FMI reconhece que calculou mal o impacto da austeridade na economia

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O FMI, liderado por Christine Lagarde, reviu em baixa a previsão de crescimento mundial Foto: Jason Reed/AFP

Ao fim de mais de dois anos de austeridade na Europa, com várias previsões de crescimento revistas em baixa, o Fundo Monetário Internacional (FMI) apresentou mais um mea culpa, algo que já se começa a tornar hábito na instituição.

No relatório semestral sobre o estado da economia mundial tornado público ontem à noite, o FMI reconhece que as medidas de contenção orçamental aplicadas em vários países em todo o Globo estão a ter, nos últimos anos, um impacto negativo na economia muito maior do que aquilo que os modelos que estão a ser utilizados previam. Entre as vítimas destes erros de cálculo estão os países que, na Europa, têm vindo, ainda sem sucesso, a apostar em políticas de forte austeridade para resolver os seus problemas orçamentais, como a Grécia e Portugal.

Numa caixa intitulada "Estaremos a subestimar os multiplicadores orçamentais de curto prazo?", os responsáveis do Fundo tentam perceber porque é que as suas previsões (e também as de outras instituições) para a evolução das economias têm vindo a falhar durante esta crise.

E a conclusão a que chegam é impressionante. Enquanto que nos modelos de projecção usados, se estimava que, por cada euro de cortes de despesa pública ou de agravamento de impostos se perdia 0,5 euros no PIB, a realidade mostrava que esse impacto (os chamados multiplicadores) é muito maior. Afinal, desde que começou a Grande Recessão, em 2008, o que os dados económicos mostram é que por cada euro de austeridade, o PIB está a perder um valor que se situa no intervalo entre 0,9 e 1,7 euros.

"Esta descoberta é consistente com investigação que sugere que, no actual ambiente de fraca utilização da capacidade produtiva, de política monetária limitada pelas taxas de juro zero e de ajustamento da política orçamental simultâneo em vários países, os multiplicadores podem estar bem acima de um", escreve-se no relatório do FMI. A conclusão: "Mais trabalho sobre como os multiplicadores orçamentais dependem do tempo e das condições económicas é necessário".

Um erro tão significativo no cálculo do impacto económico das medidas de austeridade teve consequências evidentes nas políticas seguidas em vários países, incluindo necessariamente aqueles que têm vindo a receber apoio financeiro e técnico do FMI como Portugal. Aliás, o próprio Governo português já revelou ter sido surpreendido pela forma como evoluiram, durante este ano, variáveis económicas como o desemprego e a procura interna, o que acabou por ter consequência também ao nível do défice orçamental.

Revisões em toda a linha

Ontem, no reltório onde assumiu estes erros de cálculo, o FMI viu-se forçado a rever em baixa muitas das previsões económicas que tinha feito há seis meses para a economia mundial em 2013.

Enquanto, em Abril, nas últimas Perspectivas Económicas Mundiais, projectava uma expansão de 4% do PIB mundial, o FMI aponta, agora, para um crescimento de 3,6%.

A contribuir para a revisão em baixa está o clima de incerteza da crise da moeda única e o frágil desempenho económico dos EUA, onde o ritmo de criação de emprego está a abrandar.

As economias desenvolvidas deverão crescer 1,5% (contra 2% previstos em Abril). E para as economias emergentes é previsto um crescimento de 5,6% (contra a previsão anterior de 6%).

Na moeda única, o desempenho será também mais negativo do que o FMI esperava há seis meses: em vez de um crescimento de 0,9%, a instituição liderada por Christine Lagarde aponta para uma progressão de 0,2%. A principal revisão é feita nos países periféricos, aqueles onde mais medidas de austeridade foram aplicadas.

Mesmo com a melhoria recente do comportamento nos mercados financeiros, o FMI adverte que a economia mundial enfrenta riscos. O pressuposto em que assentam os números do FMI denota isso mesmo: parte do princípio de que as medidas de combate à crise na zona euro são suficientes e que nos EUA será evitado um "precipício orçamental".

Para Portugal, o FMI prevê uma recessão de 1% do PIB em 2013, em linha com a projecção do Governo. No caso do desemprego, a previsão coincide com aquela que o Executivo confirmou em Setembro quando divulgou o resultado do quinto exame da troika (uma taxa de 16%), mas que o Governo reviu entretanto em alta para 16,4%.

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