No papel, "Cloud Atlas# tem tudo para ser intragável. O alemão Tom Tykwer passou a carreira a subordinar a função à forma sem repetir a frescura de "Corre Lola Corre", os manos Wachowski perderam-se nos labirintos do cinema virtual à procura da saída da Matrix. Juntos, atacam-se a uma adaptação all-stars do romance de David Mitchell que cruza seis histórias interligadas em seis tempos históricos diferentes, do século XIX a um futuro pós-apocalíptico. Podia ser tão indigesto como Babel, mas resulta surpreendentemente bem, uma meditação sensorial sobre a liberdade e a humanidade que não anda longe da Árvore da Vida de Malick em mais narrativo; é um filme de uma sobriedade notável para os seus autores que flui ao longo de três horas com uma desenvoltura invulgarmente uniforme (o trabalho de montagem de Alexander Berner é assombroso). Sobretudo, Cloud Atlas é mais do que uma mera soma das suas partes, ultrapassa as fragilidades de alguns episódios e os truques pontuais (a ideia de colocar os mesmos actores em papéis diferentes nem sempre resulta), atinge nos seus melhores momentos uma poesia inesperada e transcendente. E, sobretudo, é um filme de uma ambição desmesurada como já não existe hoje, que insiste em tratar os espectadores como intervenientes activos e não apenas assistentes passivos, que quer ser popular e adulto ao mesmo tempo. Que não seja perfeito não é problema; que exista e faça sentido é excelente.
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