Há algo a aprender com Ratan Tata?

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Teve grande impacte o processo de selecção do sucessor de Ratan Tata na presidência do Grupo Tata. Estava em causa o futuro do grupo, que, no ano 2011/12, ultrapassou a facturação de 100.000 milhões de dólares; com este procedimento, terá ficado mais claro que sobre a empresa recai uma "hipoteca social", e ela não é um brinquedo nas mãos dos proprietários ou dirigentes. Ratan deixou já um objectivo orientativo ambicioso ao próximo presidente: facturar 500.000 milhões de dólares em 2020/21!

Num país que, até 1991, estava encalhado num modelo económico socialista e retrógrado, matando a iniciativa com favoritismos e corrupção, Ratan Tata foi capaz de apanhar a nova onda da livre iniciativa, modernizando o seu grupo e dando-lhe uma dimensão global, com uma presença invejável em mais de 80 países dos cinco continentes, e com mais de 50% das receitas a provirem hoje de fora da Índia. Ratan Tata dizia que a globalização do grupo "não era apenas para aumentar a facturação, mas sobretudo para estar em locais onde possamos criar uma presença significativa e participar no desenvolvimento do país". No ano fiscal 1991/92, quando Ratan foi nomeado CEO, o grupo facturava apenas 5.800 milhões de dólares, todos na Índia.

Algumas das empresas do grupo laboram em novas tecnologias, na ponta do saber, discutindo a primazia com empresas americanas avançadas, de existência muito mais antiga. É o caso da TCS-Tata Consultancy Services, com mais de 250.000 trabalhadores muito especializados, que incorporou 66.000 no ano passado e cerca de 60.000 este ano, tendo facturado 10.170 milhões de dólares em 2011/12.

A outra empresa do grupo que ganhou notoriedade foi a Tata Motors. Fez duas proezas que demonstram a capacidade de lançar desafios, por parte dos dirigentes, e de lhes corresponder, por parte dos seus trabalhadores. Comprou uma empresa estagnada, a Jaguar Land Rover, à Ford, que não sabia que destino lhe dar, por ela própria estar à beira da falência. O Grupo Tata deu-lhe um formidável impulso, a ponto de ser hoje uma das empresas mais rentáveis do grupo.

Ao mesmo tempo, na Tata Motors, o próprio Ratan desafiou-a a algo que nunca tinha ocorrido na indústria do automóvel: a projectar e construir "o carro mais barato", acessível na Índia a quantos faziam da scooter o meio de locomoção familiar, transportando quatro pessoas em condições muito precárias. Fixou-lhe o preço de 1 lakh de rupias, equivalente a 2.200 dólares; o carro é muito vendido na Índia e, em breve, sê-lo-á também na Europa e nos EUA.

O Grupo Tata teve desde a sua criação, há 144 anos, uma vertente marcadamente patriótica e filantrópica. A Tata Sons participa no capital de 182 empresas; 66% do capital da Tata Sons são propriedade de fundações filantrópicas ligadas à família Tata. Realizações de grande alcance nacional desta prática remontam aos primórdios do grupo: por exemplo, em 1909, foi criado o Tata Institute of Sciences, em Bangalore, um centro de investigação em Química, Física, Biologia, etc., oferecendo uma plataforma para mestrados e doutoramentos, que já formou uma plêiade de cientistas de nomeada nos campos nuclear, espacial, em biologia, neurociências, tecnologias, etc. Com a independência da Índia, a famíla Tata achou que já não tinha sentido ostentar o nome Tata, ficando então a designação reduzida a Indian Institute of Sciences.

Algo parecido se deu com o Tata Memorial Hospital, fundado em 1941, em Mumbai, dedicado ao cancro, onde qualquer doente era muito bem tratado, sem encargos. Em 1952, logo após a independência, passou a chamar-se Cancer Research Institute (CRI), deixando de parte "Tata", que era importante antes, para marcar distâncias, mas já não o era depois; a partir de 1957, o hospital é gerido pela Comissão de Energia Atómica Índiana. Cerca de 70% dos milhares de doentes são hoje tratados gratuitamente.

No campo das artes, foi criado o National Centre for the Performing Arts, que impulsionou a investigação e a difusão desses saberes. Todos os centros de trabalho do grupo - fábricas, aciarias, etc. - têm um ambiente de segurança exemplar no trabalho, mormente nas suas implicações com a saúde.

Na onda expansionista, alguma aquisição revelou-se desastrosa, pelo elevado custo, na euforia económica, e pela queda da procura com a crise europeia e dos EUA. Exemplo disso é o grupo siderúrgico Corus, com mais de 30.000 trabalhadores, que tem dado elevados prejuízos. Nas telecomunicações fixas e móveis, o grupo entrou na fase da sua liberalização na Índia, mas a competição dura entre os operadores ainda não lhe deixa margem confortável. Na hotelaria, a marca Taj é uma referência na Índia; contudo, os retornos podem ser melhorados.

No conjunto da sua obra, Ratan pode sentir-se orgulhoso de deixar um conglomerado dinâmico, inovador, com muito boa imagem, virado para o futuro, empenhado na criação de riqueza e de trabalho. O grupo ocupava mais de 460.000 trabalhadores em Maio de 2011. A sua dimensão e o sentido de responsabilidade levaram Ratan a nomear uma comissão para lhe encontrar um sucessor. Os procedimentos de transição, de grande pedagogia, são próprios de uma instituição séria que quer honrar as suas obrigações perante o país, e são um modelo a seguir por qualquer conglomerado, indiano ou não, socialmente responsável. Foi escolhido Cyrus Mistry, de 44 anos, filho de um dos accionistas e administradores da Tata Sons, ele próprio administrador, mas não da família Tata. Tomará posse como presidente hoje mesmo, 28 de Dezembro.

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