Crianças de bicicleta sem capacete podem pagar até 300 euros de multa
Proposta de lei com alterações ao Código da Estrada dá mais atenção aos ciclistas, mas associações do sector não estão totalmente satisfeitas.
Na proposta de lei entregue ao Parlamento, onde agora seguirá o processo legislativo, as crianças até sete anos têm obrigatoriamente de andar de capacete. Se não o fizerem, prevêem-se multas de 60 a 300 euros, embora não seja claro a quem, em concreto, elas serão aplicadas.
A questão do capacete é uma entre várias que abordam as bicicletas nas alterações propostas pelo Governo. E é também uma das que não agrada aos ciclistas. Mário Alves, da Mubi – Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta, afirma que em países onde o uso de capacete foi declarado obrigatório — como a Austrália e a Nova Zelândia — o número de ciclistas caiu 40 a 60%. E ter menos cidadãos a pedalar mas com capacete, afirma Alves, é pior do que ter mais ciclistas sem capacete, em termos de saúde pública. “Se queremos encorajar o uso de bicicletas, não é por aí”, diz.
“É mais uma medida restritiva ao uso da bicicleta”, concorda José Manuel Caetano, presidente da Federação Portuguesa de Cicloturismo e Utilizadores de Bicicleta. “Melhor seria fiscalizar a qualidade do capacete”, completa.
Os ciclistas não estão satisfeitos também com o nível de prioridade dado às bicicletas. Apesar de várias modificações prometerem maior atenção ao ciclista, mantém-se a obrigatoriedade de circular o mais próximo possível das bermas. No diploma estipula-se que o ciclista mantenha da berma “uma distância que permita evitar acidentes”, mas não diz qual é esta distância.
“O mais próximo da berma é o sítio mais perigoso para se andar”, diz Mário Alves, da Mubi. José Manuel Caetano acrescenta que há uma série de potenciais perigos, como sarjetas onde as rodas podem ficar entaladas, piso irregular, lixo e, sobretudo, o risco de o ciclista ser ultrapassado à rasante por automóveis. Muitos dos acidentes com bicicletas, diz José Manuel Caetano, resultam de toques do espelho retrovisor em situações destas.
“O que queríamos era manter o eixo da via, como qualquer outra viatura”, afirma o presidente da federação de cicloturistas.
Prioridade à bicicleta
A questão da prioridade dada à bicicleta é o ponto central das aspirações dos ciclistas. “A prioridade deve ser do veículo mais leve para o mais pesado”, diz Mário Alves. “À aproximação de um ciclista ou de um peão, o condutor devia abrandar em qualquer circunstância. São o elo mais fraco da cadeia”, acrescenta José Manuel Caetano.
Muitas modificações propostas pelo Governo procuram ir neste sentido. Os condutores deverão sempre abrandar a velocidade e ter especial atenção à distância em relação aos “utilizadores vulneráveis” — uma nova categoria que inclui as bicicletas e os peões e que também consta do projecto de lei enviado à Assembleia da República.
As regras para as passadeiras de peões também ficam a valer para as passagens de bicicletas — como ciclovias que atravessem ruas. E se houver vias de bicicletas que cruzem faixas de rodagem, os carros devem ceder a passagem. Mas parte da responsabilidade da segurança é depositada nos próprios ciclistas, que “não podem atravessar a faixa de rodagem sem previamente se certificarem que, tendo em conta a distância que os separa dos veículos que nela transitam e a respectiva velocidade, o podem fazer sem perigo de acidente”.
Outras modificações vão ao encontro do que os ciclistas reivindicavam, como a permissão legal de duas bicicletas andarem lado a lado na rua, até que surja um automóvel.
As crianças até aos dez anos são equiparadas aos peões e podem andar de bicicletas nos passeios. E nas ciclovias, passa a ser permitido circular com atrelados para transporte de crianças.
As novas normas do código, caso sejam aprovadas, permitirão o bloqueio ou remoção de automóveis que estejam a bloquear ciclovias ou passagens próprias para bicicletas.
O reino dos peões e dos ciclistas serão as chamadas “zonas de coexistência”, onde os automóveis só poderão andar a 20 quilómetros por hora. São vias especialmente concebidas para serem partilhadas por peões e veículos, e onde as bicicletas poderão andar à vontade.
No global, a Mubi saúda as alterações, mas diz que persistem alguns problemas graves. A Federação Portuguesa de Cicloturistas não está satisfeita. “Tem 25% do que queríamos. Isto não é nada”, queixa-se José Manuel Caetano.