Rússia à moda de Itália ou a versão light do "tiki taka"
A Rússia não é o Barcelona, longe disso, mas tem pontos de contactos com a organização ofensiva dos catalães. No Europeu chegou a prometer imenso, depois de um grande jogo frente à Rep. Checa. Goleou e encantou à custa das suas combinações. Mas não manteve o mesmo ritmo com a Polónia e a hecatombe ocorreu frente à fortaleza da Grécia. Capelo (66 anos), que tinha deixado a selecção inglesa por não concordar com a retirada da braçadeira de capitão a Terry, sucedeu então ao holandês Dick Advocaat, que, por sua vez, já tinha substituído o seu compatriota Guus Hiddink. O actual poderio financeiro russo tem potenciado fenómenos como o do Zenit, mas também investimentos avultadíssimos na selecção - um fenómeno que deverá ter o expoente máximo com a organização do Mundial 2018. À custa disso, o italiano garantiu um vencimento de 10 milhões de euros por cada um dos dois anos de contrato.
As mudanças mais significativas começaram ainda fora do campo. Capello deixou claro ao presidente da federação, Nikolai Tolstykh, que não aceitaria interferências no seu trabalho, terminando com situações dúbias do passado. E impôs que os treinos passassem a ser de manhã e que os jogadores utilizassem sempre o uniforme oficial. Os jogadores passaram a sentir a sensação que já tinha sido vivida por Rooney na selecção inglesa: "A forma como ele olha para ti... Tu vês logo que é um homem duro - tem uma aura. Às vezes, passa por ti como se não estivesses lá e isso é muito intimidador. Não lhe fazemos perguntas pessoais nem ele a nós. Estamos ali para trabalhar. É simples: ou jogas bem, ou ficas no banco no encontro seguinte."
Capello não mudou o estilo e o sistema de jogo, mantendo-se o 4x3x3. Mas procurou dar-lhe mais segurança na posse e diminuir os níveis de ansiedade que, do ponto de vista defensivo, contribuíam para tornar a selecção desequilibrada nalgumas situações. De resto, quis manter a equipa sedutora e matreira, com envolvimento dos médios e mobilidade colectiva. Por norma, os laterais têm autorização para subir, enquanto os alas procuram terrenos interiores, principalmente Dzagoev, mas também Bystrov.
A Rússia, que não se apura desde 2002, começou por desiludir (1-1) num "particular" com a Costa do Marfim. Logo aí ficou claro que Capello ia continuar a privilegiar o bloco de jogadores do Zenit (sete convocados) e do CSKA. Num "11" formada por jogadores do campeonato russo, o outsider foi Kombarov, um defesa esquerdo que tomou o lugar de Zhirkov. Pelo caminho foram ficando jogadores como o guarda-redes Malafeev (Akinfeev é agora titular indiscutível), os médios Izmailov, Smirokov, Arshavin (que pagou as críticas aos adeptos) e os avançados Pavlyuchenko e Pogrebnyak. E foi aumentada a aposta em Kokorin, avançado de 22 anos do Dínamo de Moscovo.
No primeiro jogo oficial, no início de Setembro, efectuou uma primeira parte de qualidade frente à Irlanda do Norte. Desuniu-se no segundo tempo, mas venceu por 2-0. Esteve melhor quatro dias depois, em Telavive, onde goleou (0-4) Israel.
Uma das principais debilidades da Rússia continua a ser a falta de mobilidade e rapidez dos centrais. Ignashevich e Berezutski são contundentes no jogo aéreo, mas permeáveis quando levam com bolas nas suas costas. Anyukov continua a ser o lateral direito, mas já não tem a rapidez de outros tempos. À frente da defesa também se mantém Denisov, que no Zenit foi de castigo para as "reservas" por contestar Hulk e Witsel. É um jogador fino, mas pouco agressivo. Como médio interior esquerdo mantém-se o experiente Shirokov, que tem boa visão de jogo e técnica individual. No lado oposto tanto pode jogar Fayzulin como Glushako. Zyrianov tem sido suplente. No ataque, entre o talento do jovem Dzagoev e o repentismo de Bystrov (que não esteve no Euro), surge Kerzhakov, que frente a Israel apontou dois golos e interrompeu o "jejum" que já durava há quase dois anos. Movimenta-se com inteligência e trata bem a bola. Mas continua a faltar um pouco de pimenta e de "punch" ao ataque russo.