Quando o mundo inteiro é um quarto
Em “O Quarto de Jack”, Emma Donoghue mostra a descoberta de um admirável mundo novo através do olhar de uma criança
Jack é um menino de cinco anos que vive com a mãe. Estão ambos fechados num quarto, e todo o universo de Jack é essa prisão de onze metros quadrados, complementado apenas com as histórias e as canções da mãe, os “planetas” irreais que se vêem na televisão (“a cultura como sombra na parede da gruta de Platão”), e uma clarabóia que, quando não está coberta de neve, deixa ver um pouco de céu.
O rapazinho não percebe que são reféns de um homem hediondo — criado à imagem dos monstros verdadeiros que aprisionam mulheres durante anos em caves ou anexos. O “Nick mafarrico” raptou a mãe de Jack quando esta ainda era apenas uma universitária de 19 anos. Entretanto, construiu um quarto “secreto” nas traseiras da casa com todas as condições básicas para o cativeiro da jovem. Passados dois anos, a rapariga engravidou e deu à luz um bebé — dádiva e maldição da sua clausura. Assim vive Jack com a mãe até ao seu quinto aniversário, altura onde se inicia deveras o livro (tudo o que aconteceu antes vai sendo desvendado ao longo da história), sem saber que existe um mundo “lá fora”.
É então que assistimos à fuga dramática dessa “caverna” e à revelação de um admirável mundo novo, onde tudo é descoberta e desafio. Acompanhamos os primeiros passos de Jack numa nova realidade que, no fundo, é a que todos conhecemos, enquanto a mãe luta para recuperar a sua vida.
Porque deves ler este livro?
Este livro destemido triunfa por veicular uma história original e poderosa através da “voz” de Jack, criada de forma perfeitamente credível. Nesta perspectiva cabe toda a inocência e curiosidade das crianças, permitindo que os leitores descubram progressivamente o que significa aquele quarto.
Emma Donoghue, uma escritora irlandesa de 42 anos que vive actualmente no Canadá, fez um trabalho notável na problemática (re)criação de toda a envolvência psicológica e dos constrangimentos, dificuldades e sacrifícios que surgem com um cativeiro nestas circunstâncias (que, infelizmente, espelham casos reais).
“O Quarto de Jack” é uma história comovente e sensível, mas flui com uma subtileza que a impede de cair em sentimentalismos estéreis. Esta é uma das principais razões que tem levado o romance a alcançar a unanimidade do público e da crítica, tendo sido distinguido em diversas ocasiões — entre outros feitos, foi finalista do Man Booker Prize em 2010, um dos mais importantes prémios literários do mundo.