Bernardo já não volta

A Venezuela não era um lugar estranho. Bernardo Nóbrega nasceu na Madeira, de onde vêm muitos dos velhos portugueses residentes. Tem cá uma tia e duas primas. Voluntariara-se para trazer um projecto do Grupo Lena. No início de Setembro, cá estava, pronto para tudo.

O Grupo Lena está a construir 12.512 fogos. É uma das oito empresas estrangeiras que executam projectos coordenados pela PDVSA Ingeniería y Construcción. Mais do que Portugal, só a China (24.230), o Irão (17.008) e a Bielorrússia (12.968). Depois Rússia (6342), Espanha (3264), Turquia (1488) e Brasil (686). Vir era "um desafio". Que oportunidade há hoje em Portugal de participar no nascimento de uma "pequena cidade"? Iriam construir duas. As 78 mil casas são menos de um quarto do plano do Presidente Hugo Chávez.

Bernardo instalou-se numa boa zona da cidade. Tentou fazer a "vida normal" de um solteiro, de 34 anos, a trabalhar uma temporada no estrangeiro: sair, jantar fora, ir a um bar ou a uma discoteca. E foi num restaurante, em Las Mercedes, a zona de movida, que conheceu Maria José, venezuelana, quatro anos mais nova.

Já só está a fazer acompanhamento de obra. Não voltará para Lisboa. Em Telheiras, tinha emprego, apartamento, carro. Aqui, tem a sua namorada, o seu filho, o futuro que quer construir. Não está assustado. Trabalharão juntos. Ela tem uma empresa. Nem quer ouvir falar em viver em Portugal. "O que ia fazer? Estou habituada a trabalhar. Aqui, tenho trabalho, não tenho chefe", diz.

Bernardo lê jornais, vê televisão, anda na rua. "As pessoas não andam descontraídas, a falar ao telemóvel ou a ver as montras. Há sítios onde é impossível ir de noite." Vai tomando as suas precauções. Há a possibilidade de se mudarem para Valência, terra natal de Maria José, onde a tensão será menor.

Texto corrigido às 6h45 de 5/10/2012:

no último parágrafo, substituído Valença por Valência

As reportagens na Venezuela são financiadas no âmbito do projecto Público Mais
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