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Morreu Joseph Murray, pioneiro no transplante de órgãos

Joseph Murray, o cirurgião responsável pelo primeiro transplante renal bem-sucedido, Nobel da Medicina, morreu nesta segunda-feira em Boston, depois de ter sofrido um ataque cardíaco. Tinha 93 anos.

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Murray com a mulher, em 1990, ano em que recebeu o Nobel da Medicina Reuters

“Havia sorrisos por todo o lado.” O doente, Richard Herrick, viveu mais oito anos com o rim do seu irmão. Murray ganhou o Prémio Nobel da Medicina em 1990 pelas suas conquistas na técnica de transplante de órgãos. O médico morreu nesta segunda-feira, aos 93 anos, em Boston, depois de ter tido um AVC na última quinta-feira.

O prémio que recebeu da academia sueca foi partilhado com E. Donnall Thomas, pelos avanços no transplante de medula óssea. Tradicionalmente, o galardão costuma ser atribuído a descobertas de ciência básica que podem ter aplicações médicas. Mas dessa vez o Nobel foi escolhido por razões clínicas.

“As descobertas de Murray e Thomas são cruciais para as dezenas de milhares de pessoas muito doentes, que podem ser curadas ou ganhar uma vida normal quando outros métodos de tratamento não têm sucesso”, lê-se no comunicado de então da academia.

O contacto de Joseph E. Murray com os transplantes começou dez anos antes, quando a II Guerra Mundial ainda não tinha terminado. “O meu interesse na biologia de tecidos e na transplantação de órgãos surgiu da minha experiência militar”, explica o médico numa outra autobiografia que se pode ler no site da academia sueca.

O médico trabalhou no Hospital Geral de Valley Forge, na Pensilvânia, durante três anos e esteve em contacto com muitos soldados com queimaduras. No hospital, serviam-se de pele de pessoas mortas que transplantavam para outros soldados. Apesar dos transplantes se degradarem por causa da incompatibilidade entre pessoas, durante oito ou dez dias a pele funcionava no novo corpo e a técnica cativou a imaginação do jovem cirurgião, que acreditou no seu potencial.

Mais tarde, trabalhou em Boston, como médico-cirurgião, no Hospital Brigham and Women. Foi aqui que fez o seu primeiro transplante de rim a Richard Herrick, que tinha uma doença crónica nos rins. O irmão gémeo ofereceu-se para doar um dos seus rins. A equipa médica confrontou-se com um problema ético inédito na altura. “Fomos criticados por fazermos de Deus”, disse, citado pelo jornal New York Times.

No hospital em Boston, a equipa começou por fazer transplantes de rins em cães. Na altura, a investigação em transplantes era considerada descabida e sem futuro, e um mentor chegou a aconselhá-lo a abandonar aquele trabalho. Mas na área de imunologia viviam-se tempos entusiasmantes, de descobertas. A equipa de Joseph Murray estava em permanente contacto com vários cientistas que desenvolviam trabalhos nesta área.

Durante muitos anos, suspeitou-se de que o falhanço dos transplantes estava intimamente ligado com o sistema imunitário, que reconhecia o órgão transplantado como estranho ao corpo e o atacava. Em 1962, depois de surgirem os primeiros imunossupressores, a equipa médica de Murray fez o primeiro transplante de rim com sucesso entre não familiares.

Dez vidas
Joseph Murray nasceu a 1 de Abril de 1919 em Milford, no Massachusetts. Filho de um juiz e de uma professora, descobriu muito novo que queria ser médico. Mais tarde, entrou na Escola Médica de Harvard, onde conheceu Bobby Link, uma estudante de Música e cantora, com quem iria casar-se em 1945.

Depois do sucesso de 1962, o médico continuou a aperfeiçoar as técnicas de transplantação que foram sendo adoptadas em todo o mundo. Anos mais tarde, concentrou-se na cirurgia plástica, uma área que considerava muito importante devido ao potencial para melhorar a qualidade de vida de pessoas que tinham ficado desfiguradas. Nas suas declarações, dizia que os médicos de hoje tinham a grande oportunidade de tratar doenças que anos antes não tinham cura.

Murray, um católico praticante, viveu com a sua mulher durante 65 anos, até à sua morte. Tiveram seis filhos. Na biografia que se lê no site do Nobel, o médico diz-se “abençoado” pela sua vida. O seu único desejo era ter a oportunidade de viver mais dez vidas, para poder investigar embriologia, genética, física, astronomia, geologia e ainda ser pianista, um eremita na natureza, jornalista da revista National Geographic ou jogador de ténis.

Na autobiografia, o destino para a décima vida, aquela em que voltaria a ter a mesma profissão: “A minha vida como cirurgião-cientista tem sido muito recompensadora. Nos pacientes, testemunhamos a natureza humana no medo mais cru, no desespero, na coragem, na compreensão, na esperança, na resignação, no heroísmo. Se estivermos alerta, podemos detectar novos problemas para resolver, novos caminhos para investigar.”
 
 
 
 

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