Após anos de discussão, a primeira torre do Aleixo implodiu da passada sexta-feira.
O Aleixo não é o primeiro bairro moderno a desaparecer; foi precedido pelo de S. João de Deus e por tantos outros conjuntos por essa Europa fora, que têm seguido o exemplo do complexo norteamericano de Pruitt-Igoe (projectado pelo autor das desaparecidas Twin Towers), demolido em 1972 após ter-se transformado num gueto.
Pondo de lado as polémicas relativas à possibilidade de estas demolições serem fruto de interesses imobiliários, à exequibilidade da recuperação dos imóveis e ao processo de realojamento, concentremo-nos nos motivos para este fracasso.
No passado falava-se em “questões sociais”, pois era a sociedade a ser posta em questão – a sua organização, a injusta distribuição da riqueza, a falta de solidariedade – hoje falamos de “questões urbanas”, porque esses problemas sociais adquiriram uma geografia específica no desenho das nossas cidades.
As cidades polarizaram-se em "lugares de forte concentração de propriedades positivas ou negativas", para usar as palavras do sociólogo Pierre Bourdieu. Isto é, algumas zonas concentram os bens raros e os seus proprietários, enquanto outras as dificuldades sociais: famílias numerosas com escassos recursos económicos, pessoas desempregadas ou com emprego precário, reduzida instrução e minorias étnicas com fortes identidades culturais, contribuindo para um estigma negativo associado à criminalidade e à insegurança.
Este fenómeno, paradigmático em França, é bem visível nas nossas cidades, ainda que com uma geometria diferente. Se em Paris a periferia social corresponde à última cintura urbana, composta por blocos de habitação construídos em massa entre as décadas de 50 e 70, a nossa periferia – a degradação, a pobreza, a ausência de serviços – constitui um arquipélago e não uma cintura.
É o caso do Aleixo, criado para alojar em melhores condições de habitabilidade a população proveniente do Barredo. O Bairro, embora seguindo os melhores princípios da Carta de Atenas, como tantos outros, falhou.
A principal razão prende-se com a elevada densidade e a enorme concentração na carência: 5 torres num terreno de 30000 m2, dois elevadores por torre (constantemente avariados), para acolher 320 famílias, das quais um terço a recorrer ao fundo de inserção social.
Poderíamos também falar do tecido urbano pouco conectado e das deficiências da arquitectura… No entanto, o erro estava nas premissas de base. E o tráfico de droga, associado ao progressivo abandono a que o bairro foi votado ao longo dos anos, encarregou-se de criar o estigma.
Mas os bairros de realojamento construídos hoje – que, é certo, são mais baixos (rés-do-chão mais três andares, para dispensar elevadores) – são assim tão diferentes do Aleixo? Estamos a aprender devidamente com os erros do passado? Ou continuamos a insistir nas mesmas políticas de habitação social? Só evitando a concentração na carência e promovendo a integração social, poderíamos fazer com que a cidade “unisse, já não separasse”.