Em 1969, a Académica perdeu a Taça mas foram os estudantes que festejaram

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Os jogadores da Académica antes da final de 1969 contra o Benfica dr

A 17 de Abril de 1969, Alberto Martins saltou para cima de uma cadeira no anfiteatro do Edifício das Matemáticas da Universidade de Coimbra e a sua vida mudou drasticamente. Abria a maior crise estudantil do Estado Novo, com os universitários a exigirem uma reforma completa do ensino em Portugal. Com a censura, o regime procurou abafar os incidentes, mas a equipa de futebol da Académica iria romper o cerco e levar os protestos à capital na final da Taça de Portugal.

A tensão era grande no Estádio Nacional, na tarde de 22 de Junho de 1969. A Guarda Nacional Republicana cercava, a cavalo, todo o recinto, lá dentro elementos com ameaçadores cães-polícia seguiam qualquer movimento suspeito e um batalhão de agentes da PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado) completavam o aparato. Benfica e Académica iam disputar a final da Taça de Portugal, mas jogava-se muito mais do que isso no Jamor. Pelas bancadas, milhares de estudantes universitários ocultavam tarjas com palavras de ordem, à espera da melhor oportunidade de transmitir ao país as suas reivindicações. Muitos foram presos ainda antes do apito inicial.

"Houve uma organização fantástica", recorda ao PÚBLICO Alberto Martins, então presidente da Direcção-Geral da Associação Académica de Coimbra (DGAAC), que dois meses antes iniciara a crise, durante uma visita do Presidente da República Américo Tomaz à Universidade, para inaugurar o referido Edifício das Matemáticas. "Pedi a palavra para falar, mas ele não me autorizou e acabou por abandonar à pressa o anfiteatro onde nos encontrávamos. Subi para uma das cadeiras e fiz, mesmo assim, o discurso para os estudantes que enchiam a sala e o exterior. Falei dos problemas da universidade, do ensino em Portugal e da necessidade da sua democratização".

As palavras do futuro ministro da Justiça (2009-11) não deixavam de ser ouvidas pela comitiva presidencial que procurava manter a normalidade protocolar, prosseguindo a visita ao edifício. Mas era impossível manter a compostura, quando eram cilindrados com apupos tão inéditos como audazes: "Palhaços, palhaços!".

Durante a madrugada, Alberto Martins foi detido pela PIDE. "Interrogaram-me e perguntaram quem estava atrás deste movimento dos estudantes, mas acabaram por soltar-me perto do meio-dia do dia 18 de Abril." Dias depois, todos os dirigentes da (AAC) eram suspensos, até serem concluídos os resultados de um inquérito aos incidentes: "Na prática, significava que estávamos expulsos e foi nesta altura que decidimos fazer o luto académico, primeiro com greve prolongada às aulas e, depois, aos exames. Uma esmagadora maioria dos professores apoiou-nos."

E a Académica aderiu prontamente à causa. "Na final do Jamor, combinámos entrar a passo, de capa académica aberta e caída, que era um sinal de luto", lembrou ao PÚBLICO Manuel António, ex-avançado academista. "Antes, em outras partidas, tínhamos protestado de outras formas, como entrar em campo com um inédito equipamento branco, com uma braçadeira negra, ou com adesivos no emblema, mas estas atitudes foram proibidas", conta o jogador, que seria autor do primeiro golo do encontro, aos 36".

O comportamento do Benfica, quer no relvado quer nas bancadas foi enaltecido pelos estudantes, ficando apenas atravessado na garganta o golo de Eusébio, aos 109", do prolongamento (Simões havia empatado o encontro, aos 41") e que rendeu a Taça aos "encarnados". Mas até isso pode ter sido positivo para evitar males maiores no vale do Jamor. "Tenho pena de não termos ganho, mas, por outro lado, as consequências podiam ser complicadas...", admite Manuel António, actualmente director do IPO de Coimbra, que cumpria na altura o serviço militar e fora transportado para o estágio da equipa, na véspera do jogo, no carro de um coronel, de alcunha "Totobola" e adepto incondicional da Académica.

"Com a tropa, aquele foi um ano muito difícil. O meu treino eram os exercícios militares. Cheguei a jogar no Norte do país, apanhar um avião no Porto, sair em Lisboa e seguir de táxi para Tavira, onde estava a minha unidade."

Instalado na bancada Superior Sul, Alberto Martins controla o ambiente: "No intervalo é que surgiram os cartazes, com as palavras de ordem. É impressionante, porque eles vão percorrer todo o estádio, passando pelas mãos dos adeptos do Benfica, que se associaram espontaneamente ao protesto. Foi o jogo mais emocionante da minha vida."

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