Birmânia liberta 300 presos políticos

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Uma prisioneira é ajudada a sair da prisão de Insein, em Rangum Soe Than WIN/AFP

As 6300 libertações são um gesto de liberalização, apesar de muito poucos serem opositores. Clinton fala em sinais "prometedores"

Pelo menos 300 presos políticos foram libertados na Birmânia. Um dos primeiros a sair foi o célebre comediante Zarganar. Mas com mais de dois mil intelectuais, académicos, políticos e jornalistas na cadeia, o regime terá de fazer mais para provar que está realmente a seguir uma via reformista, dizem alguns críticos.

O jornal Irrawaddy, editado a partir da Tailândia, salienta que as 6300 libertações de ontem (quase todos de delito comum) são um gesto de liberalização, "mas ao manter vários presos políticos importantes atrás das grades, [o regime] reduz a esperança de uma amnistia mais alargada".

As autoridades anunciaram o perdão para milhares de detidos, mas não referiram quantos presos políticos estavam incluídos. A líder da oposição, Aung San Suu Kyi, anunciou, no entanto, que "até agora cerca de 100 presos políticos ficaram em liberdade". "Esperamos que muitos mais sejam libertados. Quantos mais, melhor para o país", afirmou perante uma concentração de simpatizantes que incluía ex-detidos. "Como disse várias vezes, a independência de toda a gente não tem preço. Estou realmente grata pela libertação dos presos políticos."

Horas depois, era conhecida a saída da cadeia de três centenas de dissidentes, incluindo figuras importantes da oposição.

Para além de Zarganar - detido em Junho de 2008 depois de ter sido condenado a 59 anos de prisão por criticar a resposta do Governo ao ciclone Nargis e organizar assistência às vítimas (matou mais de 138 mil pessoas) - sabe-se que foi também libertado Sai Say Htan. O líder da etnia shan (e de um grupo armado que lutava contra o regime militar) fora condenado a 104 anos de cadeia, em 2005, por se recusar a participar na preparação de uma nova Constituição.

Há alguma confusão em relação à sorte de alguns dos detidos, como Shin Gambira, um monge que liderou as manifestações de 2007, com uma fonte a dizer que foi libertado e um activista a negá-lo. E sabe-se que está ainda na prisão, por exemplo, Min Ko Naing, um líder influente da revolta conhecida como 8-8-88 (8 de Agosto de 1988), quando centenas de milhares de pessoas foram para a rua exigir democracia ao regime militar; a contestação acabou com três mil mortos, segundo estimativas de grupos de direitos humanos. Outro dos responsáveis da Geração 88, Ko Ko Gyi, também continua atrás das grades, como aliás cerca de 30 membros do grupo.

É por tudo isto que Benjamin Zawacki, investigador para a Birmânia da Amnistia Internacional, afirmou, quando eram apenas conhecidos duas dezenas de casos, que as libertações foram "decepcionantes". "Parece ser um atraso em relação às rápidas e importantes reformas políticas que têm acontecido no país. Se estes números são tão pequenos como tememos, poderá ser, ou significará realmente, uma desaceleração das reformas."

Alguma abertura

O ex-general Thein Sein assumiu em Março a presidência do primeiro governo civil do país em meio século (ainda que ninguém duvide do poder que os militares exercem nos bastidores ou mesmo às claras).

Apesar das gigantescas reservas com que a mudança de regime foi recebida, o chefe de Estado tem dado uma série de passos que permitem esperar alguma abertura: desde o processo de negociações com Suu Kyi à suspensão de uma barragem polémica, defesa do abrandamento da censura até à formação da comissão de direitos humanos que defendeu publicamente a libertação dos presos políticos.

A libertação dos 2100 detidos tem sido uma condição incontornável para que os Estados Unidos, União Europeia e Austrália reconsiderem o levantamento das sanções à Birmânia. Em entrevista à Reuters antes das libertações, a chefe da diplomacia norte-americana, Hillary Clinton, afirmou que estes são sinais "prometedores", mas que ainda é cedo para dizer que resposta pode Washington dar.

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