Um terço das mulheres com mais de um filho não planeou a sua última gravidez
É o primeiro estudo com dados sobre gravidezes não- planeadas no país. Mães com mais de um filho são as que mais erram na contracepção
Cerca de um terço (34%) das mulheres com mais de um filho não planeou a sua última gravidez, ou seja, admite ter engravidado na sequência de um descuido ou falha de método contraceptivo, constata um estudo feito em parceria pelo Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge e a Direcção-Geral da Saúde (DGS).
Os dados recolhidos no estudo
Uma "observação" sobre a utilização de cuidados preventivos pela mulher
permitem concluir que a maioria das mulheres planeia as suas gravidezes, mas há um número significativo que não o faz. O que se verifica é que "é mais frequente planear a primeira gravidez" e que "as gravidezes subsequentes ocorrem mais por erro de contracepção", nota a directora da divisão de saúde reprodutiva da DGS, a obstetra Lisa Vicente.Assim, estima-se que 75% das mulheres portuguesas dos 18 aos 55 anos com filho único planearam esta sua gravidez, número que desce para 66% no caso de mulheres com mais de um filho em relação à sua última gestação. De entre as mulheres que engravidaram sem querer, na primeira gravidez há 18,9% que dizem ter sido por descuido e 6,2% que o atribuem a falha de método. Nas mulheres com vários filhos, os números são mais altos: 23,9% respondem que foi descuido, 10% que foi falha de método (incluindo métodos naturais como o coito interrompido). O estudo inquiriu uma amostra de 826 mulheres em Maio e Junho do ano passado por telefone fixo ou telemóvel, fazendo a partir daí estimativas para o total da população.Lisa Vicente diz que se tira uma mensagem deste estudo que, pela primeira vez, dá conta da dimensão das gravidezes não-planeadas: é preciso "trabalhar mais" junto das mulheres com vários filhos, que admitem engravidar por erros contraceptivos, tanto na formação dos profissionais de saúde como na informação que lhes é disponibilizada. A médica nota que, muitas vezes, se foca a mensagem da contracepção nos jovens e em grupos mais desfavorecidos, mas o que sobressai destes dados é a necessidade de passar a informação correcta a este grupo, com esclarecimentos como "o que fazer quando se esquecem um dia de tomar a pílula, que medicamentos interferem com a sua eficácia, o que fazer quando o anel vaginal cai". "Além da distribuição de contraceptivos, é preciso aumentar a informação correcta sobre os métodos", diz.
Homens reagem pior
"Há uma corrente que defende que as gravidezes não devem ser tão planeadas", mas este estudo demonstra também que quando a gravidez não é planeada há pais que não a aceitam bem. O estudo fez a pergunta às mulheres com apenas um filho: em 79,1% dos casos, "ambos os progenitores aceitaram bem a gravidez [não- planeada]"; em 14,8%, "nenhum dos progenitores aceitou bem"; em 4,4% foi só "bem aceite" pela mãe; e em 1,7% dos casos só pelo pai. Mas o estudo não perguntou que consequências teve essa má aceitação, e se levou, por exemplo, a interrupções voluntárias da gravidez, esclarece.
A médica nota também que existe uma diferença entre o que as mulheres entendem como "gravidez planeada" e o entendimento médico do conceito. Para as mulheres, planear um filho parece significar simplesmente parar a contracepção; para os médicos, uma mulher que planeia ter um filho é aquela que recorre a uma consulta pré-concepcional antes de parar a contracepção, para verificar "se está tudo bem". Só em 71% das gravidezes únicas planeadas as mulheres dizem ter recorrido a uma consulta pré-concepcional; em relação à última gravidez, foram 74% a fazê-lo. Lisa Vicente sublinha que esta consulta é muito importante tanto em mulheres saudáveis como doentes, que podem precisar de equilibrar a patologia para poderem engravidar, como é o caso da diabetes e da hipertensão.