É um filme de acção realizado por um dramaturgo irlandês nos EUA. Conta a história de um argumentista irlandês em Hollywood que está a escrever um filme de acção intitulado Sete Psicopatas ajudado por uns quantos psicopatas que vão contribuindo episódios e criticam o que não funciona. Mais meta-referencial do que isto é impossível: o irlandês Martin McDonagh, que já viu as suas peças A Rainha de Beleza de Leenane, O Homem-Almofada e Perdi a Mão em Spokane encenadas por cá e que assina aqui o seu segundo filme após Em Bruges (2007), faz o filme, desconstrói-o e critica-o, ao mesmo tempo que dá uma valente ensaboadela ao clássico filme de acção. Há que dizer que não tem unhas compridas que cheguem para tocar a sua guitarra de Tarantino literato, mas não é por muito: o modo como a sua construção narrativa navega entre níveis de texto e subtexto exigia um realizador mais experiente que não deixasse a fita tombar pontualmente na aridez de tese meta-ficcional.
Mas isso não é muito preocupante face ao modo como o dramaturgo vai atirando granadas subversivas ao cinema de acção, entre um psicopata de apelido Bickle (não pestaneje senão perde Sam Rockwell a evocar De Niro) e outro chamado Kieslowski (que é um rapaz polaco obcecado com a religião católica), aos diálogos inspiradíssimos, à entrega alucinada dos actores. E que actores: um imperial Christopher Walken, um possuído Woody Harrelson e um tresloucado Sam Rockwell conseguem deixar Colin Farrell (que maneja como poucos a “irlandesice” deste humor) a milhas; e ainda há Tom Waits a passear a sua bizarria como quem não quer a coisa. Martin McDonagh pode não conseguir levar o jogo até ao fim com o mesmo sucesso, mas que isso não nos impeça de o apreciar devidamente.