Torne-se perito

Começa hoje uma nova era, com o primeiro "táxi" espacial privado?

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O interior da cápsula Dragon, que levará carga, e um dia astronautas, para o espaço (em cima); e uma visão da cápsula em órbita, com os seus painéis solares abertos (ao lado) Fotos: SpaceX

Se tudo correr como previsto, parte hoje de Cabo Canaveral, a caminho da Estação Espacial Internacional, o primeiro foguetão privado da história da conquista do espaço pelos seres humanos

O momento histórico foi marcado para esta manhã às 09h55 (hora de Lisboa). Nesse preciso instante, o foguetão Falcão 9, com a cápsula Dragon na sua ponta, deverá descolar do centro da agência espacial norte-americana NASA em Cabo Canaveral, na Florida. A novidade histórica do acontecimento é que tanto o foguetão como a cápsula pertencem a uma empresa, a californiana SpaceX. Trata-se do primeiro voo de um foguetão privado para a Estação Espacial Internacional (ISS) e, se for bem sucedido, marcará o início de uma nova era do transporte e da exploração espacial.

Após três adiamentos desde Fevereiro e semanas adicionais a verificar minuciosamente o software para ter a certeza de que a cápsula não apresenta risco para a segurança da ISS, a SpaceX e a NASA dizem estar finalmente prontas. Se não partir hoje, poderão tentar novo lançamento a 22 de Maio. Seja qual for a data efectiva do lançamento, o programa desta missão de demonstração será o seguinte: a cápsula Dragon (com seis toneladas de peso, 5,9 metros de altura e 3,6 metros de diâmetro) deverá sobrevoar a ISS dois dias depois do lançamento (a 21 de Maio se partir hoje), permanecendo, numa primeira fase, a uns prudentes 2,5 quilómetros de distância.

Mais um dia, já com a Dragon firmemente "agarrada" pelo braço robotizado da ISS, manobrado pela tripulação residente, será feita uma tentativa de acoplagem. Ainda decorrerá mais um dia antes de os astronautas da ISS procederem à abertura das escotilhas entre as duas naves, devendo isso acontecer a 23 de Maio. A cápsula permanecerá amarrada à ISS durante cerca de duas semanas, antes de se separar e de iniciar a sua viagem de regresso à Terra, onde deverá ser recuperada no oceano Pacífico, a uns 450 quilómetros ao largo da Califórnia.

NASA aposta nos privados

Com a "reforma" dos seus vaivéns, em Julho de 2011, a NASA está a apostar no sector privado para efectuar o transporte de carga para a ISS já este ano - e, talvez a partir de 2015, para transportar astronautas. Isto porque as tarifas praticadas pelos transportadores de tripulação dos quais a NASA está dependente - as cápsulas Soiuz russas, de três assentos - são proibitivas: 50 milhões de dólares (quase 40 milhões de euros) por astronauta. Quanto ao transporte de carga, as naves Progresso russas, ATV europeias e HTV japonesas não são recuperáveis. Esta é precisamente uma das originalidades da cápsula Dragon: é reutilizável, sendo recuperada no mar - o que reduz substancialmente o seu custo e permite trazer carga de volta.

Depois de a SpaceX ter demonstrado ser capaz de colocar a cápsula em órbita e de a recuperar, num voo em Dezembro de 2010, a NASA assinou com a empresa um contrato de 1600 milhões de dólares para 12 missões de transporte de carga até à ISS ao longo de quatro anos - e um outro de 75 milhões de dólares, em Abril de 2011, para a cápsula Dragon ser preparada para o transporte de sete astronautas.

A SpaceX não é a única na corrida: a NASA também assinou um contrato (de 1900 milhões de dólares) com a empresa Orbital Sciences, que prevê oito missões de reabastecimento da ISS - e cujo foguetão Antares e a cápsula Cygnus deverão realizar o seu voo inaugural ainda este ano.

A cápsula Dragon é capaz de levar até seis toneladas de carga e trazer até três de volta. Durante esta primeira viagem para a ISS, levará 521 quilos de alimentos, material de laboratório, computadores portáteis, baterias e cabos eléctricos, devendo regressar com 660 quilos de carga.

Da Paypal para o espaço

A SpaceX foi fundada em 2002 por Elon Musk, empresário da Internet. Este sul-africano de 40 anos, naturalizado norte-americano, fez fortuna - 2000 milhões de dólares - em parte graças à criação da Paypal, o célebre serviço de pagamentos online. E fundou a SpaceX para revolucionar o transporte espacial e permitir um dia a colonização de planetas como Marte pelos seres humanos. O nome do seu foguetão inspira-se no da nave de Han Solo e de Chewbacca na Guerra das Estrelas, o Millennium Falcon. A prazo, tenciona desenvolver uma versão do Falcon também ela recuperável, com os seus dois andares capazes de reentrar na atmosfera e poisar na vertical.

E se o lançamento programado para hoje falhar? "Embora se trate apenas de um ensaio, esta missão criou grandes expectativas", diz John Logsdon, especialista próximo da NASA, citado pela AFP. "As consequências de um fracasso poderiam ser graves."

Numa entrevista concedida à mesma agência noticiosa em inícios de Maio, Musk estimava que o lançamento tinha "mais de 50% de hipóteses de sucesso" e prometia recomeçar em caso de falhanço. "A NASA está confiante e nós também", salientava. Se tudo correr bem hoje, Musk tenciona efectuar a primeira missão comercial de transporte de carga já este Verão.

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