O caminho estipulado para as segundas-feiras — rumo à London Metropolitan University — não será cumprido esta semana. Ter 18 anos e ser estudante em Londres (sem ajuda dos pais) também é isto: trocar as voltas ao calendário e (ter de) fazer gazeta às aulas de vez em quando.
É uma questão numérica, literalmente, de euros ao fim do mês (“Se quero continuar aqui, tenho de trabalhar”). Jessica Fino chegou a Londres há nove meses para cumprir o sonho de tirar o curso de Jornalismo. Ficar em Portugal seria abrir mão de um futuro que idealizou: os pais não tinham capacidade para lhe pagar um curso superior e encontrar um emprego e conciliá-lo com a faculdade em Portugal pareceu-lhe uma conjugação impossível.
Na previsão da estudante entram os números históricos do desemprego entre jovens com menos de 25 anos: 35,4%. E entra a realidade actual do ensino superior em Portugal, onde o número de bolseiros regressou a valores semelhantes aos registados há 12 anos: cerca de 56 mil.
Em Londres, Jessica candidatou-se a uma bolsa. E conseguiu: as 3375 libras anuais de propinas que teria de pagar são dadas por esse financiamento. Se arranjar emprego na área em que está a estudar um ano depois de acabar o curso terá de pagar 5 libras por mês à universidade. Se não arranjar, as propinas ficam automaticamente liquidadas.
A flexibilidade de horários na faculdade – conseguiu concentrar as aulas em apenas dois dias – dá-lhe espaço para trabalhar quatro dias por semana num salão de cabeleireiro em St. John’s Wood. Pagam-lhe à semana e em média consegue juntar 700 libras por mês (fora as gorjetas).
Código do Trabalho: menos direitos
Ser trabalhador-estudante é possível? "Em Londres sim", responde Jessica Fino. Em Portugal, desconhece-se o número de trabalhadores-estudantes. Conhecem-se as críticas recorrentes de quem tenta conciliar dois mundos nem sempre compatíveis. A última queixa visa uma alteração introduzida no Código de Trabalho, aprovado no final de Março: o trabalhador estudante que preste trabalho suplementar continue a ter direito ao descanso compensatório mas só a metade das horas prestadas.
Para Jessica, emigrar foi a “decisão mais acertada” que podia ter tomado. Mas sabe que nem todos os jovens estão dispostos a trabalhar aos 18 anos para pagar a universidade: “Pensam que são muito novos e que terão tempo para isso depois”, disse ao P3.
Quase todos os amigos da jovem de Leiria apreciam a “aventura” que Jessica enfrenta. Muitos dizem-lhe que gostavam de fazer o mesmo, mas ainda nenhum o fez efectivamente. Sair é uma coisa boa? “Sinto-me um pouco mal em encorajar os jovens da minha idade em sair do país porque eu adoro Portugal e preferia estar no meu país. Mas a situação agora está impossível”.
Quando terminar o curso vai tentar a sorte na imprensa britânica e procurar emprego como correspondente em Londres para órgãos de comunicação portugueses. Uma tarefa "complicada", mas que, para já, lhe soa "mais realista" do que um regresso a Portugal.
Artigo actualizado a 3 de Maio