Quarta Divisão

Vai-se ver Quarta Divisão na expectativa de que Joaquim Leitão não se ponha a jogar às escondidas com o seu próprio talento, com demasiadas vezes tem acontecido na sua obra. A última vez em que ele o soltou foi em 20,13, filme de 2006, evocação ferida da guerra colonial, rica em personagens, rica em dramaturgia, e onde se entrevia o mesmo Joaquim Leitão que no final dos anos 80 assinou, em Duma Vez Por Todas, uma belíssima primeira obra. Mas essa expectativa, Quarta Divisão decepciona-a, e é outra vez um filme onde Leitão parece amordaçado. Amordaçado, em primeiro lugar, por um catálogo de “temas” (a pedofilia, a violência doméstica), fantasmas muito contemporâneos que o filme evoca sem empenho, de maneira singularmente desafectada e demonstrativa, como se os evocasse apenas porque evocá-los é parte fundamental do seu programa - como o demonstram as legendas do genérico final, mensagens e números sobre a violência doméstica em Portugal, ponto de chegada que encafua o filme na gaveta do “alerta social”. Desperdiça-se a energia daquilo que no princípio (e no título) parece a premissa, não muito distinto do de algumas boas séries de televisão: acompanhar as actividades de uma brigada policial, em “casos” (aqui, o desaparecimento de um miúdo) que seriam sobretudo o pretexto, o fil rouge, para mostrar uma grande metrópole a pulsar. Ainda que em desequilíbrio, até por uma evidente falta de meios, a energia da dupla de polícias (Carla Chambel e Sabri Lucas) é o melhor do filme. Mas também ela soçobra, e se desvanece, à medida em que o verdadeiro centro do filme - uma história de violência e vingança conjugal - se impõe, de maneira cinzenta e bastante forçada.

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