Whitney Houston "A Voz" calou-se para sempre

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Whitney Houston com o Grammy que recebeu a 23 de Fevereiro de 2000, como melhor cantora feminina de rythm"n"blues, pela sua interpretação de It"s Not Right but It"s Okay (à esquerda); em cima, com Kevin Costner no filme O Guarda-Costas (1992); com Clive Davis - produtor musical e que disse ter descoberto a cantora quando esta tinha 17 anos - na edição dos Grammy em 2009; e com Bobby Brown, então seu marido, durante uma visita à cidade velha de Jerusalém, a 28 de Maio de 2003 VINCE BUCCI/AFP

Foi a banda sonora dos nossos dias nos idos anos 80 e 90. A sua voz estava em todo o lado. Cantora, e também actriz, Whitney Houston, que teve uma vida pessoal atribulada, calou-se para sempre anteontem. Morreu em Los Angeles, onde estava para a cerimónia dos Grammys. Tinha 48 anos

Podia não se gostar da sua voz, mas era impossível fugir-lhe. Na rádio, nas lojas, na rua, nas televisões, nas discotecas ou nos carros, era omnipresente. Ela foi a banda sonora dos nossos dias, principalmente na década de 1980 e parte dos anos 1990. Anteontem, "A Voz" (The Voice), como ficou conhecida, calou-se.

Whitney Houston, que contava 48 anos, foi encontrada morta num dos quartos do Beverly Hilton Hotel de Los Angeles, que acolhia a festa de antecipação da cerimónia anual de entrega dos Grammys, que se realizou hoje de madrugada naquela cidade. Ainda não são conhecidas as causas da morte, sabendo-se apenas que tentaram reanimá-la durante 20 minutos, sem sucesso.

A cantora foi uma figura de grande relevo no panorama do mercado global da música popular, sobretudo na segunda metade dos anos 80, tendo vendido mais de 170 milhões de discos e somado 11 números um, só nos Estados Unidos. O seu singleI will always love you, um original de Dolly Parton, é ainda hoje o recordista de vendas por uma cantora. Ao longo dos anos foi angariando imensos prémios de música - cerca de 415, um recorde para uma só artista, avalia o Guinness- com destaque para seis Grammys.

Para além da música, ficou conhecida como actriz em meia dúzia de filmes, com destaque para O Guarda-Costas de 1992, onde surgia ao lado de Kevin Costner, para interpretar precisamente o papel de diva da música. Em Agosto está prevista a estreia do seu último filme, Sparkle, inspirado na história das Supremes.

Quase todos os seus sete álbuns e três bandas sonoras para filmes venderam milhões, com dois deles a ultrapassarem mesmo a fasquia dos dez milhões de cópias: o álbum homónimo de estreia de 1985 e a banda sonora de The Bodyguard de 1992.

Casamento tumultuoso

Nos últimos anos, a sua vida pessoal, marcada pelo consumo de drogas e por um casamento muito tumultuoso e psicologicamente esgotante com o cantor Bobby Brown (iniciado em 1992 e terminado em 2007), foi mais motivo de atenção da imprensa do que a música, embora o seu último álbum (I Look To You, de 2009) a tenha devolvido ao sucesso, depois de um regresso que não correspondeu às expectativas, em 2002, com Just Whitney.

Do que não existem dúvidas é que tocou milhões, com canções como How will I know, I"m every woman ou Saving all my love for you. Ontem, inúmeras mensagens de pesar ocuparam o espaço mediático e a festa de antecipação dos Grammys - organizada por Clive Davis, o seu mentor - transformou-se num momento de celebração da sua vida, com Davis a afirmar que ela "teria gostado que a música continuasse e foi isso que a família pediu."

O veterano Tony Bennett lançou a noite com o tema How do you keep the music playing e fez um discurso lembrando também as mortes de Michael Jackson e Amy Winehouse, enquanto Alicia Keys ou Puff Daddy lhe prestaram homenagem.

Whitney nasceu a 9 de Agosto de 1963 em Newark, começando muito nova a cantar na igreja, ao lado da mãe, a cantora de gospel Cissy Houston. No final dos anos 70 e começo dos 80 cantou ao lado de Chaka Khan, dos Neville Brothers ou dos Material de Bill Laswell, antes de enveredar pelo percurso a solo, destacando-se de imediato pela voz vibrante, que tanto colocou ao serviço de simples canções pop como I wanna dance with somebody, como de baladas de execução exuberante como I will always love you.

Voz menos potente

Na segunda metade dos anos 90, já depois de se ter estreado como actriz nos filmes O Guarda-Costas, Waiting to Exhale (1995) e The Preacher"s Wife (1996), começaram a vir a público os seus problemas de dependência. Na década de 2000 estava em luta, principalmente por causa de um casamento que começou a ser tema público. A sua voz tornara-se menos potente e as suas actuações ao vivo começaram a ser erráticas e muito inseguras. Em 2010 cancelou mesmo parte da sua digressão europeia.

Em Setembro de 2009, em Londres, na festa de lançamento do seu último álbum, onde estivemos presentes, o seu grande mentor, Clive Davis, produtor executivo, fundador da Arista e um dos homens mais influentes da indústria da música, resumiu quase tudo o que se pode dizer acerca dela. Ele, que antes já havia lançado nomes como Janis Joplin ou Bruce Springsteen, disse que a havia descoberto aos 17 anos, a cantar num clube nocturno.

"Em termos de voz e de presença em palco, ninguém se comparava a ela", disse, antes de explicar que a enquadrava no espectro das grandes vozes negras: "Não os compositores, os produtores, os instrumentistas. Mas vozes como Sarah Vaughan, Lena Horne ou Ella Fitzgerald." Ou seja, aquilo que Clive Davis quis reafirmar é que Houston não podia ser enquadrada na cultura rock que nunca se reviu na sua imagem e naquilo que personificava, acusando-a de ser plastificada ou histriónica.

Antes de mais, ela foi uma intérprete de um repertório que, nos últimos anos, tanto agradava a um público maduro que se revê na tradição das grandes vozes negras como a um público mais jovem que consome soul e R&B estilizado para grandes massas.

As letras do seu último disco focam precisamente temáticas como a "determinação" ou o "triunfo sobre a adversidade", naquilo que parecem ser referências à sua vida privada. E nisso a sua morte acaba por fazer eco da de Michael Jackson, já que ambos se afirmaram globalmente nos anos 80, em parte graças à MTV. Os dois experimentaram também o outro lado de se ser estrela planetária, com a sua vida a ser esmiuçada ao pormenor.

Nessa sessão em Londres, Whitney Houston acabou a abraçar Clive Davis. Quem assistiu percebeu que era muito mais do que um mero abraço entre dois profissionais. Para Clive, ela era a sua "menina". Para ela, Clive, era o "pai", o seu "salvador", alguém que, a cada sucessivo recomeço, esteve sempre ao seu lado.

Mesmo no final, virou-se para os jornalistas e disse, emocionada, que os anos que tinha vivido em desespero haviam terminado. Depois, fez um gesto um pouco teatral, de diva, e foi-se.

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