Escândalo leva Umberto Bossi a deixar a liderança da Liga do Norte

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Inquérito ao tesoureiro do partido obrigou o líder a pedir a demissão ANDREAS SOLARO/AFP

Saída do fundador pode levar o partido a desmoronar-se e facilita a vida a Mario Monti

O controverso fundador e líder histórico da Liga do Norte, Umberto Bossi, anunciou ontem a sua demissão do partido que viabilizou os governos de Silvio Berlusconi e que agora corre o risco de se desmoronar na sequência de um escândalo de financiamento ilegal, fraude e corrupção.

O caso tem como personagem central Francesco Belsito, um antigo porteiro que sob a protecção de Bossi ascendeu a tesoureiro do partido, e que se demitiu na terça-feira, depois de se saber que estava a ser investigado pelo uso ilegítimo de fundos partidários. As verbas "manuseadas" de forma ilegítima por Belsito foram utilizadas, entre outras coisas, no pagamento de obras na residência de Bossi ou no aluguer de um Porsche pelo seu filho.

De acordo com as autoridades, Bossi não é considerado suspeito no inquérito em curso, conduzido pela Procuradoria de Milão. Mas a natureza do escândalo põe directamente em causa a sua honra e integridade - e é, de certa maneira, um capricho do destino: o líder da Liga do Norte notabilizou-se, ao longo da sua carreira política, pelas suas invectivas contra o sistema corrupto de Roma.

"Demito-me do cargo em nome do movimento e dos seus activistas", terá declarado Umberto Bossi aos membros do conselho executivo do partido, que ontem reuniram de emergência para nomear um novo tesoureiro. A Liga do Norte, que nasceu como um movimento de secessão na próspera região da Lombardia, ganhou proeminência na arena política italiana na década de 90, a reboque das investigações e julgamentos que ficaram conhecidas como "Operação Mãos-Limpas".

Antes do escândalo, a liderança de Bossi, que está à frente da liga desde os anos 80, já estava a ser posta em causa por causa da forma como geria o partido, com as bases a declararem a sua insatisfação pela existência de um "círculo mágico" em redor do líder e a contestarem a sua declarada intenção de apenas "entregar" o cargo ao seu filho Renzo (conhecido como "O Truta"). "Se estas alegações vierem a provar-se, a carreira política de Bossi acabou", resumia o cientista político Giovanni Sartori, citado pela Reuters.

O anúncio da demissão de Bossi, ontem, foi acompanhado pela ressalva de que a sua demissão não fora pedida por nenhum dirigente da liga. Mas os mais atentos lembravam que o antigo ministro do Interior, Roberto Maroni, uma das estrelas do partido, já tinha pedido "uma limpeza" assim que se se descobriu que Belsito estava sob investigação.

A saída de Bossi enfraquece substancialmente a oposição parlamentar ao executivo tecnocrata liderado por Mario Monti. Quando Berlusconi se demitiu do cargo e dissolveu o seu Governo para dar lugar a um executivo de tecnocratas, a Liga do Norte recusou dar o seu acordo às negociações políticas, e transferiu-se para a bancada da oposição.

Vários analistas políticos consideravam que este seria mais um escândalo seria a reforçar na opinião pública italiana a associação entre os partidos políticos e a corrupção - e aumentar a "tolerância" da sociedade com o facto de ser governado por um executivo que não foi eleito.

"Já existe um forte sentimento de descrença e desconfiança dos políticos entre o eleitorado, com muitos italianos a considerar que a Itália podia passar bem sem eles", notava o responsável pelo departamento político do centro de sondagens IPSOS, Luca Comodo. "Um número cada vez maior [de eleitores] tem vindo a manifestar o seu apoio por Monti e a defender a manutenção do seu governo".

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