Governo que fez a Polónia escapar à crise deverá ser hoje reeleito

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Donald Tusk no último comício (em cima). Poderá ser o primeiro a cumprir duas legislaturasDurante a campanha, Jaroslaw Kaczynski diminuiu a diferença entre o seu PiS e o PO de Tusk REUTERS/Dawid Chalimoniuk

O país que vai a votos é hoje um dos mais pró-europeus da UE. Tusk pode ser o primeiro com dois mandatos desde o fim do comunismo, em 1989

Todas as sondagens dão a vitória nas legislativas de hoje ao primeiro-ministro liberal e europeísta Donald Tusk e à sua Plataforma Cívica (PO). A confirmar-se, será a vitória de uma Polónia que escapou à crise financeira, mas também de um país que fez as pazes com o seu passado, que já não teme alemães nem russos e que é cada vez mais uma parte importante da União Europeia. Se Tusk for reeleito, conseguirá o que nenhum líder polaco alcançou em democracia.

Mas as margens de vantagem face ao seu antecessor, o eurocéptico, russófobo e germanófobo Jaroslaw Kaczynski, líder do Direito e Justiça (PiS, direita nacionalista), são incertas - de 2% a 10% -, e muito pode ser definido pela abstenção, já que Kaczynski tem um eleitorado mais fiel. Quando o PiS venceu, em 2005, votaram 41% dos polacos; já em 2007, quando perdeu para o PO, votaram 54% dos eleitores.

"Em jogo nestas eleições está um desenvolvimento estável para o nosso país, que só o PO garante", afirmou Tusk no último dia de campanha, no novo Estádio Nacional, um dos campos onde se vai jogar o Europeu de futebol do próximo ano, símbolo do boom de construção financiado pelos fundos europeus.

Segundo os analistas, a boa gestão destes fundos tem sido um dos pilares do sucesso económico. Tusk tem ainda tentado controlar o défice público e lançou um programa de privatizações. Fora da zona euro, foi o único país da UE que se livrou da recessão e as previsões de crescimento para este ano são de 4% (apesar de o desemprego ter aumentado para os 11,6%).

Do outro lado, Kaczynski, que viu o seu irmão gémeo, o Presidente Lech Kaczynski, morrer num acidente de avião no ano passado, na Rússia, defende que a Polónia "merece mais" e que, se conseguir tornar-se "num país forte, não precisa de privatizar hospitais nem de vender empresas públicas ao desbarato".

"Os polacos valorizam a capacidade do Governo para gerir o dinheiro comunitário", diz o analista Krzysztov Blusz, do instituto DemosEuropa. "Para além disso, pela primeira vez em muito tempo, o executivo diz que governa para todos os polacos e não há temas que polarizem a sociedade", descreveu Blusz ao El País.

Os analistas não dão pontos ao Governo apenas por causa da economia. "As relações com os vizinhos melhoraram e a nossa posição na UE é agora mais forte e respeitada", afirma Zbigniew Pisarski, da Fundação Pulaski.

A Polónia ocupa, aliás, a presidência rotativa da UE. Algo que não teve grande impacto na campanha, mas que favorece Tusk, já que o pró-europeísmo do primeiro-ministro é um dos motivos da sua popularidade. As sondagens mostram que os polacos estão cada vez mais satisfeitos por integrar a União: actualmente, com 80% favoráveis à UE, o país está entre os mais pró-UE dos Estados-membros.

Ora, esta crescente aproximação dos polacos a Bruxelas não favorece Kaczynski. Não só porque os polacos ainda se lembram dos agitados dois anos de Governo do PiS (2005-2007), marcados pelo anti-europeísmo e defesa radical dos valores católicos, mas também porque Kaczynski continua obcecado com o passado. Em plena campanha - e presidência da UE -, Kaczynski lançou A Polónia dos nossos sonhos, em que acusa a chanceler Angela Merkel de procurar "a submissão da Polónia" e a descreve como representante "de uma geração de políticos alemães que quer reconstruir a potência imperial alemã". "Um eixo estratégico no qual Moscovo é um elemento e a Polónia um obstáculo."

Certo é que nem o PO (ao qual as sondagens dão um máximo de 39,5%) nem o PiS conseguirão a maioria e uma coligação é inevitável.

A surpresa anticlerical

A surpresa da campanha foi um novo partido de esquerda, o Palikot, do empresário e ex-deputado do PO Janusz Palikot, que defende a legalização da marijuana e do aborto, os direitos dos homossexuais e o fim das aulas de religião obrigatórias. Isto num país onde a Igreja Católica mantém uma enorme influência na vida pública.

O Movimento Palikot surge em terceiro lugar nas sondagens, com 10% das intenções de voto, tendo em semanas ultrapassado a Aliança da Esquerda Democrática (SLD, pós-comunista), e o Partido do Povo Polaco, formação agrária que é actualmente parceiro de coligação do PO, de Tusk.

Com este crescimento, o Palikot pode ter uma palavra a dizer na vida política polaca e até uma hipótese de integrar o próximo executivo. "Com 10%, não acredito, mas com 15% não pode haver uma coligação sem mim", disse Palikot à Associated Press. Palikot explica o sucesso do seu recém-criado partido com a frustração de muitos polacos face aos velhos partidos, bem como à sua posição em questões de costumes, bem recebida por muitos jovens que nunca votaram.

A expectativa de Tusk é que a coligação actual, com o Partido do Povo Polaco, chegue para governar. Caso contrário, espera conseguir o apoio de alguns deputados dos partidos de esquerda. Para Kaczynski, será sempre mais difícil negociar, já que as relações do PiS com todas as outras formações são péssimas. "Kaczynski sabe que não encontrará um parceiro de Governo", diz Stanislaw Mocek, ouvido pela AFP. Para este politólogo da Academia de Ciências Polaca, o objectivo de Kaczynski "é conseguir um bom ponto de partida para uma vitória daqui a quatro anos".

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