Com os novos tablets a Microsoft aproxima-se da estratégia da Apple
Na noite de segunda para terça-feira (hora de Lisboa), o CEO, Steve Ballmer, apresentou o Microsoft Surface, um tablet de marca própria, em que hardware e software são da responsabilidade da empresa – uma abordagem próxima do que faz a Apple e longe da forma de operar típica da Microsoft.
“Acreditamos que qualquer intersecção entre humanos e máquinas pode ser melhorada quando o hardware e o software são considerados em conjunto”, afirmou Steve Ballmer – é o género de afirmação que era muito comum ouvir-se do ex-CEO da Apple, Steve Jobs. Ballmer, contudo, teve o cuidado de dirigir uma palavra aos fabricantes parceiros, que estiveram completamente ausentes do evento.
Francisco Jerónimo, analista da IDC em Londres, nota ao PÚBLICO que o aparelho “podia ter sido anunciado com qualquer um dos parceiros, ou com vários” – o que já aconteceu noutras ocasiões, nomeadamente com os smartphones Windows Phone e com computadores. Porém, explica, “a Microsoft está a reposicionar a abordagem numa estratégia mais fechada”, acrescentando que, “sendo esse o caso, terá de comprar um fabricante que conheça e controle toda a cadeia”.
“Esta linha de produtos marca um ponto crucial na estratégia de produto da Microsoft”, observa por seu lado a analista da Forrester Sarah Rotman Epps, numa nota publicada online. “Mistura o modelo de hardware próprio da [consola] Xbox com o modelo de ecossistema do Windows. Coloca o enfoque no consumidor e não na empresa. E deixa a Microsoft a competir com a integração vertical da Apple”.
Também seguindo o caminho da Apple, a Microsoft terá uma loja de aplicações para o Windows 8. As aplicações que usem a nova interface do sistema (chamada Metro e semelhante à dos telemóveis) terão de ser obtidas a partir desta loja. A Windows Store vai vender aplicações para computadores e tablets, havendo uma loja separada para telemóveis.
O Surface também vem introduzir uma nova variável na relação da Microsoft com os parceiros – marcas como a Samsung e a Asus, que pagam à Microsoft licenças para usar o Windows nos seus computadores e que também têm em vista o lançamento de tablets com o novo Windows 8. “Há definitivamente um risco para a Microsoft ao competir cada vez mais com os seus clientes”, observou à agência Reuters Michael Silver, analista da Gartner.
O modelo profissional do Surface, aliás, só será posto à venda três meses depois do lançamento da outra versão do aparelho, no que já foi interpretado como uma janela para dar espaço aos fabricantes parceiros.
Aposta duplaO Microsoft Surface surge em dois modelos para segmentos diferentes. Um dos modelos é mais leve e fino e está equipado com os processadores ARM que são usados em equipamentos móveis. Foi concebido para concorrer directamente com o iPad e com os tablets Android.
O outro – com um ecrã de melhor qualidade, processador Intel (usado em computadores), mais espaço de armazenamento e com o Windows 8 Pro – destina-se a concorrer com os chamados ultrabooks, computadores portáteis de peso e dimensões reduzidas.
As especificações técnicas dos dois modelos Surface ainda não são inteiramente conhecidas. Por exemplo, a velocidade dos processadores, a memória RAM e as características das câmaras não foram reveladas. Em relação ao iPad, o ecrã, com 10,6 polegadas, é ligeiramente maior, mas apresenta uma resolução inferior ao apregoado ecrã "retina" da Apple, com 264 pixeis por polegada. Os aparelhos da Microsoft têm 139 e 208 pixeis por polegada.
Os preços não foram anunciados, mas, de acordo com a empresa, o primeiro modelo vai competir no patamar de preços dos tablets e o segundo vai alinhar pelo preço dos ultrabooks – um indicador de que os valores poderão oscilar entre os 500 e os 1000 euros. Inicialmente, o Surface estará à venda apenas nos EUA e apenas nas lojas Microsoft e numa loja online.
“A Microsoft está a tentar diferenciar-se do iPad e dos tablets Android ao tentar combinar o melhor dos ultrabooks com o melhor dos tablets”, avalia Francisco Jerónimo.
Ambos os modelos do Surface podem ser ligados a uma capa protectora que se desdobra e funciona como teclado físico e têm um suporte integrado que os coloca na posição de um portátil. Os dois permitem o uso de versões do Office, o conhecido pacote de aplicações da Microsoft que integra o Word e o Excel, que não existem para iPad nem para Android.
“O teclado é uma óptima ideia, uma vez que essa é umas das principais falhas dos tablets quando o objectivo é a criação de conteúdo”, observa Jerónimo (algumas marcas, como a Asus, já têm equipamentos deste género aos quais é possível acoplar teclados físicos). “Não nos podemos esquecer que o teclado virtual ocupa metade do ecrã do iPad, o que lhe tira muita usabilidade. Por outro lado, Office vai ser crucial para atrair o segmento profissional”.
Sarah Rotman Epps, da Forrester, antecipa, contudo, um problema com esta aposta dupla da Microsoft. “Vender tablets com x86 [a arquitectura dos processadores Intel] nos mesmos canais de retalho dos tablets com Windows RT vai confundir os consumidores”.