Quem quer brincarcom os monges de Cister?

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Foi ali que a ordem religiosa se instalou provisoriamente no século XII, enquanto construía o que viria a ser o Mosteiro de Alcobaça. E foi no mesmo local que, oito séculos depois, abriu um parque de diversões que mistura História, natureza, gastronomia e adrenalina. Carlos Cipriano (texto) e Daniel Rocha (fotos) entraram na máquina do tempo e aterraram no Parque dos Monges

Um espaço aberto, amplo, verdejante, com um lago no meio, torres medievais em madeira, um jardim, um fluviário. O Parque dos Monges tem dez hectares e um dos seus lados confina com a margem esquerda do rio Alcoa (o tal que dois quilómetros mais à frente se une ao rio Baça, dando assim o nome à cidade de Alcobaça). O mosteiro não se avista daqui, mas está muito perto e é quase omnipresente pois tudo no Parque dos Monges se inspira na tradição de Cister, a ordem religiosa que durante séculos foi senhora de um vasto domínio daquela que é hoje a região Oeste.

Daí que, logo à entrada, o visitante atravesse um Jardim Bíblico. Coisa desinteressante para quem já avistou alguém a fazer slide por cima do lago? Nada disso. É preciso entrar no espírito da coisa. Este jardim tem 200 plantas que estão mencionadas na Bíblia e por isso está dividido entre o Velho e o Novo Testamento. Numa visita guiada fica-se a saber quais as plantas usadas para fins medicinais pelos monges boticários e as que entravam na confecção da doçaria conventual. Mais motivos religiosos: há um mini Jardim das Oliveiras e uma zona com palmeiras e coqueiros inspirada na Fuga do Egipto.

Nada disto é incompatível com um pouco de pragmatismo económico. "Quisemos aproveitar a proximidade com o turismo religioso em Fátima", explica Rui Bernardes, director comercial do Parque dos Monges. E há também, claro, referências óbvias à maçã de Alcobaça, uma fruta certificada que tem um peso muito importante na economia da região.

E o que fazem mais à frente um casal de simpáticas lontras a interagir com os visitantes? E por que estão aquelas enormes tartarugas sulcatas (ou tartarugas terrestres), ali, naquele espaço verde? Não esqueçamos que foi neste local, na aldeia de Chiqueda, que os primeiros monges de Cister se instalaram no século XII, antes de construírem o mosteiro. O Parque dos Monges quer prestar tributo à Natureza e mostrar uma parte da fauna e flora que ali existia na margem do Alcoa. Daí a existência de um fluviário, onde também se podem ver carpas koi, torjões e achigãs. Na quinta pedagógica podem ver-se burros, perus, cabras algarvias, pombos, coelhos e até uma vaca mirandesa, animais que faziam parte do quotidiano dos monges, que possuíam várias granjas em torno do mosteiro.

Mas como o parque tem motivos lúdicos e pedagógicos e recebe grupos de alunos, há ainda mais bichos para divertir as crianças. Ali à frente está uma alpaca (um animal dos Andes vulgarmente conhecido por lama). Ao lado vive um canguru, mas também há faisões, fracas, pavões e outras aves exóticas.

No paul do Alcoa - na margem do mesmo rio que ali ainda corre num estado semi-selvagem -, podem ver-se esquilos tricolores e terrestres, patos reais, cisnes, galinhas, porcos da índia, grous, sapos, tartarugas. Uma tentativa de recriar o que seria a zona húmida do Alcoa há 800 anos.

E, tal como na Idade Média, esta zona do paul, do fluviário e do lago central do Parque dos Monges funciona com um sistema de canais por onde a água circula exclusivamente pela força da gravidade, sem recurso a bombagem. Mais uma forma de replicar as artes e ofícios dos monges de Cister, que dominavam bem as técnicas de regadio e souberam desviar água do Alcoa para alimentar as famosas cozinhas do mosteiro.

O Lago das Freiras é um espelho de água que ocupa três dos dez hectares do parque. Nele pode-se andar de gaivota ou fazer canoagem, dormitar na relva nas suas margens, ou frequentar a Ilha dos Copistas, onde existe um bar retemperador e uma esplanada simpática rodeada de água.

Daqui pode observar-se o percurso descendente dos que ousam fazer slide desde a Torre da Atalaia dos Frades, que fica numa colina, até ao nível do lago, passando por cima deste. Quase ninguém resiste a uns gritos ditados pela adrenalina em plena descida, mas há também uma versão mais light do slide para quem quiser emoções menos fortes. Desde a Torre do Abade a "queda" é mais suave. E nesta torre pode ainda fazer-se escalada e rapel. É junto dela que os guias explicam aos miúdos que antigamente os assaltos aos castelos se faziam escalando as muralhas com escadas e cordas.

Subir ao terreno onde está instalada a Torre da Atalaia dos Frades, por entre um caminho estreito, por vezes um autêntico túnel sob as árvores, tem a sua recompensa. Dali obtém-se uma panorâmica do Parque dos Monges, da aldeia de Chiqueda e do vale que é atravessado pelo Alcoa.

Um doce museu

O Parque dos Monges é um projecto de dois irmãos - Alexandre e Isidro Alves - que nele investiram cerca de quatro milhões de euros, dos quais 1,8 milhões tiveram financiamento comunitário.

Aberto discretamente em Agosto, este sítio já teve 3300 visitantes (dos quais 740 em programas), um número que deixa os dois irmãos optimistas quanto ao futuro pois a publicidade foi nula e o parque ainda nem sequer foi formalmente inaugurado, coisa que só deverá acontecer em Março, no início da Primavera.

Em projecto estava a ideia de construir um hotel de quatro estrelas, mas a crise relegou-o para as calendas. Já o parque de campismo e um hostel para famílias e jovens serão para avançar e poderão ser abertos já em 2012.

Alexandre e Isidro começaram há 12 anos a comprar terrenos nesta zona com vista a um empreendimento imobiliário, mas estes são Reserva Agrícola Nacional e - para o bem e para o mal - a construção civil deixou de estar em alta. Das ameaças surgem as oportunidades, dizem os gurus da Gestão e foi isso que os dois empresário fizeram. O peso histórico do local levou-os a idealizar um parque temático. Ei-lo. Já criou 12 postos de trabalho e falta ainda dinamizá-lo mais com visitas de estudo, campos de férias e integração nos roteiros turísticos de quem visita Alcobaça e o mosteiro.

Um mercado-alvo muito heterogéneo, tal como o são os ingredientes do projecto que, no fundo, casa a História, com a natureza, a cultura, a religião, a gastronomia e a diversão. É por isso que junto ao parque se encontram as Oficinas Monásticas, onde uma comprida mesa abrigada por um telheiro pode albergar 120 comensais.

O ambiente é agradável. A cafetaria, discreta, fica no rés-do-chão de um edifício em cujo primeiro andar está prestes a abrir o Refeitório dos Monges, um restaurante com uma decoração sóbria, onde a luz natural, ao entrar por enormes janelas, é determinante.

A cereja em cima do bolo deste projecto é bem doce. Chama-se Museu dos Doces Conventuais e fica num anexo onde se pode ver um interessante espólio de utensílios e louças antigas usados na preparação da doçaria. Há documentos antigos, receitas, livros e, claro, doces - doces mesmo a sério, daqueles que fazem salivar! - expostos nas vitrinas.

Numa parede estão alguns ingredientes usados desde tempos remotos na confecção dos doces: flor de anis, erva-doce, baunilha, pinhão, cravinho e limão. E o mais interessante: tudo está feito para que, além da vista, também o olfacto seja chamado a intervir, havendo ranhuras para cheirar cada um destes condimentos.

O museu termina numa surpreendente cozinha onde se destaca uma enorme chaminé, réplica da do mosteiro de Alcobaça, que é quase como um grande chapéu sobre um espaço que prima pela cor branca. A funcionalidade e o tipo de equipamentos são "à prova de ASAE" e fazem deste um local de desejo e de prazer para quem gosta de cozinhar e experimentar qualquer tipo de doces.

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