Governo recupera fórmula de José Sócrates no RSI
Habitação social, afinal, vai contar no máximo 46,36 euros na hora de apurar rendimento de beneficiários do RSI
O Governo voltou atrás numa alteração ao rendimento social de inserção (RSI) que afectaria milhares de famílias residentes em habitação social: morar numa casa camarária, afinal, não se considerará um rendimento que se calculará fazendo a diferença entre a renda técnica (o preço real da habitação) e a renda apoiada (o valor pago).
O despacho do Ministério da Solidariedade e da Segurança Social, ontem publicado no Diário da República, recupera a fórmula que foi introduzida na lei aprovada a 16 de Junho de 2010, durante o Governo de José Sócrates. O apoio público em matéria de habitação social corresponde ao valor máximo do subsídio de renda previsto: 46,36 euros.
No caso do RSI, o valor é apurado "de forma escalonada" consoante o ano de atribuição da prestação: um terço no 1.º ano; dois no 2.º ano; três a partir do 3.º ano. Contas feitas, conta-se 15,45 euros a quem recebe há menos de um ano; 30,91 euros há dois; e 46,36 há mais de três.
O alerta fora lançado pelo presidente da Câmara de Matosinhos, Guilherme Pinto. A lei, em vigor desde o dia 1 de Julho, parecia-lhe "intolerável". O artigo 15 encara como rendimento qualquer subsídio de residência, subsídio de renda de casa ou apoio público "no âmbito da habitação social, com carácter de regularidade, incluindo os relativos à renda social e à renda apoiada". Se uma família residisse em habitação social, ter-se-ia de calcular "a diferença entre o valor do preço técnico e o valor da renda apoiada".
O autarca pegou em exemplos práticos, como este: um indivíduo, desempregado, sozinho, recebe no máximo 189,52 euros de RSI. Um senhor, que vive com esse dinheiro, paga 5,92 euros de renda à câmara. Como o apartamento tem um preço técnico de 176,58 euros, passaria a receber 17,94 euros de RSI assim que o Instituto de Segurança Social revisse o seu processo e percebesse que existe uma comparticipação da autarquia de 170,66 euros.
Quando o assunto saltou para a praça pública, peritos em pobreza levaram as mãos à cabeça. Sérgio Aires, director do Observatório de Luta Contra a Pobreza na Cidade de Lisboa, por exemplo, nem queria acreditar no decreto-lei: "As pessoas não vão ao supermercado com esses valores". "Já se multiplicam puxadas de água e luz, agora vão deixar de pagar a renda", previa Eduardo Vítor Rodrigues, da Universidade o Porto. O secretário de Estado da Segurança Social, Marco António Costa, sossegou-os: não haveria razão para alarme, fariam um despacho.
Além de repor aquele cálculo, o despacho esclarece alterações de facto ao regime anterior. Os técnicos que estavam apreensivos por ouvirem o ministro Pedro Mota Soares dizer que só receberá a prestação quem tiver assinado o contrato de inserção podem, agora, respirar de alívio. O diploma estabelece que "a prestação de RSI é atribuída a partir do dia seguinte ao da celebração do contrato de inserção". Prevê, no entanto, que não se espere, se, no prazo de 60 dias, não for celebrado acordo, "por facto não imputável ao requerente".
O regulamento alonga a lista de documentos obrigatórios. Agora é preciso, por exemplo, entregar fotocópia de documento comprovativo de residência legal em território nacional. Mesmo quem não tem tecto tem de ir à junta de freguesia pedir a prova: para receber, já não terá de pedir emprestada a morada de alguém, poderá, simplesmente, indicar "uma das entidades próximas da zona em que habitualmente se encontra e com a qual se relacione".