Passada a polémica, vamos poder ler Kapuscinski: A Life em inglês

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Em 2010, a biografia de Artur Domoslawski lançou uma sombra sobre as reportagens (ficções?) do polaco Ryszard Kapuscinski, umas das maiores referências do jornalismo contemporâneo

Em 2010, quando foi publicado na Polónia, o livro apaixonou (para o bem e para o mal) críticos e comentadores dentro e fora do país. Os próprios admitiram na altura que falavam sem conhecimento profundo de causa, porque a biografia de Kapuscinski, escrita por Artur Domoslawski, amigo e discípulo do escritor e jornalista polaco Ryszard Kapuscinski (1932-2007), apenas existia em polaco. Esperavam pela tradução numa língua mais universal. E ela chega agora, pela VersoBooks, sob o título Ryszard Kapuscinski: A life, com tradução de Antonia Lloyd-Jones.

Na altura, a viúva de Kapuscinski tentou impedir a publicação, mas o livro saiu na Polónia por decisão de um tribunal. Dizia preto no branco o que já se ouvia como ruído de fundo. Na versão mais crua: que o jornalista, aclamado na Polónia como o melhor repórter do mundo e autor de oito livros traduzidos, inventava as suas reportagens. Na versão mais suave: que Kapuscinski "criara criteriosamente o seu próprio estatuto de lenda" e "estendera as fronteiras da reportagem ao reino da literatura", sacrificando os factos ao efeito. A melhor forma de servir a verdade, levando-a da maneira mais memorável possível às pessoas, para uns; uma prática comprometedora da procura incessante da verdade e da própria essência do jornalismo, para outros.

Os críticos apontaram os badalados encontros de Kapuscinski com Che Guevara ou Patrice Lumumba como nunca tendo acontecido. Os admiradores disseram que não era mentiroso, mas sim um bom contador de histórias. E que nas suas reportagens pelos vários continentes (sobretudo em África e mais tarde na América Latina), nos seus relatos da queda do Xá da Pérsia e de Hailé Selassié na Etiópia (que retratou num dos seus livros, O Imperador), simplesmente aplicava a ideia de esbater as fronteiras entre realidade e ficção que Tom Wolfe instituiu com o New Journalism.

Quem lê a biografia, escreve agora a Economist, sente empatia pela figura, mas ao mesmo tempo uma irremediável consciência das suas falhas. Depois dela, olharemos da mesma forma para os livros de Kapuscinski?

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