Sangue do Meu Sangue

Para o dizer simplesmente, é o melhor filme de João Canijo. Resultado de uma maneira de construir personagens e narrativas que é aqui levada a um grau máximo, mas resultado também de outro factor que nunca se vira assim num filme de Canijo, e que esse, sim, é uma relativa novidade: o trabalho de câmara. Em vez dos ziguezagues de uma câmara que quase se limitava a ser testemunha da encenação (em “Noite Escura”, em “Mal Nascida”), ei-la aqui, rigorosa e pesada, a ser o elemento central na organização das cenas, a desenhar, abrindo-os ou fechando-os, o espaço e o tempo em que se movimentam as personagens. O trabalho dos actores é extraordinário, de facto, mas numa curta nota como esta em vez de repetir esse elogio preferimos falar ainda de outro elemento discretamente essencial. O som, o som “do bairro”, mas sobretudo o som dos televisores, ligados em todo o lado e durante todo o tempo, dando à televisão portuguesa, e visto que Canijo gosta muito dos gregos, o papel de um “coro”, mas um coro inútil e patético, que nada tem a dizer sobre a tragédia portuguesa que não sejam novelas e futebol (e reparar na ironia com que Canijo usa o “clube de Portugal”: a primeira cena tem o som do primeiro jogo da selecção no Mundial 2010, e durante a humilhação final de Ivete acontece o golo da Espanha que acabou com o que eram, em linguagem televisiva, as “esperanças portuguesas”).

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