A Mona Lisa de Isleworth é a primeira versão de Leonardo da Vinci ou mais uma cópia?

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A apresentação da Mona Lisa de Isleworth foi cuidadosamente encenada Foto: Fabrice Coffrini/AFP

Esteve 40 anos guardada num cofre suíço e foi ontem mostrada a mais de uma centena de jornalistas em Genebra, numa conferência que, a avaliar pelas fotografias das agências de notícias, foi cuidadosamente encenada. O debate à volta da autoria da Mona Lisa de Isleworth conhece agora mais um episódio que promete dividir as águas na comunidade de especialistas na obra de Leonardo da Vinci (1452-1519). Estamos perante uma cópia de finais do século XVI, como muitos têm defendido até aqui, ou esta é mesmo a primeira versão do célebre retrato do mestre do Renascimento, como garantem agora os seus proprietários e Fundação Mona Lisa?

A investigação em que a fundação com base em Zurique se apoia para defender que esta versão foi feita, muito provavelmente, dez anos antes da que hoje atrai milhões de visitantes ao Museu do Louvre, em Paris, ainda está em curso e envolve historiadores de arte italianos, professores da Universidade da Califórnia e até técnicos da CIA.

"Até agora, nenhum teste científico foi capaz de provar que esta não é uma pintura de Leonardo", disse aos jornalistas Stanley Feldman, historiador de arte e membro desta fundação que há 35 anos estuda a obra, conhecida como Mona Lisa de Isleworth por referência à zona de Londres onde vivia o crítico de arte Hugh Blaker. Em 1914, Blaker comprou-a a uma família aristocrática arruinada, que o conservava na sua colecção há mais de 100 anos. "Ao fazermos testes matemáticos simples descobrimos que todos os elementos dos dois corpos estão exactamente no mesmo sítio. Para o fazer de uma forma tão rigorosa, tão meticulosamente exacta, só se a pessoa que fez uma, fez a outra... Isto é em si mesma uma revelação extraordinária e penso que é válida", acrescentou Feldman, aqui citado pela Associated Press (AP).

Apesar das semelhanças, há diferenças óbvias entre as duas versões. A de Isleworth é ligeiramente maior, as cores são mais claras e o suporte é de tela e não de madeira, como na do Louvre. A postura e posição da figura são muito semelhantes, embora na de Blaker, mais tarde comprada por um homem que passou o resto da vida a estudá-la, o coleccionador Henry Pulitzer, a modelo surja ladeada por colunas clássicas, tendo por trás uma paisagem bem mais simples do que a do retrato que Leonardo terá executado entre 1505 e 1519.

Martin Kemp, professor emérito da Universidade de Oxford e um reconhecido especialista na obra do pintor, está entre os que refutam a teoria de Feldman, principal autor do livro que a fundação lançou ontem, Mona Lisa, Leonardo"s Earlier Version. Kemp garantiu à AFP que as reflectografias de infravermelhos, as que permitem olhar para o desenho que a camada de tinta esconde, mostram que a versão suíça "não tem todas as características das pinturas identificadas de Leonardo". À AP, o professor de Oxford questionou as bases da nova teoria, explicando que as análises científicas por si só também não podem negar categoricamente que não se trata de um Leonardo. "À Mona Lisa de Isleworth faltam-lhe detalhes subtis do original", garantiu Kemp. "O véu da modelo, o cabelo, a camada translúcida sobre o vestido, a estrutura das mãos..." Para o especialista, a cabeça, tal como noutras cópias, "não capta a sensação profundamente ilusória do original".

Antecipando as críticas, Feldman evocara duas fontes históricas do século XVI - Giorgio Vasari e Giovanni Lomazzo - para defender que já na época eram conhecidas duas versões. Kemp prefere falar de cópias, uma vez que o retrato foi muitíssimo reproduzido.

Notícia corrigida às 16h23. Substituído o segundo parágrafo do texto.

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