Tribunal aceita reduzir 40 milhões da dívida do Autódromo do Algarve
Pequenos credores queixam-se de não ter sido respeitado o "princípio da igualdade". Muitos dos eventos motorizados internacionais vão deixar de integrar o calendário do circuito
A Parkalgar, gestora do Autódromo Internacional do Algarve (AIA), viu ontem aprovado pelo Tribunal de Portimão o seu plano de reestruturação financeira, que prevê o perdão de 40 dos 160 milhões de dívida acumulada (25% do total). Este foi apenas o quarto Processo Especial de Revitalização (PER) a ser homologado em Portugal, por decisão judicial, seis meses depois da entrada em vigor do novo Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE).
Rejeitado por muitos dos pequenos credores, o plano de recuperação da Parkalgar foi viabilizado por uma clara maioria dos créditos, maioritariamente representados pelo Banco Comercial Português (BCP) e pela construtora Bemposta. Sozinhos, estes dois credores garantidos ultrapassaram largamente os dois terços dos créditos exigidos para a aprovação de um PER, representando um total de 79%.
Com 117,4 milhões de euros de crédito reconhecido, o BCP aceitou reduzir a dívida da Parkalgar para 94,3 milhões, mantendo a Bemposta, Investimentos Turísticos do Algarve os 10,3 milhões que reclama à gestora do AIA. Um crédito garantido pelo direito de retenção sobre os apartamentos turísticos em construção, que servirão de garantia para a liquidação parcial da dívida remanescente a todos os credores.
Tentativas de impugnação
Insatisfeita com este PER está a grande maioria dos denominados "credores comuns" que, no seu conjunto, viram reconhecidos um total de crédito de 23,5 milhões de euros. Irão ver drasticamente reduzidas as respectivas dívidas, em 70%, para além de serem obrigadas a perdoar 100% dos juros e eventuais indemnizações compensatórias. O valor global em dívida passará para 6,6 milhões de euros. Entre os contestatários, conta-se a GP2, de Bernie Ecclestone, "patrão" da Fórmula 1, que terá substancialmente abatido um crédito de 3,2 milhões, acrescido de 206 mil euros em juros.
Os contornos do PER motivaram várias tentativas de impugnação desde que o processo foi iniciado, com alguns pequenos credores a argumentarem que não deveria ter sido concedido direito de voto aos créditos do BCP e da Bemposta por, supostamente, não serem objecto de qualquer perdão de dívida, violando o "princípio da igualdade". Uma ideia contestada pelos dois maiores credores, que alegam que o plano também os contempla com cortes, nomeadamente ao nível dos juros, assim como em relação às condições e garantias de pagamento.
O plano de recuperação da Parkalgar vai ainda implicar uma redução dos custos fixos com pessoal, no valor estimado de 350 mil euros anuais. Também a componente desportiva do AIA irá sofrer consequências, com muitos dos eventos motorizados internacionais a deixarem de integrar este circuito no seu calendário. Pelo menos se não houver apoios garantidos para a sua contratação, como se verificou nos primeiros anos de vida do projecto, em que foi financiado com verbas de entidades públicas, como o Turismo de Portugal, Turismo do Algarve, Instituto do Desporto de Portugal e Câmara Municipal de Portimão, para a realização de provas internacionais.
Com esta decisão judicial favorável, a Parkalgar entra numa nova fase do PER. Obter uma injecção de 10 milhões de euros, com os quais a empresa pretende recuperar a componente imobiliária do projecto, retomando a construção de 160 apartamentos (entretanto interrompida pela Bemposta, por falta de pagamento), assim como a construção de um hotel, com aproximadamente 200 quartos nas imediações do AIA.
Falhou o imobiliário
O problema é que, seis meses após a revisão legislativa que deu origem ao PER, ainda não avançaram os fundos de capital prometidos pelo Governo desde Junho, o que pode inviabilizar muitos projectos aprovados. Também ainda não está definido quem ficará a gerir este mecanismo de 220 milhões de euros.
A vertente imobiliária foi o calcanhar de Aquiles do projecto, segundo garantem os seus próprios gestores. No princípio de 2009, pouco depois da inauguração do AIA, a falência do grupo irlandês Harte Holdings, com quem a Parkalgar tinha assinado um contrato de compra e venda dos referidos apartamentos e do terreno do futuro hotel, deixou a empresa com a corda na garganta. Tinha falhado um encaixe de 41,4 milhões de euros (34,4 milhões, relativamente aos apartamentos e sete referentes ao hotel), fundamental para reduzir os juros do financiamento do projecto global.
Adiado, por falta de interessados, continuará o projecto do parque tecnológico também previsto para o local, que pretendia constituir-se como o embrião de um cluster automóvel nesta região algarvia, demasiado dependente do sector turístico.