Quem queira ver ao vivo um dos nomes que, certamente, aparecerá em todas as listas de melhores do ano, tem duas oportunidades flagrantes com os concertos de Girls, banda de Christopher Owens (a quem se junta JR White), no Lux e na sala 2 da Casa da Música, a 29 e 30 de Novembro, respectivamente.
As actuações inserem-se na digressão europeia de promoção de "Father, Son, Holy Ghost", segundo álbum do grupo, devidamente benzido pelas publicações certas. Contudo, facilmente serão acusados de uma certa mastigação de sons já de si repisados. Não se trata de música "avant-garde", é certo. Até aos 16, Owens quase não teve contacto com a cultura ocidental e, talvez por isso, não tenha tanto medo do passado; prefere conservar a excitação da descoberta, prestando uma espécie de tributo a algumas das pessoas e momentos que fazem parte da história da música popular.
Caso óbvio é o "power pop", género que tem como banda emblemática os Big Star, tentativa de compromisso entre uma alegada integridade artística e o supostamente "catchy" (canções curtas, cheias de anáforas), herança carregada pelos Teenage Fanclub e uma influência clara em Girls: "Vomit" é como que uma regurgitação de "The Concept", "How Can I Say I Love You" é tão pop e pueril como "Sidewinder".
Ainda na questão das influências, o último single – "Lawrence", que será lançado no dia 28 - torna-as explícitas. Ultrapassa a dedicatória ao ser apresentado com uma oferta a Lawrence, "frontman" de Felt, Denim e Go-Kart Mozart. Este, maníaco e obsessivo, passou a vida em busca de uma fama que sempre lhe passou frustrantemente perto, conseguindo um único "semi-hit" (“Primitive Painters”). Para além da personalidade cativante, Lawrence e Owens são parecidos também na insistência em refrões simples que ficam às voltas na cabeça e na ocupação de um espaço musical que hoje provavelmente se definiria de "dream pop".
No final de contas, a música popular é sempre a referência. Poderosa, onírica ou elementar, é esse o alvo para o qual estas canções são escritas, mesmo não se acreditando que a glória do "number one hit" algum dia chegue. E Owens, consciente das limitações da sua voz, já confessou ter "twittado" a Justin Bieber oferecendo as suas canções (mensagem felizmente ignorada) e disse acreditar que se "Love Like A River" fosse cantada por Beyoncé seria um êxito (cremos que sim e gostávamos de ouvir). Talvez nunca encham um Coliseu ou o Pavilhão Atlântico, mas por uma fugaz noite que seja cabe ao público português cumprir a sua parte no sonho pop de Girls.