Vinci vai investir 400 milhões na ANA nos próximos dez anos
Franceses assinam contrato no início de Janeiro e ficam com todos os dez aeroportos nacionais por 3080 milhões de euros. Não está ainda fechada a porta a sócios portugueses
Já se sabia que os franceses da Vinci, que ontem ganharam a corrida à privatização da ANA, tinham a proposta financeira que mais satisfazia o Governo. De entre os quatro candidatos, foram os que ofereceram mais dinheiro pela empresa, num total de 3080 milhões de euros. Mas o grupo, que assinará o contrato de compra nos primeiros dias de Janeiro, dispõe-se ainda a investir mais 400 milhões na rede aeroportuária nacional, que ficará a gerir durante os próximos 50 anos.
O PÚBLICO apurou junto de fonte governamental que este será o bolo a despender faseadamente pelo novo dono da ANA ao longo de dez anos para assegurar a eficiência dos aeroportos e também a sua expansão. A maior fatia, de 300 milhões, será utilizada no Aeroporto de Lisboa, que já tinha um plano de melhorias em curso para fazer frente à saturação da infra-estrutura. Finda a primeira década de contrato, haverá lugar a novos investimentos.
Além da Portela, a Vinci, liderada pelo francês Xavier Huillard, ficará com todos os restantes aeroportos nacionais: Porto, Faro, Beja e quatro nos Açores. Também a Madeira, com os aeroportos do Funchal e de Porto Santo, foi incluída no pacote, já que o Governo Regional aceitou vender a participação dos 20% que detém na empresa que os gere. A transferência destes activos para as mãos do accionista privado só acontecerá depois de os reguladores (nacional e europeu) se pronunciarem sobre o negócio, que o Governo prevê que fique fechado em definitivo até ao final do primeiro semestre.
O contrato de compra será assinado já em Janeiro, com o pagamento imediato de cem milhões de euros - o sinal estabelecido pelo Governo para assegurar que o investidor escolhido avançará. Só quando as acções da ANA forem transferidas para a Vinci é que entrará nos cofres públicos a restante fatia oferecida pelo grupo, que hoje gere nove aeroportos em França e três no Camboja. Além disso, o contrato de concessão prevê que a partir do 11.º ano o grupo pague ao Estado uma comissão sobre as receitas, que chegará a 10%.
A ideia do grupo francês é fazer da gestora nacional uma alavanca para investimentos em novas geografias, que terá já em estudo. E, apesar de ter concorrido sozinha a esta privatização, já há conversações com vista à abertura do capital da ANA a novos sócios. Um passo que a Vinci sempre assumiu que daria caso saísse vencedora. Embora a vitória dos franceses tenha afastado os únicos portugueses que estavam na corrida (a Sonae Sierra e a Empark, em associação com os argentinos da Corporación América), a porta não está fechada ao investimento nacional.
O comprador da gestora aeroportuária é obrigado a manter as acções durante cinco anos, mas o Governo introduziu uma cláusula no contrato que permite a entrada de novos sócios. Só nos casos em que os parceiros queiram deter mais de 10% do capital é que estão obrigados a cumprir os mesmos requisitos impostos à Vinci, como operar no sector das infra-estruturas aeroportuárias.
Encaixe de 6400 milhões
O executivo já tem um plano para os 3080 milhões de euros oferecidos pelo investidor. A ideia é abater a dívida pública em 1200 milhões e utilizar cerca de 700 milhões para liquidar o passivo da ANA. O restante dinheiro, outros 1200 milhões de euros, servirá para abater ao défice e, com isso, cumprir a meta estabelecida com a troika para este ano (5%).
O problema é que ainda não é garantido que as autoridades europeias aceitem que a venda da gestora do Estado seja utilizada com outros fins que não o da redução da dívida. O executivo encontrou uma forma de contornar a questão e vendeu em meados deste mês a concessão dos aeroportos à ANA, ainda enquanto empresa pública, com a justificação que a gestão das infra-estruturas nunca tinha sido registada.
É com os 1200 milhões que resultam da operação que se pretende atingir a meta dos 5% negociada com as autoridades externas, mas o Eurostat, gabinete de estatística europeu, ainda não deu luz verde. E o executivo acabou por admitir ontem que não existe um plano B para resolver a questão, caso o plano seja chumbado e os limites do défice ultrapassados.
Apesar das pontas soltas, o Governo aproveitou a escolha do comprador da ANA para fazer um auto-elogio, uma semana depois de ter anunciado a suspensão da venda da TAP, que tinha como único interessado o milionário Germán Efromovich. O programa de privatizações "é revelador da capacidade de atrair investidores estrangeiros estáveis e de referência, da execução de calendários apertados e de obter encaixes acima das expectativas", disse a secretária de Estado do Tesouro, Maria Luís Albuquerque, a seguir ao Conselho de Ministros.
Até agora, a venda da ANA foi a mais valiosa, tendo contribuído para que os objectivos de encaixe com privatizações fossem ultrapassados. Os 3080 milhões de euros a arrecadar com este negócio somam-se aos 2700 milhões conseguidos com a venda de 21,35% do capital da EDP à China Three Gorges e dos 592 milhões gerados com a alienação de 40% da REN à State Grid e à Oman Oil. Ou seja, as receitas globais já atingiram perto de 6400 milhões, quando o objectivo firmado com a troika era de 5500 milhões.
Mas a lista de activos a privatizar ainda vai longa, com as atenções agora focadas para os Estaleiros de Viana do Castelo (cuja venda já não acontecerá em 2012) e para a RTP, que o Governo tinha prometido levar a Conselho de Ministros até ao final do ano. Ontem, abriu-se uma nova frente com a aprovação da concessão a privados da Empresa Geral do Fomento, do universo da Águas de Portugal. E está ainda na agenda a curto prazo a privatização da CP Carga e dos CTT.