Partido Pirata toma Berlim com o país em vista

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Piratas de Berlim nas escadas do Parlamento da cidade Thomas Peter/Reuters (arquivo)

A força política, nascida após o estabelecimento do primeiro Partido Pirata na Suécia, prometia crescer já desde as últimas legislativas. Mas nada fazia prever os 8,9% de há uma semana nas eleições da cidade-estado. Tanto que todos os integrantes da lista (15 em 149 deputados estaduais) foram eleitos: se tivessem ganho mais votos, ficariam com lugares por preencher.

O que querem os piratas? Na primeira conferência de imprensa, os novos deputados foram bombardeados com perguntas. Um jornalista perguntou mesmo se o grupo seria apenas um "bando caótico de arruaceiros". Desajeitados perante as câmaras, tentaram escudar-se atrás dos computadores portáteis abertos.

Os seus principais cavalos-de-batalha são a legalização das cópias privadas, a protecção de dados online e a luta contra a censura, embora defendam também mais transparência dos processos de decisão política e dos concursos públicos.

Para Berlim, fizeram ainda propostas como a criação de uma rede de Wi-Fi gratuita em toda a cidade e transportes públicos grátis, propondo ainda um salário mínimo.

Os piratas assumem o seu amadorismo nas questões de processo político - que os analistas não se cansam de dizer que é caracterizado por grande complexidade e burocracia - mas querem impor um novo paradigma: a "democracia líquida". Tudo com base na interactividade da Internet, que daria mais poder aos cidadãos no processo político - e legislativo.

O mesmo para a orientação política, ainda indefinida. A pergunta foi posta pelo próprio partido no seu fórum oficial, conta o jornal Die Zeit. "Somos de direita ou de esquerda?"

O líder parlamentar, Andreas Baum (escolhido por sorteio), admitia que os piratas têm de ir "experimentando". "Não temos nenhum grande plano estratégico, ainda temos de pôr os resultados numa tabela de Excel", disse, citado pela revista Stern.

Os novos Verdes?

O Partido Pirata, actualmente com 12 a 13 mil membros, tem desencadeado uma avalanche de comparações com os Verdes no seu início. Também são um partido de "causa única", apresentada com irreverência, e o modo como se vestem sublinha esta imagem - na tomada de posse alguns usavam sweatshirts com capuzes, fazendo lembrar Joschka Fischer, dos Verdes, que tomou posso nos anos 1980 no estado federado de Hesse com ténis brancos e um blazer desajeitado.

Os slogans dos piratas são provocatórios e bem-humorados: "Pergunta aos teus filhos por que deves votar nos piratas" ou "Nós temos as perguntas, vocês têm as respostas" ou ainda "Não acredites no que lês nos cartazes de campanha - informa-te".

O Partido Pirata obteve dois por cento dos votos nas últimas eleições parlamentares. Tal como os Verdes em 1980, não conseguiram superar os cinco por cento necessários para entrar no Parlamento federal. Mas os Verdes conseguiram-no três anos depois - e dez anos após a representação parlamentar chegaram ao Governo, em coligação com os sociais-democratas de Gerhard Schröder. Hoje, os Verdes são considerados o partido que poderá decidir as eleições de 2013, e poderão ser cortejados até, dizem analistas, pela própria Angela Merkel.

Os piratas gostam da comparação, mas sublinham a mudança nos Verdes. "Acho que os Verdes são agora um partido conservador", criticou Sebastian Schneider, um dos membros do grupo de deputados berlinenses do partido. "Ainda não decidiram se se juntam ao lado negro da força", comentou, numa alusão mista ao Star Wars e a uma possível coligação com a CDU, partido cuja cor é o preto.

Excentricidade berlinense?

Os piratas poderiam ser uma "excentricidade berlinense", uma cidade onde "sempre houve mais pessoas que escolhem partidos não-convencionais para expressar descontentamento", diz Holger Liljeberg, do instituto de sondagens Info, à Reuters. Mas há quem recuse esta abordagem: "Se a situação no país não fosse tão grave, poder-se-ia atribuir o sucesso dos piratas a uma "especificidade berlinense" - as coisas são sempre um bocadinho diferentes na capital", dizia o diário Rhein Zeitung. "Mas a vitória dos piratas expõe os partidos tradicionais ao ridículo. Ninguém mais deveria celebrar esta eleição, muito menos o FDP", que só conseguiu 1,8%.

Aliás, Liljeberg nota que os piratas podem convencer parte do eleitorado "clássico" do Partido Liberal Democrata (FDP) ao defender menos intervenção do Estado nas vidas dos cidadãos. "Estão a falar de tópicos superliberais, enquanto o FDP tem negligenciado a sua matriz liberal".

Algumas polémicas

Mas apesar da curta existência, o Partido Pirata já teve polémicas. A primeira surgiu com a entrada do deputado social-democrata Jörg Tauss, investigado por posse de material pornográfico infantil. Na altura, era discutida uma proposta de lei que obrigaria as empresas fornecedoras de Internet a bloquear o acesso a sites com pornografia infantil - os piratas argumentavam que apagar o material seria mais eficaz e que esta lei é um precedente que poderá deixar o caminho livre para o Governo bloquear outro tipo de sites. A entrada de Tauss deu aos piratas um deputado no Bundestag, mas a relação nem chegou a um ano porque Tauss foi condenado e saiu do partido em Maio de 2010.

Outra controvérsia teve a ver com uma alegada ligação aos neonazis: líderes partidários deram entrevistas ao Junge Freiheit, um semanário de extrema-direita, e aceitaram como membro um antigo neonazi - embora depois de rebentar a polémica o partido se tenha assegurado de que se tratava de um arrependido.

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