Uma aproximação à exposição de Jeff Wall patente no Centro Galego de Arte Contemporânea (CGAC), em Santiago de Compostela, pode ser feita através de diferentes caminhos, tantas são as leituras potenciadas pela obra do artista canadiano. Uma das linhas mais produtivas está baseada na relação do seu trabalho com a emergência súbita da fotografia nesse instante crítico, quase dramático, criado pelo aparecimento da arte minimal e da arte conceptual: como se não houvesse uma saída para o reducionismo proposto por estes movimentos. O trabalho do artista canadiano, nascido em 1946, em Vancouver, no Canadá, encontrou uma resposta para as questões teóricas então na ordem do dia. Ao tomar como referente o período histórico no qual a fotografia emerge e a forma como este meio irá afectar a própria pintura, Wall estabelece uma nova forma, dir-se-ia cinematográfica, para reinventar o estatuto da imagem no território das artes visuais.
Os problemas que Jeff Wall procura resolver através das suas fotografias - e alguns dos melhores exemplos estão expostos no CGAC, como "The Destroyed Room" (1978), "Mimic" (1982), "Picture for Women" (1979), "Milk" (1984), "Storyteller" (1986), "The Thinker" (1986), "Men in Street" (1995), "A Men With a Rifle" (2000), "In Front of a Nightclub" (2006) ou o mais recente "Boy Falls from Tree" (2010) - têm diferentes origens, mas existe sempre a vontade de encontrar o equilíbrio entre a imaginação e a "factografia", entre a ficção e o documento.
O seu projecto é tão devedor do texto "O Pintor da Vida Moderna", publicado em três partes por Charles de Baudelaire, no Le Figaro, entre Novembro e Dezembro, de 1863, como dos textos de Sergei Tretyakov e de Iurii Tynianov, onde estes autores ajudam a definir, no início dos anos de 1920, a passagem da "faktura" construtivista, à "factografia" da nova esquerda, uma prática artística, literária, próxima da reportagem jornalística - Tretyakov via o facto como "uma acção, um processo, uma operação", observa Devin Fore (October 118, Outono de 2006). E acrescenta que esta posição recorda princípio "verum factum", formulado pelo filósofo político italiano Giambattista Vico, em 1710, segundo o qual a verdade é verificada através da criação e da invenção: "A verdade é um acto."
Há muitas outras influências reconhecidas por Wall ao longo de "The Crooked Path." O artista, em colaboração com o curador da exposição, Joël Benzakin, reuniu fotografias - Alfred Stieglitz, Eugène Atget, Diane Arbus, Robert Frank, Bill Brandt, Walker Evans, Helen Levitt, August Sander, Weegee, Wols, Peter Hujar, Stephen Shore, Thomas Ruff, Andreas Gursky, Thomas Struth, Jean Marc-Bustamante, James Welling, Christopher Williams etc. -, fragmentos de filmes - Bergman, Bresson, Buñuel, Fassbinder, Malick, Kubrick, Eustache, Pasolini, etc. -, algumas pinturas - Luc Tuymans, Kerry James Marshall -, esculturas - Martin Honert, Carl Andre - e alguns livros, para dar uma ideia da constelação através da qual se move, da qual faz ainda parte o contexto no qual trabalha, Vancouver, no Canadá, de onde são também outros nomes apresentados na mostra: Roy Arden, Ian Wallace, Stephen Waddell e Rodney Graham.
Uma das revelações mais curiosas da mostra, na qual se nota a ausência de pinturas marcantes no percurso de Wall (Manet, Matisse, Delacroix, Ingres), é a relação deste com "Nadja", texto de André Breton, publicado em 1928 e revisto pelo próprio em 1962, no qual assume especial relevância o diálogo entre as palavras do escritor surrealista e as fotografias de Jacques-André Boiffard, nas quais um dos primeiros críticos a chamar a atenção para o papel determinante das imagens no livro, Michel Beaujour, vê uma "banalidade voluntária" - o artista canadiano irá também inspirar-se no "acaso objectivo" que percorre esta narrativa. Uma outra referência fundamental para o autor de "The Crooked Path" é a revista "Documents" (15 números, 1929-1931), na qual sobressai igualmente a relação entre texto e imagem, esta muitas vezes associada quer à noção de reportagem, quer ao conceito de documento, explícito no título da publicação.
Há uma sala da exposição onde é particularmente evidente o lugar de onde provém Jeff Wall no contexto da arte do século XX. Nesse espaço, o artista coloca em diálogo o seu "Storyteller" - uma obra de grandes dimensões que tem como referência a "Olympia" (1863), de Manet, deslocada para um cenário anódino de Vancouver -, com trabalhos associados habitualmente às correntes minimal e conceptual com origem nos anos de 1960 (Frank Stella, Carl Andre, Dan Flavin e Lawrence Weiner). Não será por acaso que Wall valoriza o pensamento crítico de Clement Greenberg e de Michael Fried - para este último, o fotógrafo canadiano dá continuidade à "absorção do sujeito" ("subject absorption") tematizada pictoricamente na França dos séculos XVII e XVIII.