e preservar o emprego”. com Rita Brandão Guerra
 
 
 

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