Vila D"Este não é um luxo, mas já não é um lixo

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Quem chega ao Porto através da A1 quase fica incrédulo. Em vez de prédios que faziam lembrar zonas habitacionais degradadas de outras décadas em cidades como Lisboa, por exemplo, vê agora um conjunto habitacional cuja mudança não se limita ao facto de ter sido pintado. Há pequenas alterações que lhe conferem uma aparência mais moderna e sofisticada FOTOS: NFACTOS/FERNANDO VELUDO

A reabilitação não trouxe apenas prédios mais bonitos, a população também está a receber formação para melhorar as suas competências de cidadania e na procura de emprego

Durante muitos anos, quem chegava ao Porto, pela A1, via aquele conjunto de prédios enegrecidos que pareciam caixotes habitacionais. Se mais não houvesse, bastava o aspecto destas habitações para tirar qualquer brilho à urbanização de Vila D"Este, em Gaia. Mas agora tudo mudou, os prédios mais visíveis a partir da A1 foram reabilitados e estão mais bonitos do que nunca. Se alguém precisar de uma prova que, muitas vezes, vale mais reabilitar do que demolir, ela pode muito bem estar aqui. "Isto veio dar um outro ânimo à população, nota-se que há uma nova auto-estima", garante Manuel Monteiro, presidente da Junta de Freguesia de Vilar de Andorinho.

A pintura dos edifícios é o mais evidente. Mas aplicaram-se outros melhoramentos, como a impermeabilização dos prédios, eliminação de fissuras e instalação de sistemas de combate a incêndios. Curioso é verificar a colocação de estruturas horizontais metálicas, semelhantes a estendais, mas que não têm essa função. Estas "palas" são colocadas nos prédios mais expostos aos elementos. Dão uma aparência mais moderna e sofisticada aos edifícios, mas a sua verdadeira utilidade passa por garantirem um melhor isolamento térmico e acústico às habitações.

A primeira fase da reabilitação de Vila D"Este ficou concluída em Maio último e implicou o dispêndio global de 10 milhões de euros. A obra de regeneração e requalificação do edificado incluiu os blocos 9, 10, 14, 15, 16 e 17 e a intervenção no espaço público as pracetas de João de Oliveira Marques, das Violetas, do Padre Floro e de José Pinto Correia, com criação de passagens entre edifícios, reorganização da circulação viária, reperfilamento de passeios e abertura de novas áreas verdes e ajardinadas.

Diz Manuel Monteiro que nesta reabilitação "também interessa o interior". Mas o autarca não se refere ao interior dos andares. Fala antes de programas de formação, integrados no programa da 1.ª fase, que estão a ajudar a população a melhorar a sua educação e cidadania e a ganhar mais competências para conseguir emprego.

A segunda fase da reabilitação deverá arrancar no próximo mês de Outubro. De um segundo investimento total de 10 milhões de euros, 340 mil serão, tal como na 1.ª fase, destinados aos moradores: a acções de Inclusão Social e Valorização Socioeconómica e Profissional. No edificado serão reabilitados mais 12 blocos, que contêm 1319 habitações e 45 lojas. Do total destes novos 10 milhões, 80% serão pagos por fundos comunitários e os restantes 20% pela Câmara de Gaia.

Alguns poderão perguntar por que é que se conseguiu dinheiro da União Europeia para reabilitar o exterior de edifícios de uma urbanização que soma 2085 habitações, 109 edifícios, 18 blocos e 76 espaços comerciais e é detida, na sua grande maioria, por privados. O Estado tem aqui responsabilidades, pelo menos a dois níveis. Desde logo, a urbanização foi construída entre 1984 e 1986, através de um programa do Fundo de Fomento de Habitação. Mas, segundo recorda António Moreira, presidente da AP-Associação dos Proprietários da Urbanização Vila D"Este, os donos dos andares ficaram desde logo prejudicados pela falência do construtor, o que levou a que ficassem prédios por acabar.

A segunda responsabilidade advém do facto de a Câmara de Gaia ter comprado vários apartamentos onde alojou pessoas sem hábitos de convivência em prédios. Nesta altura, a autarquia dispõe de 164 fogos na urbanização. "Viviam em casas abarracadas, em ilhas", na expressão de Manuel Monteiro, ou, como caracterizou António Moreira, "pessoas sem consciência de cidadania ou higiene, o que desvalorizou o património". "O município quis despachar pessoas que viviam em barracas e nunca houve acompanhamento", acrescentou ainda o líder da AP. Mas, como tem havido as referidas formações, António Moreira reconhece que "as coisas estão melhores".

Num documento da empresa municipal Gaiurb, pode ler-se que Vila D"Este "representa um enorme erro de planeamento urbanístico do Estado". A Gaiurb vangloria-se de que, após a intervenção da Câmara de Gaia, a urbanização "é assumida como um dos bons exemplos de planeamento no país". Recordando o passado, a Gaiurb refere ainda que "o edificado envelheceu e degradou-se, não beneficiou de medidas de manutenção nem de obras de reabilitação física. As pessoas cresceram sem infra-estruturas e sem instituições sociais".

Nas contas de António Moreira, a urbanização tem 17 mil habitantes, o que supera cerca de 80 cidades portuguesas. O dirigente conta ainda 4 mil pessoas em idade activa e, entre estas, cerca de 1800 desempregados. Mesmo antes dos 20 milhões das duas fases de reabilitação, a Câmara de Gaia contabilizava já um investimento de outros 20 milhões. Aplicados na construção de um pavilhão municipal, um polidesportivo, piscinas e uma EB1 (em Vila D"Este, há também uma EB 2,3). A população anseia ainda por uma esquadra e por um centro de saúde. Reivindicações subscritas por António Moreira, que ainda pede "mais creches e jardins-de-infância".

Os habitantes da urbanização começaram também a acreditar que, um dia, o metro há-de chegar. A distância até ao termo da linha amarela, em Santo Ovídio, é curta e, para além de servir a grande população de Vila D"Este, o metro também transportará quem se dirige ao Hospital de Santos Silva, ali bem perto. Porém, a continuação da linha amarela até Vila D"Este está em risco, devido à crise do país. Inclusive, o presidente da Câmara de Gaia, Luís Filipe Meneses, já propôs uma alternativa: construir um corredor rodoviário dedicado, entre Santo Ovídio e Vila D"Este, onde circulariam autocarros eléctricos. Só que o presidente da AP continua a preferir o metro e a prometer que vai continuar a lutar por ele.

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