Não são "Morangos" e querem uma nova revolução com açúcar
O 15 de Outubro é "um grande acontecimento", considera a jornalista Diana Andringa. Tal como no Maio de 68, os cartazes vieram para ficar
Há mais de 40 anos, uma vontade de mudar o mundo invadiu as ruas de Paris. Era o Maio de 68 que se tornou num amplificador do formigueiro que os jovens sentiam, com consequências que não se ficaram pelo território francês. O grito de revolta contagiou todos os estratos sociais com réplicas internacionais, nomeadamente no México, Brasil e EUA. Em Itália, por exemplo, estudantes uniram-se a operários na luta por salários iguais. Foi, apesar da influência da Primavera de Praga, um protesto local que se tornou global.
Já o 15 de Outubro é, desde logo, uma manifestação global que acontece numa altura em que a rua é a pólvora, mas a internet é o rastilho. Tunísia, Egipto, Líbia. 15M, os "indignados" de Wall Street, 15 de Outubro.
"É um grande acontecimento", conclui a jornalista Diana Andringa, criadora da série documental "Geração de 60". "É a saída de uma geração que se achava que já não mexia. Estão a dizer: 'Nós não somos a geração Morangos com Açúcar. Já não precisamos de fazer o 25 de Abril, mas fazemos uma nova revolução. Sem tropas.'"
Uma vontade universal de mudar o mundo
Continua a haver a vontade de mudar o mundo, diz a jornalista. A questão é que é "universal". E ainda bem. "Eu não vejo muito bem como se pode ser feliz neste mundo. Não temos de engolir. Temos obrigação de trazer ideias novas." A globalização e as novas tecnologias criaram uma "solidariedade global": "Sentimo-nos mal ao mesmo tempo em muitos sítios. Está gente em todo o mundo a dizer basta, que temos de encontrar um outro mundo."
Olhando para trás, Andringa vê uma relação destas manifestações sociais com o Maio de 68, no que toca às ruas, às palavras de ordem, ao desejo de mudança. Voltou a vontade de mudar o mundo e voltaram os cartazes. As pessoas saem à rua com a sua mensagem escrita. O "voces con futura", por exemplo, apresenta e distribui cartazes de todo o mundo. Ainda esta sexta-feira, segundo a página do Facebook do portal, que tinham recebido uma mensagem em "swahili": "O Quénia junta-se à manifestação. O mundo é um lugar maravilhoso e é nossa obrigação não deixar de acreditar e defender essa beleza."
António Alves, antigo muralista do MRPP, fala de um regresso à "propaganda artesanal" porque o cidadão já não tem voz. A jornalista alerta para a "solidariedade física que os cartazes espelham" num contexto em que as relações são tantas vezes digitais.
"O cartaz é um grito, mas é um grito de alegria, de fraternidade e de esperança. É tão importante levantar o cartaz, colar o cartaz... Há poesia, claro. São uma forma de arte. Mas, mais que isso, é política. A política no seu lado nobre não é exactamente poesia? Não é poético sonhar com outro mundo?"