Passos avisa que a fusão das polícias é para avançar de forma gradual
Objectivo do Governo é ter, a médio prazo, a segurança interna baseada numa polícia militar (GNR) e outra civil, aglutinando PSP, SEF e PJ. Sindicatos preferem esperar pela definição de um modelo para reagir
O Governo até pode não andar a falar a uma só voz sobre o assunto, mas para o primeiro-ministro, agora, não há dúvidas. Ter apenas duas polícias, uma militar, outra civil, resultando esta última da fusão entre a PSP, PJ e SEF, é um objectivo a médio prazo. A incógnita é saber se isso poderá ser feito ainda nesta legislatura.
Pedro Passos Coelho afirmou ontem que o Governo "preconiza uma clarificação do sistema policial português através da evolução, programada e gradual", do actual modelo para um "modelo dual puro". Ou seja, para um cenário em que, além da polícia militar (GNR), haveria uma Polícia Nacional, de cariz civil, cujo processo de criação seria naturalmente progressivo, integrando primeiro a PSP e o SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras), e, numa segunda fase, também a Polícia Judiciária.
O cenário actual, com uma "multiplicidade de intervenientes, conjugada com uma manifesta confusão conceptual do modelo existente, conduziram a concorrências e a conflitos indesejáveis", afirmou ontem Passos Coelho perante a direcção da PSP, no final de uma visita à Unidade Especial de Polícia (UEP). O resultado é "um sistema por vezes dispendioso, mal dimensionado e menos racional".
E esse é um cenário que o país não pode comportar - o chefe do Governo argumentou várias vezes com o factor "redução de custos" para justificar a necessidade de explorar complementaridades e sinergias. Mas não só: essa aglutinação numa Polícia Nacional, à semelhança de outros países europeus, permitiria a "eliminação da conflitualidade, conjugada com uma clara distinção na distribuição de competências e alicerçada em princípios doutrinários e em exemplos testados noutros países". Passos só não disse quais.
A intenção contraria as declarações da ministra da Justiça, feitas em Março, no Congresso de Investigação Criminal: "Recuso, por completo, a possibilidade de uma polícia única em Portugal, criada a partir ou com a Polícia Judiciária", disse Paula Teixeira da Cruz, acrescentando: a PJ "nasceu independente e independente continuará". O parceiro de coligação, o CDS, não será adepto da ideia de fundir as polícias e o programa de Governo falava em medidas com vista a "uma maior articulação", embora confirmasse a opção pela "existência de um sistema dual, assente numa vertente civil e numa vertente militarizada". Também o ministro Miguel Macedo terá deixado aos sindicatos a indicação de que não há condições financeiras nem estruturais para o processo de fusão. Porém, o PÚBLICO sabe que a revisão das leis orgânicas, no Outono, preparará o terreno para o processo.
A ideia da aglutinação da PSP, SEF e PJ divide os sindicatos. O SPP (Sindicato dos Profissionais de Polícia), um dos mais expressivos na PSP, defende a fusão desta força com a GNR e, numa fase posterior, com a PJ. O presidente, António Ramos, cita um estudo do Observatório de Segurança que fala numa poupança de 100 milhões de euros por ano, e lamenta a "falta de vontade política para tomar estas decisões". Acácio Pereira, do SCIF (Sindicato da Carreira de Investigação e Fiscalização) do SEF, é mais crítico: "Esta é mais uma atoarda a que [o primeiro-ministro] já nos habituou", reiterando que o sindicato "defende a especialização", o que implica a autonomia do SEF.
Por seu lado, a Associação Sindical dos Profissionais da Polícia da PSP (ASPP-PSP) preferia que o Governo falasse a uma só voz. "Já ouvimos um pouco de tudo e, por isso, pedimos ao Governo que clarifique o que pretende de facto alterar para depois nos pronunciarmos", afirmou ao PÚBLICO o presidente. "Ou o Governo não está em sintonia e isso é um problema grave, ou há um modelo que se está a preparar e ninguém quer falar sobre ele", diz Paulo Rodrigues.
Carlos Garcia, presidente da Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal da Polícia Judiciária (ASFIC-PJ), é contra tal cenário, mas recusou comentar o assunto "sem ter mais pormenores".