Diabetes do tipo 1 tratada em ratinhos
A diabetes de tipo 1 é uma doença auto-imune incurável, que vai destruindo as células do pâncreas responsáveis pela produção de insulina, uma hormona que desvia a glicose que está no sangue para as células, evitando os efeitos negativos deste açúcar. Apesar de haver condicionantes genéticas, sabe-se muito pouco sobre as causas desta doença que está a afectar pessoas cada vez mais novas. Só na população portuguesa, existem 3500 jovens até aos 21 anos com diabetes do tipo 1 e, ao todo, são 50.000 portugueses.
Os diabéticos não produzem insulina e têm, por isso, de injectar esta hormona várias vezes por dia antes das refeições, de modo a controlar os efeitos negativos do açúcar no sangue, que, ao longo do tempo, pode provocar cegueira, arteriosclerose, entre outros problemas.
Após décadas de investigação, o mais próximo que se consegue de um tratamento é o transplante do pâncreas ou das células-beta produtoras da hormona. Mas estes métodos não curam a resposta auto-imune inicial e, passados poucos anos, o problema reincide.
“Dois em um”Por isso, a equipa de Defu Zeng, do Instituto de Investigação de City of Hope, na Califórnia, Estados Unidos, fez um estudo “dois em um”. Por um lado, criou no mesmo ratinho um sistema imunitário quimérico, ou seja com duas fontes diferentes de células imunitárias. Aplicou células imunitárias de um animal que não tinha esta doença auto-imune em ratinhos com diabetes, numa fase tardia da doença, em que já não produziam insulina. Os ratinhos passaram a produzir, na medula óssea, células imunitárias de duas fontes: as suas, que eram as originais, e as novas células a partir das que foram administradas.
Depois, os cientistas provocaram a diferenciação e a multiplicação de novas células-beta do pâncreas, a partir de células estaminais que existem no órgão. Para isso, utilizaram um tratamento hormonal.
O resultado teve sucesso a longo prazo. Houve a criação e multiplicação de novas células-beta que produziram insulina. Por outro lado, o sistema imunitário quimérico evitou a reacção auto-imune.
“É um estudo importante porque faz aquilo a que se chama a prova de conceito”, explica João Filipe Raposo, director clínico da Associação Protectora dos Diabéticos Portugueses. “Actua nas várias fases da doença e mostra que consegue haver regeneração”, disse ao PÚBLICO.
Na experiência, 60% dos ratinhos conseguiram obter esta regeneração. O que é “um resultado encorajador”, disse o professor da Faculdade de Medicina da Universidade Nova de Lisboa. Para João Filipe Raposo, este estudo “abre perspectivas e permite aumentar a esperança de que no futuro se consiga curar a diabetes do tipo 1”.
Mas este tratamento, a ocorrer, não será nos próximos cinco ou dez anos, segundo o médico. Primeiro, será necessário alargar o estudo a mais ratinhos, ao mesmo tempo que é necessário seguir os que já foram tratados, para verificar se o tratamento continua a resultar, refere João Filipe Raposo.
Depois, é preciso passar para um modelo animal mais parecido com os seres humanos em relação à diabetes. Finalmente, se tudo correr bem, é necessário mostrar que o tratamento não tem efeitos negativos nas pessoas. Apesar de a diabetes aparecer em média em crianças com oito anos, “e está a aparecer cada vez mais cedo”, acrescenta, o tratamento terá de ser testado primeiro em adultos e só depois em crianças, cujas regras para entrar em ensaios clínicos são ainda mais apertadas.