São jovens, artistas, fazem teatro e dança. Trabalham sem rede. Resistem

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Os jovens criadores que se apresentam no Teatro de Almada a partir de hoje Teatro Municipal de almada

Ao longo de um mês, o Teatro Municipal de Almada recebe criações que serão pagas com as suas próprias receitas de bilheteira. Vê-las é também perceber o que estamos a perder com a falta de apoios às artes

O que hoje começa no Teatro Municipal de Almada não é um festival, diz Jean-Paul Bucchieri, coordenador do programa Sala Experimental que, até 13 de Maio, reúne dez espectáculos em apresentação única. Ou melhor: ainda não é um festival. Com duas estreias por semana, velocidade que parece de festival, serão mostradas novas criações, em estreia absoluta, "algumas ainda em processo", todas assinadas por nomes que estão a começar ou que já cá estão há algum tempo mas que, por força das circunstâncias, são "jovens artistas".

Um festival é motivo de celebração, mas há nuvens a ensombrar este ciclo. O gesto ganha em importância por factores externos: ausência de apoios a primeiros projectos, com a Direcção-Geral das Artes a cancelar o financiamento a projectos anuais e pontuais, deixando de fora das suas competências o apoio a criações e criadores sem rede; cortes nos orçamentos dos teatros para compra de peças; espaços que eram referência nos circuitos "alternativos", também eles dependentes de apoios, a reduzirem as suas apostas; incapacidade de produção e circulação das companhias, ausência de rede alternativa ao Estado para financiamentos pontuais; condições que não pagam as despesas... É olhar à volta e ler os sinais - a situação não se descreve senão assim: precariedade. Se já é difícil para as companhias subvencionadas, para os que estão a começar a pergunta é: resistir ou desistir?

Bucchieri espera que os criadores que vai apresentar resistam e que os seus projectos criem novas cadeias de produção e ajudem a dinamizar "uma economia que não se move". "Nós [os teatros] somos o último elo na cadeia", diz, para falar de uma realidade que "asfixia a jovem criação contemporânea".

O ciclo Sala Experimental começa hoje com Lugar Comum, criação colectiva de Eduardo Breda, Joana Francampos, José Redondo e Sofia Vitória, jovens actores numa primeira experiência de criação, com "textos soltos que encontraram uma casa". Uma aposta que representa a liberdade com que este ciclo foi pensado, sem olhar "à forma ou ao conceito", diz Bucchieri, e que junta nomes como Sofia Dinger (atenção ao seu trabalho, dos mais curiosos da nova vaga), com Quando Eu For Boa Actriz, Prometes Que me Vais Ver?, ou Raquel André e Tiago Cadete (Last), que têm trabalhado com o coreógrafo Francisco Camacho.

Geracional?

Vamos do corpo como território, debatido em Wasteland, de António Cabrita e São Castro, ao jogo de palavras "demasiado viciadas/viciantes" que Rui Neto vai apresentar em Luto ou a experiência Des...conexões, de Sophia Ribeiro, que incluirá uma transmissão em live streaming directamente da Tate Modern, em Londres. "Não interessa se é mais teatro ou mais dança", diz o programador, defendendo propostas que surgem "de uma vontade de reflectir o abatimento de fronteiras entre os géneros das linguagens contemporâneas".

Bucchieri fez convites directos a jovens que foi acompanhando nos últimos tempos e que respondem, ainda, e muito por causa das condições de produção, à classificação de "jovem artista". "Quando é que se deixa de o ser?", pergunta Diogo Bento, que estreia Scary Monsters, a partir de Jorge Luis Borges, depois de ter apresentado, com Inês Vaz, Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett no Teatro Nacional D. Maria II, entre outros sítios - e de ter feito a sua primeira peça, Han Shot First, num ciclo semelhante, intitulado Try Better, Fail Better, organizado pelo Teatro da Garagem no Teatro Taborda nas últimas temporadas.

Diogo Bento pergunta-se se a definição de jovem artista será realmente uma questão geracional. "Há quem esteja a fazer agora e quem já tenha começado antes", diz. "Tem a ver com condições de produção? Provavelmente", diz também, depressa deixando de querer pensar sobre este assunto. "Não havendo rigorosamente nada, e passando nós por um período de seca, todas as oportunidades têm que ser aproveitadas." A qualquer preço? "Estou habituado e não levo muito a mal, mas nestas circunstâncias, não vale a pena o desespero, devia ser tudo mais cool."

Bucchieri impressiona-se com o número de pessoas disponíveis para trabalhar contando apenas com a receita de bilheteira numa sala de cem lugares. "É, provavelmente, um reflexo da crise, mas é impossível pensar que a criação contemporânea possa continuar sem um apoio orçamental estável."

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