Ser músico rock e homem de negócios não combina. Bono, que é as duas coisas, sabe-o bem, afirmando que os U2 se sentiam culpados quando começaram a ganhar dinheiro nos anos 1980. A ética punk a isso os impelia. Um músico rock mesmo quando detém um império financeiro coíbe-se de o exibir.
Nas últimas duas décadas, com a ascensão da cultura hip-hop e do R&B nos Estados Unidos, algo mudou e rappers como Jay-Z, Puff Daddy, Snoop Dogg, Kanye West e Eminem ou cantoras como Beyoncé, Rihanna ou Jennifer Lopez não só criaram verdadeiros impérios como não têm pudor de os exibir.
"No hip-hop os preconceitos contra o comércio não se aplicam", justificava há dois anos Bono, tentando explicar as diferenças entre a cultura rock e hip-hop. "É sexy que Jay-Z ou Beyoncé tenham a sua linha de roupa. As pessoas gostam disso. Querem ver um espírito empresarial." Ou seja, no rock ou no R&B todos querem ganhar dinheiro. A diferença é que no R&B os interesses materialistas são exibidos com frontalidade.
Em Maio a revista Forbes publicou a lista das 100 personalidades mais influentes do planeta no campo do entretenimento e a liderá-la lá estava o nome de Jennifer Lopez, para surpresa de muita gente, já que o pico de popularidade da cantora e actriz parecia ter sido atingido na alvorada dos anos 2000. Mas a sua presença nos últimos tempos no júri do programa de talentos da televisão, American Idol, parece ter ajudado a reacender a sua popularidade. A Forbes chama-lhe mesmo uma "reencarnação assombrosa da carreira."
Para figurar na lista não basta cantar, dançar ou actuar bem. É preciso ter uma presença massiva e regular nos meios de comunicação clássicos e nas redes sociais e, acima de tudo, gerar receitas. Muitas, muitas, receitas.
No caso de Jennifer Lopez falamos de 52 milhões de dólares (40 milhões de euros) gerados pelo facto de ser a imagem de marcas como a L'Oreal ou da Gillette, pelas vendas da sua linha de roupa e fragrâncias e pelo facto de até há pouco tempo ser júri do concurso televisivo American Idol - ao que parece, embolsava 20 milhões de dólares anuais no programa.
Os 12 milhões de fãs no Facebook, os 6,6 milhões de seguidores no Twitter, a participação como actriz em alguns filmes, as muitas capas de revista e as receitas geradas na publicidade a cosméticos ou carros fizeram o resto. A também cantora Lady GaGa, que anteriormente liderava a lista, caiu para a 5.ª posição, atrás de Oprah Winfrey, Justin Bieber e Rihanna.
Comprovando a sua influência em todo o mundo, e em especial junto da vasta comunidade latina, surgiu recentemente ao lado da cantora Beyoncé ou da actriz Eva Longoria, em apoio a Barack Obama, no contexto da campanha eleitoral para a presidência dos Estados Unidos. "As mulheres ajudarão a decidir estas eleições", afirmou. "Cresci com uma forte e trabalhadora mãe, e duas irmãs fantásticas. Aprendi desde muito nova que as mulheres quando se juntam são insuperáveis."
No meio disto, existe a música. Para Jennifer Lopez este é o momento de redefinir o seu percurso como cantora. O concerto de hoje marca o início da digressão europeia. Também por isso, resolveu vir uns dias mais cedo para a capital portuguesa, preparando o concerto inaugural. Ontem, 1500 fãs puderam assistir ao ensaio geral da Dance Again World Tour, certamente para constatar que o mesmo incide sobre a antologia de sucessos que acaba de lançar - Dance Again... The Hits.
A compilação inclui sucessos como Love don"t cost a thing, Waiting for tonight, If you had my love ou On the floor e dois temas originais novos - Dance again, com a participação de Pitbull, e Goin"it com Flo Rida. O concerto vai ser filmado em 3D e será incluído no documentário sobre a digressão da cantora. Será a segunda vez que vem a Portugal, depois de ter cantado na apresentação da cerimónia do evento Sete Maravilhas do Mundo, em 2007.
A ideia do documentário é criar um retrato da vida pessoal e profissional de Lopez, que se divorciou o ano passado do também cantor Marc Anthony.
Aos 43 anos, impôs-se como cantora, actriz, mulher de negócios, ícone da moda e inimiga de quem acha que para se ser símbolo sexual tem que se ser muito magra. Hoje mantém uma relação com o coreógrafo Casper Smart, 18 anos mais novo do que ela, e é presença constante nos meios de comunicação. Esta semana o alarido deveu-se à publicação das primeiras imagens do seu novo filme (chama-se Parker e vai estrear em Janeiro de 2013), onde surge numa pose sensual de fato de banho ou a beijar apaixonadamente o actor Jason Statham.
Ao longo dos anos, ela nunca renegou o sucesso. Pelo contrário, diz-se abençoada por ele. Embora, como acontece com todas as celebridades de dimensão global, saiba que existe um preço a pagar. No seu caso, a separação pouco nítida entre a exposição pública e a vida privada é uma constante. Mas ela pertence à elite que vive bem com isso. Joga mesmo com isso. Faz parte do seu estatuto, que alimenta com valores de espectáculo que podem não ser sempre criativos, mas são poderosos. E o poder, já se sabe, atrai.