O desafio de seleccionar as melhores cinco paredes deste ano é tarefa complicada, não tivesse sido este um dos melhores anos para a street art em Portugal. Não só pela quantidade e qualidade indiscutível das produções realizadas por artistas nacionais e internacionais, pela afirmação da cultura, projectada, por exemplo, na constante atenção dos media ou nos eventos e festivais que se realizaram ao longo do ano (para se ter uma ideia melhor, aconselho visita ao site Stick2Target), mas também pelo contexto que se vive em Portugal, que influenciou a abordagem dos artistas de rua à rua, sentindo-se uma auto-consciencialização do seu micro-poder.
Assumidamente suspeito, farei deste último motivo o meu critério de escolha. Estas paredes não são só paredes e não são, seguramente, as peças mais complexas esteticamente, mas são, talvez, as mais representativas de um ano muito particular. Neste sentido e sem uma ordem específica:
Realizados por Nomen, Slap, Kurtz, Exas e Luka, os três murais das Amoreiras não só percorreram os media do mundo (chegaram à China), como são a melhor prova que a abordagem dos writers à rua se está a transformar, influenciada pelo contexto que se vive no país. São sinais positivos numa conjuntura negativa. Estes nomes, todos ligados ao grafitti mais puro (esteticamente desligado de mensagens políticas, apesar da sua génese e afirmação serem essencialmente socio-políticas), criaram um revivalismo formalmente actualizado dos murais políticos característicos dos anos setenta, projectando mensagens facilmente percepcionáveis, mas essenciais também pela qualidade que oferecem ao mural político.
Menau dedicou-se à instalação política e criou um super herói português que se espetou, literalmente, contra uma parede e enforcou a bandeira portuguesa na berma de uma estrada. Esta última valeu-lhe um processo em tribunal.
É um dos projectos de intervenção mais activos em Portugal e este ano, o MAISMENOS, ao contrário do país, não andou para trás. Esteve inserido no projecto ON.OFF, em Guimarães, e conseguiu ilustrar, de forma mordaz, o estado do país, gerando polémicas que suscitaram o interesse continuado dos media. De destacar o stencil pintado na Rua do Alecrim, no cento de Lisboa, onde a palavra 'silêncio' forma, em conjunto com a arquitectura do edifício, um templo devoluto, dedicado às palavras de ordem que tanto demoraram a sair da boca dos portugueses. O 'silêncio' ainda não deixou de existir.
Foi logo no início do ano que Adres decidiu oferecer um presente aos deputados da Assembleia da República: duzentos e trinta sacos (tantos quantos os deputados), cheios de jornais onde se noticiava o lixo das suas políticas. Deixa o ano fechado com um mural onde uma figura representativa da morte assume o papel de writer e deixa escrito na parede a sua próxima vítima: Portugal. Bom presságio para 2013.
Anónimos
Este último espaço não é dedicado a nenhum artista ou mural em particular. É dedicado a todos os que saíram à rua com a perspectiva de intervir, de contestar, de protestar. É dedicado às inúmeras palavras de ordem que se espalharam pelo país, em paredes ou cartazes, palavras que não se perdem no anonimato, mas encontram-se, precisamente, numa consciência global. Continuem o vosso trabalho.