Recolha ilegal de electrodomésticos ameaça reciclagem
Empresa que gere a maior parte do fluxo de resíduos eléctricos e electrónicos lamenta concorrência dos "catadores"
A crise e a colecta ilegal de electrodomésticos velhos, como frigoríficos e televisores, podem comprometer o cumprimento das novas metas de reciclagem de resíduos eléctricos e electrónicos, alerta a maior entidade portuguesa do sector.
Em cinco anos de actividade, a Amb3E - empresa que gere os resíduos de cerca de 70% dos produtos eléctricos e electrónicos colocados no mercado - recolheu cerca de 180 mil toneladas de aparelhos que de outra forma iriam para o lixo normal. A quantidade tem vindo a aumentar. No ano passado, foram cerca de 43 mil toneladas - 22% a mais do que em 2010.
Mas uma boa parte do que os cidadãos deitam fora, mesmo que colocada nos contentores próprios - o "ponto electrão" -, acaba por nunca aparecer à porta dos recicladores acreditados, sendo desviada para circuitos paralelos, onde não há garantia de tratamento adequado.
O presidente da Amb3E, Hans Egenter, diz que há sistematicamente uma diferença entre o número de equipamentos novos vendidos pelas lojas e os usados que são recolhidos. Embora muitas vezes um novo aparelho não implique que se deite o velho fora, a Amb3E sugere, sem especificar um número ideal concreto, que o hiato deveria ser menor. "Há um mercado paralelo que funciona, e funciona cada vez melhor", diz Egenter.
Segundo dados da Comissão Europeia, cerca de dois terços dos equipamentos eléctricos e electrónicos colocados no mercado acabam por ser recolhidos separadamente do lixo normal. Mas mais da metade é exportada ilegalmente ou é tratada de forma inadequada.
O director-geral da Amb3E, Jorge Vicente, fala de uma estrutura em pirâmide, na qual sucateiros são abastecidos por inúmeros apanhadores ilegais de resíduos. Alguns, segundo diz, chegam a circular com carrinhas pintadas com a mesma cor de veículos municipais.
Esta actividade, diz Jorge Vicente, traz riscos acrescidos ao ambiente, pois muitas vezes os "catadores" retiram apenas o que interessa dos electrodomésticos, como os compressores dos frigoríficos, componentes dos televisores ou tudo que é metal num equipamento. "Às vezes, os frigoríficos chegam-nos completamente descarnados", afirma.
"Catadores" a apanhar electrodomésticos ou outros resíduos nos ecopontos ou junto aos contentores não são novidade. Mas a Amb3E teme que a situação piore num futuro próximo. A quantidade de aparelhos vendidos está a diminuir, tendo caído 21%, em peso, entre 2010 e 2011, segundo dados da Associação Nacional para o Registo de Equipamentos Eléctricos e Electrónicos. "Infelizmente, a tendência é continuar", antecipa Hans Egenter.
Menos equipamentos no mercado significa menos resíduos e, por isso, mais concorrência entre o circuito legal e o ilegal de recolha. Isto poderá comprometer o cumprimento das metas de uma nova directiva da União Europeia, que prevê a recolha, até 2016, de 45% dos equipamentos colocados no mercado, subindo para 65% em 2020.
"Vai ser mais complicado de cumprir", diz Hans Egenter, completando que a Amb3E tem alertado as autoridades ambientais e policiais sobre o assunto.
A meta actual - recolha de quatro quilos de resíduos eléctricos e electrónicos por habitante - já está a ser cumprida. A maior parte do esforço vem de grandes operadores de recolha e tratamento de resíduos. Já os "pontos electrões" responderam, em 2011, por apenas 4% da recolha. As escolas contribuíram com 3% e os quartéis de bombeiros, com 5%.